Um excedente primário sem precedentes

A Europa quer uma melhoria estrutural da economia e vai tê-la. Mas não da forma como tem defendido. Ou, pelo menos, não exactamente com as políticas que tem defendido. Esta é uma das mensagens do Governo para a Comissão Europeia.
No Programa de Estabilidade, o Executivo subscreve com as suas previsões os principais objectivos e recomendações que chegam de Bruxelas nos últimos anos: até 2021 os défices desaparecem, a dívida baixa, o saldo externo mantém-se positivo ajudando a cortar a dívida externa, e a recuperação do sector bancário é uma prioridade.
Segundo as contas do Governo, na frente orçamental Portugal registará nos próximos anos uma experiência semelhante à de Itália no final dos anos 1990, quando registou excedentes primários a caminho dos 5% do PIB - mesmo com uma economia a crescer menos de 2%. Este é o exercício exigente a que Mário Centeno se propõe, apostando em baixar apenas ligeiramente o peso da receita do Estado ao longo dos próximos anos (que assim crescerá apenas um pouco menos que a economia) e a travar o crescimento da despesa, cujo peso no PIB cairá para mínimos históricos. A seu favor, o governo conta com a recuperação da economia - entre crescimento real e inflação, o PIB crescerá mais de 3% ao ano - mas também com o contexto de forte aperto orçamental dos últimos anos, à luz do qual mesmo pequenos alívios da austeridade são valorizados.
Com este resultado, o peso da dívida pública na economia entrará numa rota descendente mais acelerada - de 130,4% em 2016 para 109,5% do PIB em 2021- o que "reforçará a confiança na economia nacional, baixando os custos de financiamento para apoiar o crescimento", lê-se no Programa de Estabilidade.
Mas não é só a dívida pública que baixa. A dívida externa, medida pela posição de investimento internacional, também recua quase 20 pontos entre 2016 e 2021, para o que contribuiu um excedente comercial face ao exterior em todos os anos. Este desempenho traduz ganhos de quota de mercado e de produtividade que o Governo confia que se manterão, no contexto de uma economia em recuperação e mais equilibrada. "A estabilização do sector financeiro, a consolidação das contas públicas e a implementação do Plano Nacional de Reformas constituem, assim, bases sólidas para um crescimento inclusivo que garante a convergência com a Europa", escreve o governo no documento que seguirá para análise em Bruxelas.