Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
Luís Marques Mendes faz, ao domingo na SIC, os seus comentários sobre o que aconteceu durante a semana. E o Negócios publica as notas que servem de base aos comentários. Esta semana fala das eleições na Alemanha, de Tancos, das autárquicas, dos números da economia e de Centeno no Eurogrupo.
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O TETRA DE MERKEL
- Esta vitória de Merkel, abaixo das expectativas, tem, apesar disso, coisas curiosíssimas:
a) Primeira: se cumprir este novo mandato, torna-se a chanceler com mais tempo de governo no pós-guerra. É obra.
b) Segundo: há poucos meses, era dada como politicamente morta. Com as suas posições sobre os refugiados e com a mudança de líder do SPD, alguns vaticinaram o seu fim político. Afinal, ganha com uma diferença colossal.
c) Terceiro: durante anos era vista como o diabo para a esquerda europeia (a mulher da austeridade). Com as suas posições na integração dos refugiados, "passou de besta a bestial". Passou de rejeitada a respeitada.
d) Quarto: tem um eleitorado surpreendente. É fortíssima na classe média e nos mais velhos. Mas a surpresa é nos jovens. Tem um apoio forte na juventude. Qual a razão? Redução do desemprego. Os números mostram: quanto mais o desemprego baixa, mais os jovens a apoiam.
e) Quinto: terminado este ciclo de eleições na Europa (Reino Unido, França e Holanda), há outra conclusão curiosa – em 28 países da UE, os socialistas são governo apenas em 7. E se perdem em Itália em 2018, serão apenas 6 países governados por socialistas. Conclusão: há uma crise séria na família socialista europeia.
- Que governo vamos ter agora na Alemanha?
a) Manter a coligação CDU/SPD, a chamada Grande Coligação. É a solução preferida de Merkel. Garante-lhe estabilidade e consistência. Mas é muito improvável face aos sinais de recusa do SPD.
b) Coligação CDU/Liberais – É uma hipótese com 2 problemas: primeiro, pode não ter deputados suficientes para a maioria; depois, será um osso duro de roer nas negociações. Os Liberais querem ter o Ministro das Finanças.
c) Coligação CDU/Liberais/Verdes – A chamada Coligação Jamaica, por estes três partidos terem a cor da bandeira da Jamaica (preto, amarelo e verde). Mas esta solução tem a dificuldade de os três partidos terem posições muito divergentes em três questões: euro, refugiados e política ambiental.
- Nota final: a entrada da extrema-direita no Parlamento, a primeira vez depois da Guerra. É um facto com alguma preocupação. Não tanto pelo ingresso no Parlamento mas, sobretudo, pela dimensão do resultado.
PREVISÕES AUTÁRQUICAS
- Partido Socialista – É o que está na posição mais confortável.
- Tem uma grande vantagem: a dinâmica nacional, quer da economia, quer da imagem governativa. Por isso, o PS tem "nacionalizado" estas eleições.
- Tem um risco: o risco de baixar o número de câmaras, porque tem muitas divisões internas pelo país fora (por exemplo, Fafe, Barcelos e Vila do Conde).
- Partido Social Democrata – É o que está na posição de maior desconforto.
- Tem uma vantagem: pode aumentar o número de presidências de Câmaras, quer porque teve mau resultado há 4 anos, quer porque beneficiará de divisões do PS.
- Tem um risco: o risco de perder os grandes centros urbanos, o risco de em vários grandes municípios não chegar aos 20% dos votos (Lisboa, Porto, Matosinhos, Covilhã, Gondomar) e o risco de o partido se ruralizar. O PSD está a fazer o caminho inverso ao do país. O país torna-se mais urbano. O PSD torna-se mais rural.
- Partido Comunista
- Tem uma vantagem: pode manter quase todas as suas presidências. As dúvidas são Peniche e Sesimbra.
- Tem um risco: perder das maiorias absolutas que hoje tem. E isso é um embaraço.
- Centro Democrático e Social
- Tem uma vantagem: pode manter as Câmaras que tem (e até subir uma), ter o maior resultado de sempre em Lisboa e desse modo confirmar a liderança de Assunção Cristas.
- O risco é reduzido: ficar aquém dos 7% em Lisboa. Improvável.
- Bloco de Esquerda
- São as eleições mais ingratas para o Bloco. Pode subir ligeiramente a votação. Mas continuará sem peso autárquico.
- Independentes
- Hoje há 13 presidências independentes. O mais provável é que este número suba de forma significativa.
BOAS NOTÍCIAS SOBRE ECONOMIA
- Crescimento do PIB do 2º trimestre
a) Afinal, o INE lá confirmou a informação que eu próprio tinha antecipado em Agosto: que o crescimento do PIB no 2º trimestre seria superior ao do 1º trimestre; e que seria um crescimento na casa dos 3%, ou seja, o maior desde 2000.
b) É uma excelente notícia para o país. E de certo modo histórica. Há 17 anos que o país não tinha crescimento desta natureza.
- Défice do 1º semestre de 2017
a) O INE também avançou com o valor do défice nos primeiros seis meses de 2017 – 1,9%.
b) É um bom resultado. Ele permite antecipar o cumprimento da meta de 1,5% para o défice de todo o ano.
c) Aqui, porém, há que dizer: é um bom resultado mas não é um excelente resultado. Com o crescimento económico a ficar em 2017 muito acima da previsão inicial (1,8% de crescimento), o Governo tinha a obrigação de apresentar um défice mais baixo. Se o não fizer, pode dizer-se que está apenas a cumprir os serviços mínimos.
CENTENO NO EUROGRUPO?
- Nestas duas últimas semanas voltou a falar-se de Mário Centeno para presidir ao Eurogrupo e o próprio admitiu expressamente, pela primeira vez, essa hipótese.
- Conclusões a tirar:
a) Chegados onde chegámos, depois de todo o investimento feito, se Mário Centeno não for Presidente do Eurogrupo, é uma grande derrota pessoal e política do Ministro das Finanças. Sai fragilizado. É tipo "entradas de leão e saídas de sendeiro".
b) Ao contrário, se lá chegar, é uma vitória do Ministro, do Governo e do país.
c) Mas é um embaraço sério para a coligação que apoia o Governo. PCP e BE torcem o nariz a essa hipótese, porque são contra as regras do Euro e do Tratado Orçamental.
- Ou seja, os parceiros do Governo passam a apoiar Centeno cá dentro e a ser adversários de Centeno lá fora.
O RELATÓRIO SOBRE TANCOS
Três apontamentos:
- É um relatório de "pai incógnito". Todos o comentam mas ninguém conhece a sua paternidade.
- É um relatório de gargalhada. Todos lhe dão uma grande importância e, todavia, não serve para nada.
- Faz análise política; faz cenários; plagia análises e comentários feitos na comunicação social; diz que o Ministro e os militares agiram mal (o que todos os comentadores já tinham dito),
- Só não diz nada sobre o que interessa: quem é o responsável pelo que sucedeu em Tancos.
- É um relatório que esconde uma suspeita grave. Suspeito que há qualquer coisa mais grave no horizonte e disso ninguém fala. Suspeito que ao fim deste tempo todo não há provas reais e efectivas do furto de Tancos.
- Por que é que o Ministério Público e a Polícia Judiciária estão a demorar nesta investigação?
- Suspeito que a razão é essa mesma: há demora porque não há provas. E isso é que é grave. Ainda vai ficar tudo em "águas de bacalhau". Mas sobre isso os nossos políticos nada dizem.