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Perante isto, Portugal está numa situação vulnerável. "A zona do Mediterrâneo é considerada um hotspot para as alterações climáticas. Do ponto de vista do aquecimento, já atingimos 1,5° enquanto em termos globais estamos no 1,2° em relação à era dita pré-industrial, o que corresponde a 20% do aquecimento mais rápido", refere Pedro Matos Soares, investigador principal no Instituto Dom Luiz, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. As razões por que tal acontece estão em estudo, porém, "as primeiras indicações apontam para uma intensificação do movimento descendente na atmosfera, que faz com que haja um aquecimento superior no Mediterrâneo". "Outra das razões é que o Mediterrâneo está a aquecer também mais rápido do que os oceanos, porque é um mar mais confinado e tem tido grandes anomalias de temperatura na superfície. Em terceiro lugar, também existem estudos que apontam para, no inverno, devido a este aquecimento, haver um menor contraste entre a temperatura do mar e as zonas de terra confinantes com o Mediterrâneo. Estes três mecanismos estão apontados como a principal razão para o Mediterrâneo estar a aquecer mais depressa", esclarece.
A queda na precipitação pode chegar aos 40% na região Sul de Portugal até ao final do século, se se manter a tendência actual de aumento da temperatura.

Dados nacionais em 2023
Para ter dados mais concretos a nível nacional, está em marcha um projeto denominado Plano Nacional para a Adaptação 2100, que integra entidades como a Agência Portuguesa do Ambientes, a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, a Direção-Geral do Território e o Banco de Portugal. Pedro Matos Soares é também o coordenador científico do projeto e salienta que "o objetivo é aferir quais os impactos das alterações climáticas em Portugal em todo o século XXI, ou seja, olhar para todas as transformações que se vão registando e perceber os impactos nos setores de alta vulnerabilidade. Falamos de incêndios florestais, zonas costeiras e recursos hídricos."
Uma mudança integrada
Passando da teoria à prática, a mudança tem de ser transversal e integrada. Pedro Barata, partner da Get2C, começa por referir que "há duas grandes áreas de atuação nas alterações climáticas". "Uma é a adaptação e a outra é a mitigação, e elas são radicalmente diferentes no sentido em que toda a adaptação é local e toda a mitigação é global." Enquanto a nível macro se tomam medidas para reduzir as emissões, é a nível local que as adaptações têm de ser feitas. "A adaptação depende do que é que estamos a querer adaptar. Se estamos no centro de Lisboa, a adaptação tem a ver com o tipo de impacto que se sente nesta zona, como a subida do nível do mar que pode vir a ter impactos sobre estruturas da Baixa. Na prática, muita da política de adaptação pode ser feita a nível metropolitano ou a nível do município", acrescenta Pedro Barata.

No caso de Portugal, se o aquecimento está a produzir efeitos adversos, por outro lado, também será o sol um dos maiores recursos que o país deverá aproveitar, salienta Pedro Barata. "Portugal é um dos países, se não mesmo o país, com maior taxa de solarização anual na Europa. E, se virmos a percentagem de energia renovável solar na Alemanha, por exemplo, esta tem muito mais solar do que Portugal. Até mesmo comparando com Espanha ou Grécia, nós temos menos solar. Temos uma vantagem comparativa ao eletrificarmos os nossos consumos, ao aumentarmos a penetração de renováveis, portanto fazer essa transição energética."
Também Pedro Matos Soares defende que o país deve apostar no solar. Porém, o investigador recorda que são precisos critérios, pois cobrir vastos campos com painéis pode pôr em causa esses ecossistemas. "Há muitos anos que digo que o solar se devia desenvolver nas zonas urbanas. Por exemplo, em vez de destruirmos floresta para colocar parques solares, devíamos fazer um investimento sério na produção e distribuição inteligente da eletricidade local. Porquê? Porque se nós pensarmos na quantidade de coberturas no edificado nacional, a área é gigante. Se intensificássemos a produção local de energia sobre essas infraestruturas, teríamos uma área imensa para produção de solar em vez de estarmos a fazer parques solares em zonas sem critério", finaliza Pedro Matos Soares.