Crescimento: aparição ou visão?
A 15 de Maio o INE revelou que a economia portuguesa terá crescido 2,8% no 1.º trimestre. No dia seguinte, o Eurostat divulgou a informação para o conjunto da UE. Com 2,8% temos dois países: Portugal e Holanda.
Dez países tiveram valores superiores e nove registaram valores inferiores. Para os restantes sete países, o Eurostat ainda não revelou informação.
Tal bastou para que se desencadeassem as mais extraordinárias projecções e análises sobre o futuro do nosso crescimento.
O Ministério das Finanças saiu a terreiro, afiançando que é um valor sustentável. Houve mesmo quem garantisse que se pode contar com um crescimento anual, em 2017, de 4%. A oposição ofuscou-se e achou melhor, em vez de duvidar ou relativizar, passar a reivindicar para si o mérito da proeza. Muitos já discutem o que fazer com tão notável crescimento: onde vamos gastar tanto maná?
Como explicar esta consensual crença no milagre? Como é possível crer na geração do crescimento sem a presença dos factores necessários e das políticas económicas correspondentes?
Tal ilusão não pode resultar da eficácia do departamento de comunicação e propaganda do Governo. Ainda é cedo, no ciclo político, para lançar este placebo. Acresce que as oposições acompanham-no nesta visão e apenas disputam a autoria da coisa.
A explicação só pode ser uma: a radical aversão da classe política às reformas que a leva a acreditar no milagre. Afinal, julgam comprovar, que aquilo que temiam e que andam a evitar - a inevitabilidade das reformas - pode ser evitado.
No quadro anexo apresento - para o período 2008-2016, para Portugal e os países mais evoluídos da Europa - um panorama sintético das políticas económicas relevantes e os consequentes desempenhos macroeconómicos.
O quadro evidencia que o miserável desempenho económico que temos registado não ocorreu por acaso - e vai ter continuidade.
Estamos demasiado longe dos países com melhor desempenho. As reformas que nos permitiriam melhorar não se fizeram e, em 2016, o país evidencia uma inferioridade que não permite antever, no futuro próximo, um crescimento significativo, contrariando as visões que agora tantos insensatamente alimentam.
Deve sublinhar-se que a qualidade relativa da política económica, entre 2008 e 2016, desceu significativamente. Todas as áreas pioraram à excepção da flexibilidade dos salários e das práticas de contratação e despedimento. Mas, mesmo nesta área, só a flexibilidade dos salários não se afasta para pior da média da Europa evoluída; na flexibilidade de contratação e despedimento a diferença continua abissal.
O crescimento não é possível sem accionar as difíceis reformas.
A classe política está, em bloco, com miragens rudimentares e, infelizmente, parte muito significativa dos economistas alimenta a ilusão, laborando uma alquimia perigosa e pouco dignificante para a classe.
Economista e professor do ISEG
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