Com 181 anos de história e uma identidade mutualista que se mantém viva, o Banco Montepio está a redefinir o seu papel no sistema financeiro português, também através de uma estratégia de sustentabilidade que vai muito além do cumprimento das obrigações legais e normativas. Em 2024, a instituição mobilizou 725 milhões de euros para soluções com impacto social, apoiou quase mil entidades da economia social e reforçou a habitação jovem como prioridade no crédito concedido.
Nesta conversa, Paula Viegas explica como, alicerçada nas raízes mutualistas da Instituição, a Sustentabilidade se tornou por essência, um princípio operativo a integração dos fatores ESG está a transformar a cultura e a estratégia do banco, e que desafios e oportunidades que o setor financeiro enfrenta num contexto de transição climática e de construção de uma economia mais inclusiva e resiliente.
O Banco Montepio celebra 180 anos de história com um claro reforço do seu posicionamento em matéria de sustentabilidade. Que papel assume atualmente o Banco na promoção de um desenvolvimento económico mais inclusivo e sustentável?
Estamos a fazer este caminho com discrição, mas também com a convicção de que podemos – e devemos – ser um mediador e um acelerador de mudança positiva. A nossa história de 181 anos prova isso. Hoje, mais do que nunca, acredito que temos o dever de estar próximos das pessoas e das organizações; de apoiar as empresas nos seus desafios de adaptação climática e de reforço da competitividade, de contribuir para a inclusão e valorização social; de financiar habitação com impacto real na vida de jovens e famílias, e de reforçar o nosso papel ativo na economia social e solidária – que fazemos no diálogo com as entidades que a constroem todos os dias. O Banco Montepio é o único no seu setor a dispor de uma equipa comercial dedicada e com experiência comprovada no apoio especializado às estas entidades, reforçando a proximidade e a eficácia na resposta às necessidades específicas deste setor relevante para a coesão social.
Em suma, o que verdadeiramente relevamos existe para além do que financiamos – para quem, com que propósito, com que impacto e com as nossas pessoas que todos os dias entregam este “banco de causas, com alma de gente”. É isso que dá sentido ao que fazemos.

De que forma a integração da estratégia e dos fatores ESG (ambiente, social e governação) tem vindo a transformar a atuação do banco?
A integração dos fatores ESG tem-nos permitido alavancar uma transformação estrutural, prudente e faseada, que não se resume à abordagem técnica ou normativa, mas que vemos, antes, como uma extensão natural da nossa identidade mutualista, que é agora reforçada por decisões com impacto mensurável. Impulsionada pela agenda operacional ESG, a Sustentabilidade deixou de ser um “tema” para se tornar um princípio operativo, num elo agregador e num acelerador de colaboração e inovação interna. Acreditamos nas ideias quando se transformam em soluções e a sustentabilidade é exatamente isso: uma ideia de futuro que se traduz em práticas éticas no presente representando um constante investimento nas várias gerações.
Hoje, a integração destes pressupostos e destas variáveis está disseminada na estratégia e no planeamento do Banco Montepio e do Grupo Banco Montepio, em métricas e objetivos concretos – e muito diversos entre si, na gestão de risco e na operativa de negócio. É um caminho partilhado entre várias equipas e áreas funcionais e que ainda tem muito para percorrer. Esse é o desafio, mas também a inspiração que reforça o propósito da Instituição bancária mais antiga do país e que nos ajuda a construir uma cultura corporativa mais resiliente.
Que resultados destacaria deste percurso recente e como são acompanhados?
Neste percurso temos vindo a consolidar uma transformação sustentada, reforçada com a apresentação do terceiro Relatório de Sustentabilidade – primeiro relatório consolidado do Grupo Banco Montepio – e que é relativo ao exercício de 2024. Mais concretamente, mobilizámos 725 milhões de euros para soluções com impacto social, apoiando quase mil entidades da economia social, promovendo a habitação jovem (29% do total de crédito concedido) e investindo 1,5 milhões de euros no Fundo de Impacto Ibérico, focado em projetos inovadores e mensuráveis em Portugal.
Na vertente ambiental, aprofundámos a medição da nossa pegada carbónica, alargando as categorias de emissões analisadas. Neste contexto, reduzimos em 14% as emissões de âmbito 1 e 2, e contabilizámos 93% das emissões financiadas, com 96% da exposição financeira avaliada. Na cadeia de fornecimento, onde 95% dos nossos parceiros são nacionais, 42% dos fornecedores materiais foram avaliados com todos os critérios ESG e de cibersegurança, e apenas 24% atuam em setores “castanhos”. No âmbito da governação, cerca de 40% das nossas políticas refletem compromissos vinculativos com a sustentabilidade. A diversidade continua a ser uma marca distintiva do grupo, com o reforço da presença feminina em cargos de decisão e o aumento da inclusão de pessoas com deficiência.
Este percurso tem sido também acompanhado por um forte investimento em capacitação interna: todas as nossas pessoas têm hoje acesso a formação em sustentabilidade, ESG e finanças sustentáveis.
Finalmente, este percurso na sustentabilidade também acompanha um outro, que diz respeito à sustentabilidade financeira da nossa Instituição, e que muito nos orgulha: crescemos 287% nos resultados líquidos, aumentámos os depósitos em 12% e reduzimos os créditos em incumprimento para mínimos históricos.
Quais os principais desafios e oportunidades que vê no desenvolvimento da sustentabilidade para o setor financeiro?
Creio que um dos maiores desafios será assegurar coerência entre os compromissos - o que, enquanto Instituição, decidimos fazer ancorado nos nossos valores fundamentais, a conformidade regulatória (que se cumpre ou se justifica) e a prática (o que efetivamente conseguiremos assegurar). Neste contexto, a regulação tem evoluído de forma intensa e acelerada no setor financeiro, mas creio que o mais complexo será transformar esses compromissos e necessidades de conformidade em cultura organizacional e capacidade de decisão estruturada. Depois, há a aplicação do princípio da dupla materialidade. É um exercício que traz visibilidade, não apenas sobre os riscos e oportunidades financeiros para qualquer organização, mas também sobre os impactos gerados sobre a sociedade e o ambiente. Pode ser uma ferramenta poderosa nesse processo, ajudando a alinhar prioridades, a gerar valor, a clarificar trade-offs e a antecipar vulnerabilidades estruturais. Acresce o desafio de gerir, de forma estratégica e transparente, as partes interessadas mais relevantes, equilibrando expectativas e promovendo um diálogo que contribua para soluções de impacto e confiança duradoura. A recolha e respetiva qualidade da informação ESG das contrapartes é outro desafio crítico. Integrar dados de PME, entidades da economia social ou clientes particulares, por vezes com insuficiente maturidade ou recursos para reportar, é essencial para uma gestão de risco mais eficaz, para cumprir os requisitos colocados ao nosso setor.
No entanto, o banco vê nesta evolução oportunidades para gerar mais valor económico, ambiental e social para os seus stakeholders?
Claro. Este é também um tempo de oportunidades. Existe um espaço evidente para a inovação e para o empreendedorismo de base tecnológica orientado para resolver problemas sociais e ambientais. O setor financeiro pode ter aqui um papel fundamental como facilitador, investidor e acelerador. No entanto, esta aposta pressupõe avaliações dos investimentos que consideram outras matrizes e fórmulas, que serão menos habituais, na gestão de ativos, das parcerias e dos modelos de negócio, para garantir que o capital mobilizado gera valor sustentável para além do retorno financeiro.
Outro desafio crescente prende-se com os planos de transição e os efeitos colaterais das alterações climáticas, que já afetam empresas, cadeias de valor, ecossistemas e, sobretudo, as pessoas. As ondas de calor, consideradas pela Organização Mundial da Saúde como um “assassino silencioso” (silent killer), são hoje um risco real para a saúde pública, e lembram-nos que sem pessoas não há economia, consumo ou setor financeiro. É também uma questão de continuidade dos serviços em que o atendimento presencial continua indispensável, exigindo medidas para proteger trabalhadores, clientes e comunidades mais vulneráveis.
Todavia, é possível – e necessário – alinhar solidez financeira com regeneração ambiental, inclusão social e criação de valor para as comunidades que, enquanto Banco Montepio, servimos. É esse o horizonte que nos guia também: mais do que relevantes para o mercado, sermos verdadeiramente significativos para a sociedade. Porque é isso que, no fim do dia, confere legitimidade e futuro à nossa missão para mais 181 anos.