Lisboa recebeu a primeira edição do Fusion 2025. Com o tema “A evolução da inteligência artificial deve ser um espaço de cocriação”, o evento da Devoteam reuniu protagonistas de vários setores para discutir abertamente os desafios e as oportunidades da Inteligência Artificial (IA) e refletir sobre como pôr esta tecnologia ao serviço da sociedade e das organizações.
Na abertura, Bruno Mota, CEO da Devoteam Portugal, e Sebastien Chevrel, Group Managing Director, deram as boas-vindas, destacando a importância de cruzar perspetivas e promover um diálogo que leve a um futuro mais informado, responsável e colaborativo. Patrícia Milheiro, AI Agency Strategy Director da Devoteam, aprofundou esta visão, alertando para os riscos, tanto do entusiasmo cego como do medo paralisante em torno da IA. Para a responsável, o debate não se deve centrar apenas na tecnologia, mas sim em como a IA pode servir pessoas, empresas e o país.
Seguiu-se Pedro Reis, ex-ministro da Economia, que desafiou a audiência com questões de fundo: “Alguma vez houve uma mudança tecnológica com impacto tão rápido e avassalador como o da IA?” O antigo governante destacou ainda a urgência de uma regulação equilibrada e partilhada entre governos, empresas e academia.
Humanidade e Tecnologia
No primeiro painel, a confiança e o fator humano foram centrais. Madalena Talone, executive board member da CGD, sublinhou que a adoção da IA exige dados de qualidade e soluções alinhadas com valores éticos. Paulo Rosado, fundador da Outsystems, alertou que a IA deve ser vista como um “júnior” que precisa de contexto e supervisão e não como uma máquina. Por sua vez, Ricardo Chaves, executive director do AI Center of Excellence do BPI, avançou resultados do impacto da IA, como a redução de 70% nas fraudes de pagamentos e automatização de processos complexos com mais de 90% de precisão, destacando que a adoção depende de equipas multidisciplinares e de adaptação regulatória.
Utopia e Pragmatismo
O segundo painel abordou o valor tangível da IA. Segundo o estudo Tech Radar by Devoteam, 71% das organizações já investem em IA, mas muitas têm dúvidas sobre o seu impacto. Catarina Ceitil, CIO & Transformation Officer da Galp, sublinhou que a fase da utopia já começa a ficar para trás. “Não é fácil, mas já se começam a sentir alguns efeitos da inteligência artificial. Estamos a passar das provas de conceito para a utilização prática, com resultados que já mostram rentabilidade”, afirmou.
Sofia Marta, country manager da Google Cloud Portugal, referiu que, com base numa sondagem feita a mais de 3.500 líderes em todo o mundo, 74% das empresas reportam ROI positivo no primeiro ano, evidenciando que a fase do pragmatismo já começou. Ainda assim, Hélder Dias Ribeiro, Chief Digital & Tech Officer da Sonae MC, fez um alerta sobre a velocidade de adoção: “Existem muitas barreiras à recolha dos benefícios esperados.” O debate terminou com a constatação de que a IA deixou de ser apenas uma promessa distante para se afirmar como um ativo estratégico.
A IA é transformadora
Na sua intervenção, Gabriel Coimbra, Executive Advisor e antigo VP da IDC para o Sul da Europa, comparou o impacto da IA às maiores disrupções da história recente e destacou a criação de novos mercados em e-commerce, cloud, cibersegurança e mobilidade elétrica. “A fase de experimentação já não chega; é preciso avançar para a adoção. Algumas empresas vão ganhar quota de mercado e sobreviver, outras vão desaparecer”, advertiu, reforçando a necessidade de identificar áreas diferenciadoras para cada organização.
Ética e Inovação
No painel dedicado a “Ética e Inovação” discutiu-se se a IA deve evoluir ao ritmo da tecnologia ou da regulação. Adolfo Mesquita Nunes afirmou que a regulação deve resolver problemas, não ser o motor da tecnologia. Sandra Maximiano, da ANACOM, sublinhou que princípios éticos básicos devem ser incorporados desde o design. Paulo Dimas, do Center for Responsible AI, reforçou que “é impossível parar a inovação”, mas é possível desenhar uma IA responsável. Rui Shantilal, Group VP da Devoteam, acrescentou que a regulação deve acompanhar a tecnologia de forma faseada, garantindo a segurança e a ética, enquanto o tecido empresarial ganha capacidade de avaliação e mitigação de riscos.
Quem dá cartas no sucesso da IA?
O último painel juntou academia e indústria para debater quem define o sucesso da IA: a investigação ou a aplicação prática. Henrique Carreiro, diretor da IT Insight e professor na NOVA IMS, lembrou que o progresso em IA tem “um aspeto invisível” e depende de aplicação prática. João Graça, cofundador da Unbabel, defendeu um modelo híbrido, em que “a academia lança problemas difíceis e depois alguém descobre aplicações para os resolver”.
Pedro Garcia da Silva, CIO da Fundação Champalimaud, reforçou a importância da academia como base de conhecimento, enquanto Carla Patrocínio, do Instituto Superior Técnico, sublinhou que a evolução responde também às necessidades do mercado e da sociedade. Todos concordaram que a proximidade entre academia e empresas é essencial para gerar soluções com impacto real. O painel defendeu ainda maior proximidade entre academia e empresas, não apenas para formar engenheiros altamente qualificados, mas também empreendedores capazes de criar soluções com impacto real.
Uma visão política para o futuro
O encerramento coube ao ministro Adjunto e da Reforma do Estado, Gonçalo Saraiva Matias, que destacou o potencial económico da IA. Segundo o governante, apesar de 85 milhões de postos de trabalho poderem ser afetados, a IA deverá criar 97 milhões de novos empregos, com saldo líquido positivo. Este responsável anunciou ainda o projeto Licencia, uma plataforma que centraliza licenciamentos empresariais com recurso a IA, sublinhando que “Portugal tem todas as condições para liderar a transição tecnológica”.