Portugal inova na reciclagem de resíduos

Frigoríficos e ares condicionados em final de vida têm valor económico e ambiental. Consórcio estudou reaproveitamento dos gases fluorados existentes nestes equipamentos.

AERP Portugal, entidade gestora de resíduos de equipamentos elétricos, eletrónicos e resíduos de baterias, tem primado pela aposta na inovação tecnológica. Parceira no projeto luso-espanhol LIFE 4 F-Gases, a empresa contribuiu para a divulgação do processo de reciclagem dos gases fluorados existentes em equipamentos de refrigeração e ar condicionado, cujos resultados foram apresentados no 21.º Simpósio Europeu de Química do Flúor. Químicos industriais e académicos juntam-se trianualmente na Europa, em agosto, para analisar formas de diminuição dos resíduos compostos no ambiente. A Universidade Nova, que também integra o projeto LIFE 4 F-Gases, recebeu-os neste ano, no Centro de Congressos de Lisboa, numa organização conjunta com a Sociedade Portuguesa de Química.

Quatro anos de trabalho complementar do consórcio ibérico no projeto LIFE 4 F-Gases culminaram na apresentação do HAMSYS (Sistema Híbrido de Adsorção e Membrana), uma tecnologia inovadora de separação de gases fluorados reutilizáveis, existentes em equipamentos de refrigeração e ar condicionado em final de ciclo de vida. Além da ERP Portugal e da Universidade Nova, o projeto LIFE 4 F-Gases inclui Ambigroup Reciclagem, Universidade de Cantábria e APRIA Systems, estas últimas entidades espanholas.

ERP Portugal associou-se ao projeto na procura de soluções que minimizem o impacto ambiental sem descurar o cumprimento dos objetivos e requisitos impostos pela legislação em vigor.

A diretora-geral da empresa, Rosa Monforte, garante a «ambição» de Portugal no cumprimento das metas ambientais impostas pelas diretrizes nacionais e europeias. «Estamos à frente e normalmente mais empenhados. Até fazemos questão de fazer mais do que está definido pela Comissão Europeia, embora depois acabemos por não nos diferenciarmos tanto», reforça a responsável.

«A ERP Portugal permitiu-nos aceder ao setor industrial, porque trabalha com gestores de resíduos e tem capacidade muito importante de comunicação, relevante neste tipo de projetos inovadores», confirma o espanhol Javier Pinedo Alonso, que se apresentou no simpósio em nome da APRIA para abordar o desenvolvimento do HAMSYS.

Em nome do ambiente

O sistema de reaproveitamento de gases fluorados desenvolvido insere-se não só no propósito de valorização de uma economia circular (produção, consumo e reutilização) como permite a diminuição dos efeitos da incineração, o destino final dos compostos sem potencial de reaproveitamento e com efeitos nocivos no ambiente.

As emissões resultantes da queima destes gases aumentaram 60 por cento desde 1990 e têm um potencial de aquecimento global 23 500 vezes superior ao CO2, o dióxido de carbono já muito preocupante devido ao contributo para as mudanças climáticas.

O principal objetivo do LIFE 4 F-Gases é a melhoria da sustentabilidade do setor de refrigeração e ar condicionado. O protótipo pretende demonstrar a viabilidade da separação eficiente de resíduos químicos de elevado potencial de aquecimento global, existentes em equipamentos em fim de vida. As substâncias separadas podem integrar a formulação de novas misturas de refrigerantes, ecologicamente corretas, minimizando o impacto do setor nas mudanças climáticas.

Economia também manda

Em Portugal, a fatura ambiental é agravada pela «grande dificuldade» no acesso aos equipamentos completos em final do ciclo de vida para a remoção responsável dos gases fluorados, devido à existência de um mercado paralelo informal de comercialização, nas palavras de Rosa Monforte.

A reutilização de resíduos, que não se limitam aos gases fluorados, é o «grande tema» da Europa, lembra a diretora-geral da ERP Portugal, porque «não é autossuficiente em matérias-primas e precisa da reciclagem e da economia circular» para assegurar o melhor aproveitamento dos recursos existentes.

A entrega de resíduos é importante para a recuperação de matérias- primas, nomeadamente «as coisas que temos em casa a pensar em levar um dia para a reciclagem e acabam guardadas em gavetas, sem uso, porque não ocupam espaço ».

Durante os 20 anos de atividade, a ERP Portugal tem desenvolvido inúmeras ações de comunicação e sensibilização do consumidor para a importância da reciclagem. Estes programas foram apresentados por Rosa Monforte no simpósio, merecendo a curiosidade dos participantes, nomeadamente sobre a resposta das gerações mais novas. Entre as iniciativas da ERP Portugal destacam-se a Geração Depositrão, o mais longo projeto, após 18 anos consecutivos a promover a literacia ambiental de crianças e jovens.

Em contrapartida, a ação mais recente procura a articulação do consumidor com o órgão executivo de maior proximidade. Intitulado Junta na Freguesia, o programa pretende facilitar a entrega de resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos por parte dos cidadãos. O projeto vocacionado para as empresas designa-se Parceiro Sustentável e visa apoiar e inspirar a adoção de práticas sustentáveis nos seus negócios. O programa oferece suporte e reconhecimento às empresas que demonstram compromisso com a sustentabilidade, incentivando o desenvolvimento e comunicação de iniciativas ambientais.