Comissão prevê um contínuo agravamento estrutural do défice
O desequilíbrio estrutural das contas públicas vai agravar-se em 2016 e 2017, prevê a Comissão Europeia, contrariando as previsões do Governo inscritas no Orçamento do Estado e no Programa de Estabilidade. Os números inscritos nas previsões da Primavera, divulgadas esta terça-feira, dia 3 de Maio, afirmam uma divergência persistente entre as contas de Bruxelas e de Lisboa, e antecipam uma violação das regras previstas no Tratado Orçamental.
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A Comissão espera uma redução do défice global até 2017, garantindo um valor inferior a 3% do PIB já em 2016. A evolução deve-se contudo à lenta retoma da economia nos próximos anos que ajudará o orçamento, avisam os técnicos de Bruxelas, que antecipam um agravamento contínuo do défice estrutural, o que desconta o efeito do ciclo económico e das medidas temporárias.
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"Considerando as especificações detalhadas de todas as medidas incluídas no Orçamento de 2016, o défice global deverá atingir 2,7% do PIB em 2016. Devido ao volume limitado de medidas de consolidação orçamental, o saldo estrutural deve deteriorar-se ligeiramente por cerca de um quarto de ponto de PIB em 2016", lê-se no documento da Comissão Europeia, que sublinha que o saldo estrutural já se tinha agravado em 2015, em "cerca de meio ponto percentual do PIB".
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Os valores ficam distantes dos antecipados pelo Governo que, no Orçamento do Estado e no Programa de Estabilidade, aponta para um défice orçamental global de 2,2% do PIB em 2016, acompanhado de uma redução de 0,3 pontos no saldo estrutural. A divergência em relação a 2016, que já era conhecida, fica agora confirmada nas previsões da Primavera. E tal como o Negócios avançou, estende-se a partir de hoje também a 2017.
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Para Bruxelas o défice estrutural foi de 2% do PIB em 2015, passará a 2,2% em 2016 e agravar-se-á até 2,5% do PIB no ano seguinte. Para 2017, a Comissão justifica a previsão de agravamento estrutural com a inexistência de medidas de consolidação orçamental suficientemente especificadas no Programa de Estabilidade para serem consideradas.
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"O défice global deverá baixar para 2,3% do PIB em 2017 [valor que compara com os 1,4% previstos pelo Governo], principalmente devido à medida extraordinária de recuperação de uma garantia do BPP que vale cerca de 0,25 pontos percentuais. Na ausência de medidas adicionais suficientemente especificadas, o saldo estrutural deverá continuar a deteriorar-se ligeiramente, elevando a deterioração ao longo do horizonte de projecção [entre 2015 e 2017] a cerca de meio ponto percentual", escrevem os técnicos da Comissão Europeia.
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Os números da Comissão contrariam o Programa de Estabilidade, onde Mário Centeno inscreveu uma trajectória de melhoria estrutural das contas públicas, com o défice estrutural a partir dos 2,0% em 2015, passando a 1,7% em 2016, e a 1,3% em 2017.
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A evolução prevista pelos técnicos da Comissão vai em sentido oposto às regras europeias, que impõem uma melhoria continua do saldo orçamental até que seja atingido o chamado Objectivo de Médio Prazo que, segundo o Governo, passou a ser de um excedente orçamental de 0,25% do PIB a atingir antes do final da década.
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A única boa notícia para o Governo na frente orçamental encontra-se na previsão de défice global para este ano que, ao ficar abaixo de 3% do PIB, poderá permitir a conclusão do Procedimento dos Défices Excessivos no final de 2016, conseguindo um objectivo que foi falhado no final de 2015 – e que ainda poderá valer sanções a Portugal (ver caixa em baixo).
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As previsões da Comissão apontam para um crescimento económico ligeiramente mais fraco que o esperado pelo Governo, não antecipando um crescimento superior a 1,7% em 2017, contra os 1,8% antecipados no Programa de Estabilidade. "O PIB português deverá expandir-se por 1,5% em 2016 e 1,7% em 2017", lê-se na nota da Comissão, que acrescenta que "os riscos para o cenário macroeconómico estão enviesados para o lado negativo e estão relacionados com incerteza de política, desenvolvimentos dos mercados financeiros, e pressão persistente de desalavancagem no sector privado".
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PIB | Défice | |
---|---|---|
Comissão Europeia (Previsões Primavera) | 1,5 | 2,7 |
Comissão Europeia (Previsão anterior) | 1,6 | 3,4 |
Governo | 1,8 | 2,2 |
FMI | 1,4 | 3,2 |
Montepio | 1,7 | 2,8 |
BPI | 1,6 | 2,9 |
Banco de Portugal | 1,5 | |
Conselho das Finanças | 1,7 | 2,7 |
NECEP - Católica | 1,3 | 3,1 |
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Os riscos para as contas públicas também estão enviesados para o lado negativo, avalia a Comissão que, além de desenvolvimentos negativos na frente macroeconómica, admite eventuais derrapagens na despesa e dificuldades em acordar medidas adicionais de consolidação orçamental para 2016 e 2017.
Os riscos para as contas públicas também estão enviesados para o lado negativo, avalia a Comissão que, além de desenvolvimentos negativos na frente macroeconómica, admite eventuais derrapagens na despesa e dificuldades em acordar medidas adicionais de consolidação orçamental para 2016 e 2017.
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Comissão com todos os dados para avaliar Portugal
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A Comissão Europeia dispõe a partir de hoje de todos os dados que necessita para avaliar o incumprimento das regras do Pacto de Estabilidade. Portugal deveria ter fechado 2015 com um défice orçamental inferior a 3% do PIB para que a Comissão Europeia pudesse recomendar o fecho do Procedimentos dos Défices Excessivos (PDE) a que o país está sujeito desde 2009. Tal não aconteceu, e perante a derrapagem orçamental, o prazo para a conclusão do PDE terá também de derrapar um ano. À Comissão cabe agora avaliar o incumprimento e propor sanções se julgar adequado – o que poderá ir de um maior controlo sobre a gestão orçamental no país até à inédita imposição de multas. Bruxelas levará em linha de conta o desempenho orçamental de 2015, o esforço orçamental registado no período 2013 a 2015, e os planos de consolidação para o futuro previstos no Programa de Estabilidade e antecipados nas Previsões da Primavera. Portugal pontua mal em todos os indicadores: agravou o saldo orçamental estrutural em 2015 quando prometeu reduzi-lo, fez um ajustamento estrutural entre 2013 e 2015 que ficou pela metade do recomendado ao país no PDE, e está a desafiar novamente as regras e recomendações de Bruxelas para este ano e seguintes. A posição da Comissão deverá ser conhecida no final do mês.
*Em Bruxelas, a convite da Comissão Europeia
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