pixel

Negócios: Cotações, Mercados, Economia, Empresas

Orçamento do Estado 2026 - Do retrato à rota

Por Paulo Madruga | Partner | EY-Parthenon

Introdução

Como transformar a proposta de Orçamento do Estado 2026 (OE2026) numa estratégia com metas, tetos e resultados.

Portugal entra em 2026 com saldo prudente, dívida em queda e financiamento estável. É a altura de ligar as contas a um roteiro plurianual, com prioridades claras, indicadores úteis e execução monitorizada.

Portugal chega a 2026 com uma base de contas públicas que vale a pena potenciar: saldo prudente, dívida em descida e condições de financiamento estáveis. O Orçamento do Estado tem, assim, a oportunidade de consolidar a confiança e transformá-la em resultados mensuráveis para 2026–2030.

Em termos gerais, um Orçamento do Estado pode ser visto sob múltiplas perspetivas. O desafio aqui seguido foi analisar a proposta do Orçamento de Estado para 2026 aplicando um instrumento amplamente usado na gestão — a matriz SWOT (Forças, Fraquezas, Oportunidades, Ameaças) — orientando a leitura para a definição de uma estratégia clara, com prioridades, metas e passos de execução.

Critérios de análise

Como foi construída a matriz SWOT ?

Qualidade do exercício orçamental.

Observou-se a coerência entre missão, programas e medidas, a existência de indicadores de desempenho e o estado do Quadro de Despesa de Médio Prazo com tetos por missão. Cada ponto foi redigido em formato causa → efeito e ligado a uma métrica observável.

Enquadramento económico e estrutura das contas.

Consideraram-se crescimento, inflação e juros; a composição e a sensibilidade da receita; e as pressões da despesa corrente, avaliando o impacto na capacidade de investir e na estabilidade do saldo.

Investimento e execução.

Avaliou-se a despesa de capital pela priorização, a qualidade (com Análise Custo-Benefício) e a capacidade de execução (licenciamento, compras, ligações à rede), bem como a integração entre OE, fundos da União Europeia e a disponibilidade de dados para escrutínio público.

Resiliência e Inovação

Capacidade de resposta a choques externos, transição climática, digitalização e modernização do Estado.

OE2026 - Análise SWOT

A matriz SWOT apresenta uma visão consolidada dos fatores internos (Forças e Fraquezas) e externos (Oportunidades e Ameaças) que influenciam o desempenho do Orçamento de Estado 2026.

Forças
  • Credibilidade orçamental: saldo prudente e trajetória de dívida/Produto Interno Bruto em queda.
  • Capacidade técnica instalada: orçamentação por programas e revisão da despesa já em curso.
  • Receita corrente estável e relativamente diversificada.
  • Tesouraria moderna através da Conta Única do Tesouro.
  • Financiamento europeu disponível: Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e fundos da União Europeia prontos a apoiar despesa de capital.
  • Administração pública competente em dados, estatística e auditoria.
Fraquezas
  • Orientação plurianual ainda a consolidar: falta completar o Quadro de Despesa de Médio Prazo.
  • Pressões da despesa corrente que limitam a folga para investir.
  • Base fiscal pró-cíclica, sensível ao abrandamento económico.
  • Financiamento disperso entre OE, PRR e fundos da União Europeia.
  • Processos administrativos morosos que atrasam projetos.
  • Indicadores de desempenho incompletos (linhas de base e fontes por fechar)
Oportunidades
  • Estabilidade das taxas de juro para alongar maturidades e libertar margem a investimento.
  • Agenda europeia favorável a investimento verde e digital.
  • Digitalização do Estado para medir e gerir por resultados.
  • Aumento de produtividade via investigação, automação e transição energética.
  • Habitação e eficiência energética com forte efeito multiplicador económico e social.
  • Mais transparência e participação pública para robustecer a confiança.
Ameaças
  • Abrandamento na União Europeia que pode afetar exportações e receitas.
  • Volatilidade de preços e juros com impacto na despesa e no investimento.
  • Risco de subexecução do PRR por entraves de rede e licenciamento.
  • Pressão sociolaboral sobre a massa salarial e serviços contratualizados.
  • Alterações regulatórias ou judiciais com efeito nas despesas fiscais.
  • Eventos climáticos extremos que exigem contingência e investimento resiliente.

Principais resultados

!

O que podemos reforçar

01

Partimos de uma posição sólida. A confiança conquistada é um ativo para acelerar a transição de um orçamento anual para um roteiro plurianual com metas claras.

02

Temos instrumentos que funcionam - falta generalizá-los. A orçamentação por programas e a revisão da despesa já existem e podem ganhar escala com indicadores simples, fiáveis e públicos.

03

Há espaço para investir melhor. Unificar fontes de financiamento por missão e exigir Análise Custo-Benefício em grandes projetos aumenta impacto e previsibilidade.

04

Transparência cria tração. Painéis trimestrais e previsão deslizante ajudam a corrigir rumo e a proteger prioridades em tempo útil.

05

Resiliência é uma escolha. Uma reserva anticíclica e uma Declaração de Riscos Fiscais tornam choques externos mais geríveis sem sacrificar investimento.

Próximos Passos

O que acrescentar e fazer já:

01

Publicar o Quadro de Despesa de Médio Prazo (2026–2029)

Com tetos por missão e metas anuais.

Prioridade Alta
02

Criar envelopes plurianuais únicos por missão

Juntando OE, PRR e fundos da União Europeia numa só grelha de prioridades e contrapartidas.

Prioridade Alta
03

Definir 3 a 5 indicadores por programa

Com linha de base, fonte e data-alvo; publicar painéis trimestrais de execução física e financeira.

Prioridade Média
04

Avaliar grandes investimentos

Com Análise Custo-Benefício e decisões registadas num comité com atas públicas.

Prioridade Média
05

Adotar previsão deslizante

A 12 meses, atualizada por trimestre, para ajustar o plano à realidade.

Prioridade Média
06

6. Instituir uma reserva anticíclica

De 0,2 – 0,3% do Produto Interno Bruto e publicar uma Declaração Anual de Riscos Fiscais.

Prioridade Média
07

Reforçar a disciplina da despesa corrente

Com revisão da despesa vinculativa, cláusulas de caducidade e critérios de encerramento para programas que não entregam resultados.

Prioridade Média

O que interessa agora

Com estas adições, o OE2026 mantém a solidez e ganha direção. O investimento publico passa a ter calendário, responsável e medida; a despesa corrente cresce com regra e escrutínio; a receita torna-se menos pró-cíclica; e os contribuintes entendem onde e porquê se investe cada euro. Em vez de prever receitas e definir limites de despesa, o orçamento abre caminho.

Os orçamentos de estado oferecem uma plataforma rara de confiança. Aproveitá-la bem significa acrescentar arquitetura e disciplina: horizonte, envelopes integrados, métricas úteis, calendários claros e salvaguardas de resiliência. É assim que transformamos a credibilidade presente em crescimento sustentado — do retrato à rota.

Componente Fiscal

Por Pedro Fugas | Tax Partner | Country Tax Leader EY Portuguese Cluster

No detalhe da componente fiscal que leitura faz a EY da análise swot do orçamento?

Pontos fortes

Sem aumento de impostos no OE e redução generalizada de carga tributária em medidas aprovadas fora do OE mas com cabimento orçamental em 2026.

Pontos fracos

Pouca ambição para empresas, nomeadamente: IRC desce 3 pp em 3 anos (17% em 2028), mas poderia ir aos 15% (conforme promessa feita no Programa Acelerar a Economia), faltou redução progressiva da Derrama Estadual (conforme plano eleitoral) e da Tributação Autónoma (conforme acordo de concertação social) e ausência de incentivos ao investimento.

Oportunidades

Estabilidade fiscal e credibilidade que passa para os mercados e investidores.

Ameaças

Impacto que o choque fiscal, proveniente do Plano Construir Portugal, anunciado em setembro e já aprovado em conselho de ministros, terá na execução orçamental que tem margem quase nula, de cerca de 0,1% do PIB.