Jane Kirkby 19 de Outubro de 2017 às 10:15

As alterações ao Código dos Contratos Públicos

Não pode deixar de se evidenciar que todas as medidas de simplificação dos procedimentos pré-contratuais beneficiam em particular as PME.

O Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, veio introduzir profundas alterações ao Código dos Contratos Públicos (CCP) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, que já havia sido modificado diversas vezes ao longo dos últimos anos. De entre as mais significativas alterações introduzidas no Código decorrentes da transposição das diretivas comunitárias, destacam-se as que dão um "empurrãozinho" às Pequenas e Médias Empresas (PME) no acesso aos contratos públicos.

A mais evidente prende-se com a promoção da adjudicação de contratos sob a forma de lotes, através do novo artigo 46.º-A, que estabelece como regra que, na formação de contratos públicos de aquisição ou locação de bens, ou aquisição de serviços, de valor superior a € 135.000,00, e empreitadas de obras públicas de valor superior a € 500.000,00, as entidades adjudicantes devem prever, nas peças do procedimento, a adjudicação por lotes. Só assim não será em situações devidamente fundamentadas, das quais o n.º 2 do referido artigo dá como exemplos: a) Quando as prestações a abranger pelo respetivo objeto forem técnica ou funcionalmente incindíveis ou, não o sendo, a sua separação causar graves inconvenientes para a entidade adjudicante; b) Quando, por motivos de urgência ou por imperativos técnicos ou funcionais, a gestão de um único contrato se revele mais eficiente para a entidade adjudicante.

PUB

Esta medida abre as portas dos procedimentos pré-contratuais às PME, que até agora, por falta de estrutura e capacidade de resposta, não conseguiam responder às solicitações das entidades adjudicantes, ficando assim excluídas do mercado público.

Uma outra opção legislativa, sinal da estratégia dos legisladores comunitário e nacional de proteção das PME, é a possibilidade de ser utilizado como critério de desempate a proposta que tiver sido apresentada por empresas sociais ou por pequenas e médias empresas, por ordem crescente da categoria das empresas, introduzida pelo novo n.º 6 do artigo 74.º do CCP.

Por outro lado, tendo-se verificado que a imposição de requisitos demasiado exigentes em termos de capacidade económica e financeira, nos procedimentos com prévia qualificação, constitui frequentemente um obstáculo injustificado à participação das PME nos contratos públicos, em concretização da diretiva comunitária, o artigo 165.º/3 do CCP passa agora a proibir, salvo em casos devidamente justificados, que as entidades adjudicantes exijam aos concorrentes um volume de negócios que exceda o dobro do valor do contrato.

PUB

Para o mesmo efeito, uma medida que, não obstante não se dirigir exclusivamente às PME, lhes dá também um incentivo é a possibilidade de o subcontratado poder reclamar, junto do contraente público, os pagamentos em atraso que lhe sejam devidos pelo cocontratante, exercendo o contraente público o direito de retenção sobre as quantias do mesmo montante devidas ao cocontratante por força do contrato principal (artigo 321-º-A). Ora, para além da evidente vantagem genérica que esta nova regra tem no desbloqueio de alguns contratos, que por incumprimento dos pagamentos aos subcontratados veem a sua execução suspensa, é também uma importante medida para empresas com uma tesouraria mais apertada, como é o caso das PME, e que não raras vezes ficam reféns dos timings de pagamento alargados dos cocontratantes.

Por fim, não pode deixar de se evidenciar que todas as medidas de simplificação dos procedimentos pré-contratuais beneficiam em particular as PME, que têm na carga administrativa um dos maiores obstáculos à sua participação nos contratos públicos, uma vez que dispõem de estruturas pequenas. A título de exemplo, destaca-se o Documento Europeu Único de Contratação Pública, que constitui uma autodeclaração que atesta a aptidão, a situação financeira e as capacidades das empresas, e é utilizada como prova preliminar nos procedimentos de contratação pública, substituindo diversos certificados e outros documentos relacionados com critérios de exclusão e seleção, que torna mais leve o processo de candidatura ou de apresentação de proposta.

O legislador comunitário não exige taxas obrigatórias de sucesso das iniciativas nacionais para fomentar a participação das PME, no entanto, para que as medidas agora tomadas não caiam em "saco roto", o código passa a prever o acompanhamento de perto dos resultados das mesmas e do efetivo envolvimento das PME's nos procedimentos pré-contratuais. 

PUB

Este artigo foi redigido ao abrigo do novo acordo ortográfico.

Saber mais sobre...
Saber mais Código dos Contratos Públicos PME
Mais Artigos do autor

Mais Artigos do autor

Pub
Pub
Pub