Pedro Santana Lopes 01 de Junho de 2016 às 21:15

A imaginação dos burocratas

Continua a não ser muito fácil a vida de quem quer fazer obra. Quer na minha vida profissional como advogado, quer, principalmente, como Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), sei que ainda são muitas as dificuldades a vencer para se demolir, para se construir, para se reabilitar, enfim, para melhorar a cidade ou a terra em que vivemos.

Recordo-me que quando exerci as funções de presidente da Câmara de Lisboa entre 2002 e 2005 consegui um dia celebrar um protocolo com as várias empresas e entidades que têm intervenção nos processos de licenciamento. E o que procurava garantir esse protocolo assinado com pompa e circunstância no Salão Nobre dos Paços do Concelho de Lisboa? Nada mais nada menos do que todos se comprometerem, nos comprometermos, a respeitarmos os prazos legalmente estabelecidos e a aceitar que a falta de resposta, no tempo previsto na lei, originava, pura e simplesmente, o deferimento tácito do que era requerido. A regra tinha já sido consagrada no Código do Procedimento Administrativo, só que não era cumprida. E o problema é esse, é que o tempo passou e continua a não ser cumprida.

 

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Um projeto de arquitetura nas suas especialidades vai da empresa da eletricidade à do gás, da água às entidades de segurança, e a outras também previstas na lei. Essas entidades têm de dar o seu parecer sobre os projetos de especialidades. Só que como se atrasam, as pessoas têm de ficar à espera e a essas empresas e entidades nada acontece por violarem esses prazos. Deviam pagar multas ou juros sobre o prejuízo causado, tal como os cidadãos particulares e as empresas pagam os juros e as multas quando se atrasam a pagar os impostos e as contribuições.

 

Acresce que os projetos em matéria de segurança contra incêndio vão à Autoridade Nacional de Protecção Civil. Antes, apesar de tudo, os bombeiros davam o seu parecer nesta especialidade, depois faziam a vistoria final junto com a Câmara para ser passada a licença de utilização. Apesar de tudo, tenho ideia de que o processo era muito mais expedito. Agora, com a Autoridade Nacional de Protecção Civil, o processo ficou mais pomposo e, por isso, mais demorado. A obra pode estar toda pronta, mas tem de se esperar umas boas semanas até virem dizer que está feito o que está feito. É um género daquelas declarações que já aqui falei de não dívida ou sobre o registo criminal, que o Estado exige que o cidadão peça ao Estado para se poder fazer um pedido ao Estado. É tudo ridículo, mas julgo que a ministra Maria Manuela Leitão Marques já está a trabalhar nisso. Oxalá.

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Há outro aspeto interessante, é que se quisermos fazer uma demolição devido à existência de amianto, e após análise ultracomplexa e aprovação por parte da Câmara, faz-se a adjudicação da empreitada e depois a empresa adjudicatária tem de requerer à Autoridade das Condições de Trabalho a autorização para proceder à demolição. Em vez de isto tudo ser em sede de especialidades e dentro dos prazos, não: fica para depois. E já com tudo pronto, ficamos à espera de mais umas licenças, que se juntam ao célebre certificado energético, que foi mais um ingrediente nos complexos e burocráticos processos relacionados com a compra e arrendamento de casas. Não sei quantos simplexes vão ser precisos para acabar com estes absurdos todos.

 

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Advogado 

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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