Virgolino Faneca escreve ao professor dos professores sobre... professores

Quando existir um ministro da Educação que os professores elogiem a tua existência estará em risco, caro Mário. É preciso combater esta possibilidade. Com todas as forças.
Celso Filipe 22 de Junho de 2018 às 17:00

Caro Mário

PUB

Venho por este meio manifestar o mais profundo apreço pela classe que representa, a dos professores. Aliás, julgo que a par dos pais e das namoradas (ou namorados) os professores integram a categoria das pessoas que deixam em nós marcas para toda a vida. Por exemplo, lembro-me da severidade do professor da quarta classe, da castidade da professora de Português que saltava o canto nono dos Lusíadas por ser libidinoso, de um outro professor de Português que me ensinou que a mania das grandezas era a maior das fraquezas, de uma professora de Inglês que me apresentou Fernando Pessoa aos 14 anos, de uma professora da faculdade com quem tive uma discussão ridícula sobre a forma de podar uma videira ou de um outro que nos incitava a ter orgasmos intelectuais. E existem mais, muitos mais, arquivados num lugar acessível da memória, porque os professores são fundamentais na construção da nossa entidade. Agradeço e respeito. Além de ensinarem têm de se pacientes, seja para aturar as traquinices da infância, as parvoíces do primeiro ciclo, as tolices e arrufos dos anos seguintes ou a pesporrência típica do ensino superior. São mesmo pessoas especiais.

Por isso, caro Mário, surpreende-me a artistice de que és mentor, a de arquitectar uma greve especial em que os professores só faltam a uma determinada actividade, que por acaso é determinante para os alunos poderem conhecer as notas.

PUB

Não estou a ver os meus professores (e olha que foram todos do ensino público) a alinhar com este método de protesto. Não é uma questão de legalidade ou falta dela, é querer ter o melhor dos dois mundos: protesta-se e não se perdem as regalias por inteiro. É efectivamente ardiloso mas também pouco ético, diria, mas quem sou eu para dizer alguma coisa ao grande timoneiro que tu és.

Mas se queres ser consequente, Mário, julgo que devias ir mais além nesta estratégia. Por exemplo, podiam dar as notas todas ao contrário obrigando os encarregados de educação e/ou os alunos a protestarem, criando assim uma situação insustentável nos serviços administrativos. Podiam, também, criar um fórum de dúvidas com o e-mail do ministro da Educação, ou, arte suprema, pedir a Marcelo Rebelo de Sousa que fosse dar notas. Afinal, ele não só é professor, como se presta a tudo, até a cantar a "Minha Casinha" com os Xutos & Pontapés no Rock in Rio. Ou ainda contratar a Maria Leal para liderar as negociações com o Governo. A bem da sanidade mental e também da auditiva, as partes alcançariam um acordo entes de ela acabar de cantar "O Verão É Nosso".

PUB

As más-línguas dizem que tu tens tempo para conceber estes planos maquiavélicos derivado do facto de já não dares aulas há uma caterva de tempo. Não acredito nisso. Pelo contrário. Os teus alunos são os outros professores e trabalho não falta, além de que o fazes em prol dos outros, o que revela a tua natureza altruísta. Afinal, quando existir um ministro da Educação que os sindicatos elogiem, o teu posto ficará em risco, e é isso que é preciso evitar a todo o custo.

Vai em frente que eu fico aqui a observar.

PUB

Um abraço deste teu,

Virgolino Faneca

 

Virgolino Faneca

PUB

 

PUB
Pub
Pub
Pub