António Costa: "Temos de manter nervos de aço" com os EUA
Manter a calma e pensar no futuro. É esta a receita de António Costa, presidente do Conselho Europeu, para lidar com os Estados Unidos de Donald Trump. O antigo primeiro-ministro é um dos convidados da "The Lisbon Conference", que decorre hoje em Lisboa e assinala o primeiro aniversário do Canal NOW.
Em conversa com José Manuel Durão Barroso, antigo presidente da Comissão Europeia e curador da conferência, Costa admite que "vivemos um momento de alguma incerteza e imprevisibilidade" na relação transatlântica, principalmente em matéria de defesa e comércio, mas é importante não esquecer que a relação entre os dois blocos perdura para lá do mandato de um Presidente. "Temos de manter nervos de aço e manter o nosso diálogo com os EUA a um nível institucional. Não podemos estar a responder a cada 'tweet', a cada decisão que é tomada publicamente. Temos de dialogar com os EUA", afirmou.
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Pressionado por Durão Barroso a comentar a linguagem agressiva que Donald Trump tem usado com a União Europeia, o homem que ficou conhecido como "otimista irritante", relativiza: "Como temos visto ao longo destes meses, muitas das decisões tomadas são revertidas ou suspensas ou adiadas nos dias seguintes".
"Ouvimos coisas desagradáveis? Sim, mas devemos focar-nos no essencial. E o essencial é que ao longo de 200 anos a América e a Europa desenvolveram uma parceria única. Devemos preservá-la", afirmou. Mas Costa admite cenários em que seja preciso bater o pé. "Claro que, se formos atacados, se formos objeto de medidas discriminatórias, teremos de responder. E a Comissão [Europeia] está preparada para responder, designadamente em matéria comercial. Mas tudo devemos fazer para evitar uma escalada", defendeu.
Em relação à guerra comercial, o presidente do Conselho Europeu considera "a racionalidade económica muito duvidosa", já que "significa mais impostos, maiores custos e mais inflação nos EUA". A União Europeia, diz, já "fez a proposta mais generosa que podia fazer: tarifas zero para ambos os lados". É, no entanto, uma proposta que Washington não poderia aceitar já que, de acordo com Costa, avançou com estas taxas aduaneiras "para compensar a redução de receita que pretende ter no desagravamento fiscal".
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"Tarifa por tarifa é um erro, divide a Europa, tem efeitos assimétricos e verdadeiramente acho que não é do interesse dos EUA. Eu tenho muita esperança porque acredito que no fim de tudo há uma linha de racionalidade que dirige a ação política", comenta.
Durão Barroso quis, depois, saber, se o presidente do Conselho Europeu acredita que haverá uma "comunitarização da defesa europeia", tendo em conta a ameaça russa para o continente. A resposta de Costa, resumidamente, foi sim. Reconhecendo que "a invasão da Ucrânia pela Rússia foi um momento de transformação da Europa", levando os Estados-membros a elevarem os seus gastos com defesa em 30% nos últimos três anos, o antigo primeiro-ministro português sublinhou a importância de se gastar não apenas mais, mas melhor.
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"Nós não precisamos de 27 grandes Forças Armadas, precisamos de um robusto sistema de defesa coletiva. E para isso temos de trabalhar com base nos planos da NATO, nas prioridades definidas pela agência europeia de Defesa, definir as capacidades prioritárias para investirmos", afirmou.
"Esta discussão sobre os 5%, 3% é, do meu ponto de vista, uma má forma de tratar o assunto. O que interessa não é um número mágico. O que interessa é quais são as capacidades que nós temos de preencher rapidamente para assegurarmos a nossa defesa coletiva (...) Se é 6% ou 3%, essa é uma segunda derivada e que só é possível responder em função da primeira. É nisso que nos devemos focar. E para isso precisamos de uma estrutura europeia. Essa estrutura deve ser no âmbito da NATO", defendeu.
Para António Costa, a União Europeia deve concentrar-se em ser uma entidade política, mas não substituir "aquilo que deve ser a instituição militar que existe, que é a NATO". "Devemos negociar os EUA como é que progressivamente vamos assumindo crescentes responsabilidades e desonerando os EUA. Esta é a verdadeira discussão que importa", remata.
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António Costa falou ainda sobre o trabalho que a UE tem feito para aumentar a sua competitividade, o que a fortalecerá face aos EUA. Hoje, diz, "há uma vontade política muito clara no Conselho [Europeu], como eu nunca tinha visto, para romper e vencer alguns dos tabus que eram fundamentais". É o caso da união de capitais, um projeto adiado desde a fundação do mercado único em 1992.
"A vontade política existe e a minha determinação é muito clara e tenho trabalhado nesse sentido com a comissária [Maria Luís Albuquerque] no sentido de, sempre que necessário, puxar de novo o tema ao Conselho Europeu para vencermos os detalhes e reenfocar a questão no objetivo político fundamental de completar a união de poupança e investimentos. Sinceramente acho que há vontade política e capacidade de tomar decisões nesse sentido", garantiu.
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