Como se combate o populismo? "Com eleições", responde Fukuyama
Com a ascensão do populismo, como se pode combatê-lo? A pergunta teve uma resposta por parte do politólogo norte-americano, Francis Fukuyama, que vê apenas nas eleições a capacidade de combater esta vaga mundial, sobretudo do populismo, apontando casos concretos como os próprios EUA, mas também a Hungria, a Índia ou a Turquia.
"Como combater o populismo?", questionou Fukuyama. "Com eleições", respondeu, admitindo que "é um trabalho duro, lento, mas é assim que se evita o retrocesso - como na Polónia recentemente. Talvez nos EUA no próximo ciclo eleitoral - veremos".
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Para o investigador da Universidade de Stanford, "a eleição de Donald Trump representa uma ameaça muito mais séria à democracia liberal do que qualquer um dos seus antecessores, porque os Estados Unidos são a maior democracia, a mais poderosa, a mais influente - o país que usou o seu poder nos últimos 70 anos para construir uma ordem liberal internacional."
Mas numa nota de atualidade, referindo-se aos resultados das eleições locais e estaduais desta terça-feira nos EUA, Fukuyama, antecipa o que poderá ser uma mudança. "As eleições de ontem são um sinal de esperança", afirmou, referindo-se em concreto à eleição do mayor de Nova Iorque, o democrata Zohran Mamdani. Para Fukuyama, "a democracia nos EUA não está morta - ainda existem travões significativos ao poder presidencial. Os tribunais têm sido o principal. Muitos dos decretos executivos de Trump foram contestados e anulados por juízes federais inferiores", lembrou.
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Para Francis Fukuyama, muito do que temos na atual crise e ascensão do populismo nacionalista está relacionado com a falta de confiança - "a questão mais profunda" - em diversas camadas da sociedade. Para o filósofo norte-americano, o populismo é o primeiro fator. "Numa democracia, um líder populista afirma que as instituições são ilegítimas, que são manipuladas por elites, que a política deve ser sobre personalidade e não políticas - e conduz a uma erosão do Estado de Direito", lembrando o caso paradigmático do peronismo na Argentina e que teve ramificações noutros países da América Latina.
Para Fukuyama, outra mudança "importante ocorreu na definição do conservadorismo", dando o exemplo da era de [Ronald] Reagan, quando o "conservadorismo se baseava em políticas: baixos impostos, desregulação, privatização". Hoje, afirma o politólogo, "o conservadorismo nos EUA baseia-se em teorias da conspiração. É populista porque supõe que a realidade é manipulada por elites malévolas."
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O filósofo norte-americano aponta ainda um terceiro fator para a desconfiança: a "dificuldade das democracias em fazerem coisas", no sentido de darem respostas às necessidades das populações. Fukuyama deu o exemplo da construção da hidroelétrica das Três Gargantas, na China, que demorou menos de dez anos a estar pronta, por contraponto à estação ferroviária de alta velocidade em Estugarda, cujo projeto data dos anos de 1980. "Em muitos países, a incapacidade de fornecer bens públicos alimenta a frustração", salienta.
Por outro lado, o ataque à ciência e a desconfiança face ao conhecimento científico, lembrando que a pandemia da covid-19 "minou a confiança pública", devido à constante mudança dos conselhos médicos e a incerteza que se criou com o desconhecimento sobre o vírus.
Outro fator de desconfiança está relacionado com a disseminação da Internet e das redes sociais. "O populismo global coincide com a ascensão da Internet e das redes sociais", lembra Fukuyama. "Antes havia media tradicionais com normas jornalísticas. Hoje qualquer pessoa publica qualquer coisa — os algoritmos amplificam o sensacionalismo, a raiva e as teorias da conspiração porque é isso que atrai audiências. A informação degradou-se, a polarização aumentou", conclui.
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Por fim, o filósofo norte-americano aponta a igualdade e a alienação dos jovens da política, sobretudo dos homens.
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