Ana Tapadinhas: "Com a crise, os portugueses estão mais alerta para os seus direitos"
Os consumidores dispõem actualmente dos mecanismos necessários para reclamarem de situações lesivas dos seus direitos. Em muitos casos, a legislação nacional é até mais avançada do que na União Europeia, diz Ana Tapadinhas, jurista da Deco, em entrevista ao Negócios.
Como é que se devem queixar os consumidores em Portugal?
Os consumidores têm vários mecanismos para apresentarem reclamações, nomeadamente o recurso às associações de consumidores. Estas prestam informações aos consumidores no sentido de os tornar mais activos. Recomendamos os consumidores a exercerem os seus direitos junto da entidade reclamada de forma individual, no sentido de tentarem resolver o seu conflito junto do vendedor. Isto porque queremos consumidores cada vez mais conscientes dos seus direitos e activos no exercício desses mesmos direitos. Caso não consigam efectivamente resolver os seus conflitos de consumo, então têm vários mecanismos e vários organismos aos quais podem reclamar.
Quais são esses mecanismos?
Há um conjunto de mecanismos relativamente aos quais os consumidores devem apresentar as suas reclamações. Desde logo, as associações de consumidores, os centros de arbitragem, as entidades reguladoras que cada vez mais estão predispostas a serem receptoras dessas reclamações e ainda naturalmente o Livro de Reclamações. Antes de tudo, se o consumidor que nos contacta ainda não interpelou a entidade reclamada, deve fazê-lo primeiro. O objectivo é estimular a proactividade dos consumidores e, desta forma, tentar resolver de forma individual o seu conflito.
Quais são as áreas/sectores onde há mais reclamações por parte dos consumidores?

Os sectores infelizmente não mudam, o que significa que também tem de haver uma alteração de comportamento e de práticas que efectivamente não violem a lei. Há cerca de 10 anos que os sectores são sempre os mesmos. O sector das telecomunicações continua a ser o sector mais reclamado. Depois há um segundo sector que é o sector dos serviços públicos essenciais, nomeadamente electricidade e gás. Depois destacam-se as reclamações na banca e os seguros e temos ainda as questões relacionadas com a compra e venda de bens.
Considera que o consumidor português está actualmente bem protegido e tem à sua disposição todos os mecanismos de que necessita?
Consideramos e temos considerado ao longo dos anos, principalmente fruto dos contributos que temos dado para a melhoria da legislação. Pelo facto de recebermos diariamente inúmeras reclamações, temos um "know how" e matéria-prima que nos permite dar contributos que efectivamente respondem às necessidades dos consumidores. Em Portugal, temos legislação que protege os consumidores, que é uma legislação adequada, em muitos casos, é uma legislação que é até muitíssimo mais avançada do que aquela que existe nos restantes países da União Europeia. Por outro lado, há uma evolução em termos de percepção dos consumidores e de conhecimento dos seus direitos. A grande maioria dos contactos dos consumidores que aqui nos chega são reclamações com fundamento.
A atitude dos consumidores mudou?
Hoje em dia, são pessoas que efectivamente conhecem os seus direitos e sabem que naquela situação concreta estão lesados, ainda que possam eventualmente não saber a forma como os devem exercer. Nos serviços públicos essenciais, por exemplo, é comum hoje os consumidores saberem que existe uma norma fundamental que é a prescrição dos seis meses, ou seja, que não pode ser cobrado um consumo com mais de seis meses. Isto era uma situação que não existia há uns anos. E muito embora se tenha a ideia de que os consumidores portugueses não reclamam, nós de todo não temos essa ideia. Com certeza ainda haverá um caminho a percorrer mas, de facto, cada vez mais os consumidores estão conscientes da lesão de uma situação conflituosa. Podem não saber a forma mais adequada de exercício desse mesmo direito, mas têm mais consciência dele. Cada vez temos consumidores mais activos.
Esta mudança de atitude pode estar relacionada com a crise, ou seja, os consumidores estão mais predispostos a apresentar queixas do que antes da crise?
Essa é uma conclusão que para nós é certa. Épocas de crise têm também a outra face da moeda. Hoje em dia, qualquer pessoa olha para as facturas que recebe em sua casa e, tendo dúvidas, procura informação acerca dos seus direitos. Naturalmente que temos, em virtude desta circunstância exógena à defesa do consumidor, consumidores cada vez mais activos e que procuram informação acerca dos seus direitos e procuram também resolver os seus conflitos. Em épocas de crise, naturalmente estão mais alertados para um conjunto de situações que eventualmente podem lesar os seus interesses.
Que conselhos dá aos consumidores portugueses sempre que queiram fazer queixas?
Desde logo, antes de comprar qualquer bem faça um estudo de mercado, verifique preços e condições desses mesmos bens. Leia atentamente os contratos e, caso não perceba o conteúdo dos mesmos, procure junto dos organismos especializados nesta matéria, nomeadamente associações de defesa dos consumidores, centros de arbitragem, informação acerca dos seus direitos. Não assine qualquer contrato sem ter a certeza de quais são os seus deveres perante a entidade com quem vai celebrar esse contrato. Caso tenha um conflito, procure informação acerca dos seus direitos e sobretudo reclame e exerça os seus direitos.
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