Manuel Castelo Branco 13 de Dezembro de 2011 às 23:30

4 Meses e 3 Cimeiras depois!

Pierre Daninos, esse inesquecível autor francês que nos deixou através do Major Thompson, algumas das melhores páginas de humor sobre os ingleses e sobre os franceses, relatava que uma vez o Times publicou, na primeira página, uma notícia cujo título era: " Nevoeiro sobre o Canal, o Continente está isolado!"

Pierre Daninos, esse inesquecível autor francês que nos deixou através do Major Thompson, algumas das melhores páginas de humor sobre os ingleses e sobre os franceses, relatava que uma vez o Times publicou, na primeira página, uma notícia cujo título era: " Nevoeiro sobre o Canal, o Continente está isolado!"

A Cimeira de Sexta-feira 9, como sugeriu Wolfgan Munchau no Financial Times de anteontem, serviu para pouco mais do que colocar na agenda os temas internos do Reino Unido, enquanto a crise continua e se agrava.

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No Reino Unido há uma minoria que aprecia e defende o ideal europeu e uma maioria que não acredita na Europa. Dentro desta existem os que admitem conceder algo a Bruxelas desde que as contrapartidas sejam visíveis e os obstinados eurocépticos que habitam no partido Conservador, rejeitam qualquer tipo de limitações à soberania de Sua Majestade e, desde há meses, insistem na realização de um referendo que, colocaria um ponto final na aventura Europeia dos Britânicos.

O Primeiro-ministro Cameron quis aproveitar a crise do Euro para fazer regressar a casa alguns dos poderes soberanos delegados nas instituições comunitárias, designadamente, os que dizem repeito à regulamentação da actividade e instituições financeiras, vulgo City. Foi à cimeira do dia 9 ameaçar com um veto e, como os restantes 26 Estados fizeram orelha mouca, não teve outro remédio senão vetar mesmo.

A Chanceler Merkel não conseguiu impor uma alteração constitucional aos 27 países da União Europeia, nem evitar que o ex-chanceler Helmudt Scmidt lhe recordasse as responsabilidades históricas e geográficas da RFA, mas levou para os Alemães a boa notícia de que, pelo menos para já, tudo fica na mesma, ou seja, não haverá eurobonds, nem emissão de moeda pelo BCE, nem praticamente nada do que os restantes europeus queriam e a esmagadora maioria dos economistas aconselhava.

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O Presidente Sarkozy convencido de que, na senda heróica da história diplomática e militar francesa, tinha conseguido salvar a Europa abandonou a cimeira a sorrir e até ignorou uma tímida saudação do Primeiro-ministro Inglês.

David Cameron regressou à velha Albion sem o aperto de mão do Presidente francês, mas em glória, a acreditar nas sondagens do Mail e nas telefonistas do seu partido que, at last, não tiveram mãos a medir com as inúmeras felicitações. O Continente ficara, de novo, isolado!

Claro que não há bela sem senão!

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Em França François Hollande já veio dizer que se, como tudo indica, for eleito Presidente requererá a alteração do que foi acordado em 9 de Dezembro exigindo a introdução de eurobonds e a atribuição ao BCE de poderes para ser a Entidade prestamista de último recurso.

Na Grã-Bretanha Nick Cleg, que é Vice-Primeiro Ministro, faltou anteontem, ostensivamente, ao debate nos Comuns, o Primeiro-ministro da Escócia já protestou, a República da Irlanda diz que quer reintegrar o Reino Unido na Europa dos 26 e as associações que representam a Indústria e o Comércio manifestaram a sua preocupação e estranheza, atendendo a que o Continente é o principal parceiro da economia britânica.

Todo a Euroalergia britânica acabou por resolver dois dos problemas que os eurocratas teriam dificuldade em solucionar, caso tivesse sido aprovada a revisão dos Tratados: a lentidão de todo o processo e o risco considerável de chumbos referendários num número considerável de países.

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Agora trata-se "apenas" de gerar um acordo intergovernamental, matéria em que Bruxelas é especialista! Os riscos são menores mas existem, como se encarregou de recordar o Presidente do Parlamento Alemão ao alertar para a eventual inconstitucionalidade do que a Chanceler Merkel acordou.

Os mercados e as agências de rating já deram, contudo, a sua opinião sobre o que os líderes da nossa Europa decidiram no dia 9 de Dezembro: as cotações baixaram, os riscos da dívida soberana aumentaram e os países europeus vão todos receber o seu downgrade antes do previsto!

Pessoas como Stephen King, economista chefe do HSBC, escrevem artigos com títulos que, dificilmente, poderiam ser mais categóricos: " why the eurozone deal will fail".

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No dia da Cimeira o Economist escrevia:" a obsessão com a austeridade tornará as coisas pior, pois agravará a recessão. Sem um quadro de financiamento comum, a confiança não regressará aos investidores."

E publicava, nas páginas 68 a 70 um estudo comparativo com os erros que transformaram a crise de 1929/33 numa grande depressão. As coincidências são gritantes e assustadoras!

Sobre a Chanceler Merkel (e os seus cinco sábios) a doutrina divide-se: tem toda a razão, não sabe ter razão, já perdeu a razão ou nunca teve razão.

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O que eu sei é que a obstinação da Chanceler Merkel em criar, em tempo record, uma Europa à imagem e semelhança da sua Alemanha, está a produzir um efeito devastador na economia e nas condições de vida de todos os europeus e a assustar os investidores que, precisamente, se pretendem cativar.

É impossível sanear as finanças públicas dos países europeus, periféricos ou não, com os estados a endividarem-se a 7% ou mais e sem uma mutualização da dívida soberana que dê garantias aos investidores que ela será reembolsada na íntegra.

É impossível esperar que países, como Portugal, reduzam drasticamente, em dois anos, os níveis do endividamento e do deficit orçamental à custa de uma enorme sacrifício e redução da despesa de consumo e de investimento público e privado, se o espaço económico em que esses países se integram entrou numa espiral recessiva!

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Bem se queixava o nosso Primeiro-ministro de que a cimeira ficou aquém do que esperava.

Neste nevoeiro intenso será que há alguém, sem ser os mercados, que consiga convencer a Chanceler Merkel a alterar a rota de colisão do navio Almirante e a mandar calar o Imediato que, a tocar o sino na proa, ordena à Terra que se afaste?

Advogado

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