Ana Cristina Silva 03 de Agosto de 2014 às 19:20

Cessação de atividade em IVA

Quando uma determinada empresa deixa de exercer a sua atividade por um período bastante longo é frequente os seus responsáveis e o TOC equacionarem a cessação para efeitos de IVA.

 

Este procedimento é potenciado pela cessação da obrigação declarativa em IVA referente a cada período de imposto, mas sobretudo pela possibilidade de existindo inatividade e sendo entregue declaração de cessação em IVA beneficiam da dispensa do pagamento especial por conta (PEC).

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Porém, será sempre preciso ter algum cuidado quando se pretende dar cessação para efeitos de IVA. Não basta a mera inexistência de operações tributáveis (incluindo-se também as operações isentas sem direito à dedução) para que se possa fazer uma cessação ou que, ainda que reunidas as condições, o momento da sua realização seja o mais apropriado. E ainda que seja bastante apelativo não ter de realizar o PEC, uma cessação indevida, ou até demasiado apressada, pode também trazer custos imprevistos não descuráveis.

 

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O art. 34.º do Código do IVA define o conceito de cessação de atividade, que abrange essencialmente duas condições distintas: a transmissão de todo o património afeto a uma atividade produtiva e a inatividade por um período de dois anos consecutivos. Não obstante, o n.º 1 deste preceito enuncia quatro casos diferenciados de cessação, em função da diversidade de sujeitos passivos deste imposto e do modo como a "transmissão de todo o património" pode ocorrer.

 

Englobando o Código do IVA, sujeitos passivos singulares e coletivos, sujeitos passivos com personalidade jurídica e sem personalidade jurídica, obviamente as contingências da "transmissão de todo o património" serão distintas consoante o tipo de sujeito passivo envolvido. Acresce que, em sede de IVA, não são só as operações onerosas que entram no campo de sujeição deste imposto, o que permite alguns "malabarismos" com vista a preencher a verificação das condições de cessação, nomeadamente as afetações de bens.

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Passemos à análise da condição de cessação que é, mais vezes, alegada com pressupostos incorretos. O citado art. 34.º do Código do IVA permite a cessação de IVA quando "deixem de se praticar atos relacionados com atividades determinantes da tributação durante um período de dois anos consecutivos, caso em que se presumem transmitidos, nos termos da alínea f) do n.º 3 do artigo 3.º, os bens a essa data existentes no ativo da empresa".

 

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Um erro bastante frequente é desconsiderar-se a parte final deste preceito. Em termos muito simples significa que, se o sujeito passivo pretender cessar atividade por não ter praticado atos tributáveis (incluindo operações isentas) durante dois anos, por estar em rigorosa inatividade, se possuir património que esteja desonerado de IVA por se ter exercido o direito à dedução, então haverá que liquidar IVA sobre tal património existente. Pode então existir, em consequência da cessação, um valor de imposto a entregar ao Estado.

 

O facto de a Administração Tributária nem sempre detetar as situações em que era devido liquidação de IVA pelo património remanescente tem contribuído para perpetuar a convicção de que se pode usar de uma mera suspensão do registo em IVA sem consequências neste imposto e até com vantagem de dispensa do PEC.

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Ainda relacionado com esta obrigação de liquidação de IVA, outro aspeto que frequentemente se esquece é que as sociedades têm um quadro legal diferente da dos sujeitos passivos singulares. As sociedades comerciais e outros entes coletivos têm regras estritas para terminarem a sua existência jurídica e para transmitirem o seu património. Um empresário em nome individual ou um trabalhador independente pode simplesmente dar destino ao património afeto à atividade pela mera imputação à sua esfera pessoal. Num ente coletivo a situação que mais se aproxima desta imputação, mas que ainda assim é distinta, é a partilha dos bens pelos sócios findo o processo de liquidação, sendo que a regra é que os bens sejam vendidos a terceiros.

 

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Usar desta norma de cessação em sede de IVA, para uma mera suspensão de atividade, pode trazer consequências bastante desagradáveis, dependendo do valor do património remanescente. Num cenário em que se cesse a atividade com património, já vimos que, por essa cessação, há liquidação de IVA pelo valor tributável dos bens que estejam desonerados de IVA. Posteriormente retoma-se a atividade, entregando uma declaração de início/reinício. Mas quando se pretender, por exemplo, vender os bens que ficaram aquando da anterior cessação, constitui-se um facto tributável em IVA e não há nenhuma norma que isente a operação ou que permita a dedução do IVA liquidado aquando da cessação. Há uma dupla tributação neste imposto.

 

Ainda que o sujeito passivo não disponha de bens à data de cessação pode ter créditos a receber. Uma cessação em IVA prematura pode impossibilitá-lo de regularizar, a seu favor, o IVA dos créditos considerados incobráveis, nomeadamente em caso de insolvência declarada de devedores.

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E há ainda que equacionar que, por vezes, após a realização das operações pode verificar-se a necessidade de proceder a correções nos valores faturados que podem determinar regularizações do IVA: por descontos concedidos, por erros nas bases tributáveis, por incorreção na taxa de IVA aplicada, entre outras. E se tais regularizações determinarem um aumento do IVA suportado, a entidade estando cessada para efeitos deste imposto, pode ser chamada a arcar com esse encargo sem que tenha possibilidade da sua dedução.

 

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Conclui-se que, mesmo que se pretenda cessar uma atividade de uma dada empresa, além de atender aos aspetos jurídicos que possam reger essa cessação, nomeadamente no caso de sociedades comerciais, deve ponderar-se bem o momento em que se vai proceder à entrega de declaração de cessação de IVA. Caso exista património suscetível de venda a terceiros ou operações que podem vir a ser corrigidas ou ainda de créditos a cobrar pode ser conveniente aguardar pelo respetivo desfecho.

 

Consultora da OTOC

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Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.

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