OE 2026: Gestores públicos enfrentam novo corte real nos gastos que podem fazer
UTAO sinaliza a subida de apenas 1,75%, abaixo da inflação prevista, na atualização de contratos de serviços, e critica perda de margem de manobra nas entidades públicas. Restrições deverão “repercutir-se negativamente sobre a qualidade e quantidade dos serviços públicos prestados”, avisa, esperando que o tema seja discutido em fase de análise na especialidade do Orçamento.
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Os gestores públicos vão perder margem de manobra para contratar serviços no próximo ano, enfrentando um novo corte real nos gastos que podem fazer, alerta a Unidade Técnica e Apoio Orçamental (UTAO) ao Parlamento, num apelo a que os deputados discutam as restrições na fase de apreciação na especialidade da proposta de Orçamento do Estado para 2026 (OE 2026).
No relatório final de análise à proposta do Governo, já publicado, a entidade sinaliza que no próximo ano os encargos com serviços contratados pelas entidades públicas só poderão ser atualizados em 1,75%. O valor fica abaixo da inflação prevista no cenário macroeconómico que sustenta o Orçamento proposta, com o Ministério das Finanças a apontar para 2,1% de variação no índice harmonizado de preços no consumidor. Tal implicará um corte real nos gastos, que de resto prolonga perdas ao longo da última década na capacidade de contratação pública, alerta a UTAO, com fortes críticas à manutenção do mecanismo de contenção de despesa que se repete nas propostas de lei orçamental desde 2016.
“O facto de o acréscimo proposto para 2026 ser inferior à inflação prevista (em -0,35 pontos percentuais), representa uma diminuição da margem de manobra dos gestores públicos, agravando a perda real sofrida desde 2015”, afirma a UTAO.
A entidade lembra que “desde 2021 registou-se uma subida acentuada do nível geral de preços”. Contudo, os gastos permanecem ancorados ainda aos valores de 2015, tendo apenas sido atualizados em 2023 (2%), 2024 (2%) e 2025 (2,75%). Assim, refere, “as atualizações permitidas entre 2023 e 2025, a par dos aumentos nulos desde 2015, colocam as dotações assim ajustadas para 2026 em perda significativa a preços constantes, face às do ano 2015”, e a situação será agravada no próximo ano com a subida de encargos em apenas 1,75%.
Em causa, estão os chamados instrumentos não convencionais de controlo de despesa , que se somam a uma série de dotações de uso condicionado à aprovação pelo ministro das Finanças ou restantes ministros e na qual se incluíam até aqui as chamadas cativações. Estes instrumentos não convencionais traduzem-se em artigos da proposta de lei do OE, que impõem restrições à despesa com serviços e pessoal, ou ainda nos decretos-lei de execução orçamental publicados mais tarde pelo Governo.
Para 2026, o Governo propõe desde já um limite global de subida de encargos com serviços de 1,75%, sendo especificamente também neste valor para a atualização de cada contrato. Quanto a novos contratos, ficam sujeitos a aprovação do ministro setorial, com necessária compensação dos gastos. Dependem igualmente da tutela a contratação de estudos ou a contratação de serviços por tarefa ou em avença. Já os limites às contratações por institutos e empresas públicas serão fixados em decreto-lei de execução orçamental, com a UTAO a defender que “a substituição de trabalhadores nas empresas do sector público empresarial continua condicionada, impedindo a renovacção de trabalhadores por ativos com mais experiência”.
Muito crítica da manutenção destas restrições, a UTAO admite que estas “venham a repercutir-se negativamente sobre a qualidade (e quantidade) dos serviços públicos prestados” e assinala uma série de danos que estas provocam ao funcionarem como desincentivo à entrada de trabalhadores mais qualificados nas administrações públicas, absorverem recursos para lidar com carga administrativa, trazerem desgaste nas negociações entre dirigentes e ministros, desmotivarem e desresponsabilizarem gestores e porem ministros a fazer microgestão. Além disso, diz, “contribuem para a diminuição da transparência na execução do Orçamento do Estado e a incerteza sobre uma matéria nuclear na gestão de qualquer organização, que é saber até quanto dinheiro pode comprometer na sua atividade”.
“Esta é uma matéria que pode merecer análise e reflexão da Assembleia da República na fase de discussão na especialidade da proposta de OE 2026”, defende.
Além destes instrumentos de contenção de despesa, recorde-se, há ainda os instrumentos convencionais de controlo de despesa, com o ministro das Finanças a colocar para o próximo ano 3.887 milhões de euros de parte em reservas orçamentais e outras dotações de utilização condicionada.
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