Tribunal Constitucional dá machadada final no adicional sobre a banca
Os juízes do palácio Ratton decidiram declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, “das normas contidas nos artigos 1.º, n.º 2, 2.º e 3.º, alínea a), do Regime que cria o Adicional de Solidariedade sobre o Setor Bancário” (ASSB), criado em 2020 e que, até 2025, envolve uma receita na ordem dos 220 milhões de euros. Em causa, consideraram, está a “violação do princípio da proibição do arbítrio, enquanto exigência de igualdade tributária”, bem como “do princípio da capacidade contributiva”, ambos previstos na Constituição da República Portuguesa.
Esta decisão afasta definitivamente o adicional sobre a banca do ordenamento jurídico nacional e é uma vitória para o setor, que o vem contestando desde o início. Surge na sequência de vários acórdãos também do TC, que já tinha decidido pela inconstitucionalidade em outros tantos casos concretos.
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Isso, tal como o Negócios então noticiou, levou o Ministério Público a pedir ao Tribunal que declarasse a inconstitucionalidade com força obrigatória geral, ou seja, aplicável, em abstrato, a todos os contribuintes.
O ASSB, recorde-se, foi criado em 2020 juntamente com o pacote de medidas Covid – o Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) – e a sua receita anual (de 33,4 milhões de euros no primeiro ano e que o governo estimou, para 2025, em 40,8 milhões) foi destinada ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) para reforçar o financiamento do sistema e como forma de compensar a isenção do IVA aplicável ao setor bancário nos serviços financeiros. Entrou em vigor em julho, com o Orçamento suplementar então aprovado, e, à semelhança da contribuição sobre o setor bancário – que já existia desde 2011, e que aparentemente assumiria o papel de tributo principal face a este adicional – também incide sobre os passivos dos bancos e sobre o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço.
Foi polémico desde o início por ser aplicado apenas aos bancos, traduzindo-se num tratamento desigual dado ao setor financeiro.
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Na prática, o acórdão agora conhecido vem concluir que ““[…] a criação do ASSB como um imposto especial incidente sobre o setor bancário, como forma de compensar a isenção de IVA, configura-se como uma diferenciação arbitrária na medida em que o critério utilizado não apresenta um mínimo de coerência nem se encontra materialmente justificado”. Nesse sentido, estamos perante “a violação do princípio da proibição do arbítrio, enquanto exigência de igualdade tributária”.
Por outro lado, o ASSB incide sobre o passivo dos bancos, mas “o passivo apenas se converte em ativo por via do seu emprego na geração de benefícios futuros e estes dependem sempre de um conjunto de múltiplas e complexas variáveis, nem sempre de fácil antecipação”, refere o acórdão. “Ora, não podendo confundir-se manifestações de riqueza com meios disponíveis para financiar a produção dessa riqueza, percebe-se que o passivo, desligado do ativo, não constitua um indicador, sequer indireto, da capacidade contributiva dos sujeitos passivos de ASSB”, acrescenta, para concluir que “não se pode tributar uma capacidade contributiva futura e eventual, mas apenas a capacidade contributiva atual e efetiva”.
O acórdão, datado de 3 de junho e agora conhecido, teve dois votos de vencido.
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Os magistrados não delimitaram os efeitos da decisão, pelo que, na sequência dela, “quem tem processos nos tribunais poderá invocar o acórdão em seu favor”, resume Filipe Vasconcelos Fernandes, professor da Faculdade de Direito de Lisboa e um dos especialistas citados no acórdão do TC.
Até agora praticamente todos os bancos têm contestado o adicional sobre o setor bancário e não existiu nenhum caso em que perdessem em tribunal. A decisão do Constitucional tem efeitos para os quatro anos anteriores.
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