Desafio da IA é conciliar uso e desenvolvimento com impacto nos direitos fundamentais

Vice-presidente da Anacom diz que "temos quadros muito bem definidos em termos de regulação de direitos fundamentais, é preciso que o legislador deixe claro o que é que é vinculativo".
Anacom
Alexandre Azevedo
Lusa 10:07

A vice-presidente da Anacom afirma, em entrevista à Lusa, que o principal desafio da inteligência artificial (IA) é conciliar a utilização e desenvolvimento da tecnologia com o impacto que esta tem nos direitos fundamentais.

A IA "é algo do presente, já não é algo de filmes de ficção científica ou do futuro", começa por dizer Raquel Brízida Castro, vice-presidente da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) quando questionada sobre quais são os maiores desafios que a tecnologia traz agora.

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Para a responsável, "o principal desafio é conciliar efetivamente a utilização e o desenvolvimento dessa tecnologia, que é extraordinária, com o impacto que ela tem nos direitos fundamentais e no Estado de Direito democrático".

Aliás, é "uma necessidade de conciliação que resulta do regulamento de inteligência artificial da União Europeia [AI Act], essa deve ser a principal preocupação neste momento dos reguladores, que é fazer uma ponderação entre essas preocupações de desenvolvimento, de estimular o desenvolvimento e a inovação tecnológica, por um lado, e os direitos fundamentais", diz.

"Entre os vários tipos de direitos fundamentais que podem estar em causa -- (...) temos os direitos fundamentais dos utilizadores, (...) das empresas, porque também têm direitos fundamentais na medida da sua natureza jurídica -- (...) é preciso essa conciliação (...) para que o resultado seja uma utilização da inteligência artificial que não assuste ninguém", mas que "promova a utilização da inteligência artificial e permita que ela se desenvolva", sublinha.

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Instada a comentar se não considera que por vezes há uma perceção das pessoas, em geral, de que os seus direitos são 'engolidos' nesta aceleração tecnológica da IA generativa, Raquel Brízida Castro diz perceber isso porque se está a "viver um período transitório de definição de regras".

Nesta fase, "é extremamente importante que não haja uma ideia, primeiro, de uma regulação excessiva, que possa, de alguma forma, pôr em causa (...) o discurso de defesa dos direitos fundamentais, por um lado, e, por outro lado, evitar exatamente essa inovação tecnológica", defende.

"Temos quadros muito bem definidos em termos de regulação de direitos fundamentais, é preciso que o legislador deixe claro o que é que é vinculativo, ou seja, o que é que é proibido e aquilo que pode, eventualmente, ser acompanhado e objeto de controlo", sublinha.

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"Há uma ideia que eu acho que é muito importante, que é a inteligência artificial entra em colisão com os princípios fundamentais do Estado de Direito democrático e dos direitos fundamentais no preciso momento em que nós deixarmos de a entender", considera.

Uma ideia que, diz ser "inspiradora" na firma como se encara a inteligência artificial. Agora, - "esta lógica de explicabilidade que está, no fundo, na base de muitos dos direitos fundamentais, é muito difícil de concretizar", admite, acrescentando por isso que tem que ser trabalhada.

Aliás, "toda a regulação da inteligência artificial está em construção e temos que a construir conscientes de que existem essas duas faces da questão que têm de ser conciliadas e ponderadas e os reguladores aí vão ter um papel extremamente importante na forma como implementam e como aplicam essas regras na prática".

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Questionada se Portugal está preparado para as implementar, a vice-presidente assevera que sim.

"Portugal está, obviamente, preparado. Há já algum tempo que nós, na Anacom, estamos a monitorar e a assistir, no fundo, àquilo que a União Europeia está a fazer, porque é muito importante aqui, de facto, a regulação europeia, para evitar uma noção de fragmentação regulatória e de dispersão regulatória que existe neste momento", refere.

A Anacom está a acompanhar "toda uma produção de orientações, de 'guidelines' que está a ser feita pela Comissão Europeia" e "que vai ser muito importante para a implementação".

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As principais obrigações da regulação da IA, os sistemas de risco elevado, entram em vigor em 2026 e "este período até lá é extremamente importante para que a Anacom ajude o mercado a preparar-se", reforça, apontando que são necessárias orientações.

"Em toda a atuação do regulador, acho que há aqui uma coisa muito importante, o mercado precisa de clareza e precisa também de segurança jurídica. E, portanto, é preciso que fique muito claro o que é que é proibido e o que é que é permitido", conclui.

Na sexta-feira, na abertura da conferência da Anacom "Inteligência Artificial: Os Desafios da Inovação e da Regulação", em Lisboa, o secretário de Estado da Digitalização, Bernardo Correia, anunciou que o regulador das comunicações será a autoridade fiscalizadora e ponto focal de contacto na regulamentação da IA em Portugal.

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