Um cheque contra o xeque
É um cheque grande em troca de um choque maior. São 110 mil milhões de euros para a Grécia, que em troca vai atravessar uma recessão brutal mas compactada em dois anos. O que é que isto tem a ver com Portugal? Tudo.
Tudo começando pelo cheque. É um ror de dinheiro, o que sai de Portugal: dois mil milhões de euros. São seis meses de receitas de IRC. É um terço das receitas de privatizações previstas em todo o PEC. São 200 euros por cada português. 200 euros em impostos ou em dívida, que são mais ou menos a mesma coisa mas em alturas diferentes.
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A Grécia não é um BPN - mas quase só porque é um país. Este empréstimo será pago. Mesmo assim, é muito dinheiro para salvar os gregos. Mas é até pouco se quem estivermos a salvar formos nós próprios, os portugueses.
Se este plano de salvação da Grécia não acalmar os mercados, nada acalmará. Acalmando, os credores reabrirão os cofres aos Estado, banco e empresas portuguesas mas nunca aos preços de antigamente. Há coisas desta crise que vieram para ficar: a restrição financeira é uma delas.
É agora que o desendividamento da economia começa.
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Vamos continuar ligados ao monitor dos mercados nos próximos dias, olhando para os custos das obrigações, para a diferença entre o que paga Portugal e o que paga a Alemanha e para a evolução das empresas cotadas em Lisboa. Começando agora: o Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público vai hoje mesmo ao mercado pedir dinheiro. O preço a que o conseguir é determinante.
O número de zeros do cheque que será passado à Grécia é inédito, na União Europeia, no Fundo Monetário Internacional e na Alemanha. Mas é a Alemanha que, claramente, comanda esta música desde o princípio. Ajudou quando quis, como quis e com quem quis. Não é apenas a construção de um espaço económico que está em causa. É a união política que lhe subjaz.
O catálogo de medidas imposto à Grécia é devastador. Vá à página 36 desta edição e conte, de cima a baixo, com quantas letras se escreve a palavra "draconiano". É também esta lista que tem a ver com Portugal. Porque a salvação grega marcou um recorde e desenhou um "benchmark", um termo de comparação. É assim, nestas carnificinas, que os países credores salvam os países devedores. E não esqueçamos que podemos estar longe da Grécia, mas somos os segundos da lista a contar do fim.
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Portugal vai ter de tratar da economia, que não encontra maneira de crescer. Na última semana, quando tudo esteve em causa, houve um acordo político que começou como simulação e acabou em dissimulação. Nas medidas concretas, pouco mais houve que um anúncio ridículo de que uma estrada prevista será apenas meia e o propósito de reduzir o subsídio de desemprego.
É pouco para o que a economia precisa e é muito para os desempregados. A medida faz sentido económico, é uma necessidade orçamental mas é de uma insensibilidade social surpreendente: precisamente quando Portugal regista uma destruição de emprego em níveis recorde.
Se os mercados acalmarem, tudo parecerá ficar como dantes. Mas será mentira. E quanto mais tempo mentirmos, mais pagaremos no futuro. É essa a lição grega.
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psg@negocios.pt
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