Os bancos e a economia – (VI)
1. Nos artigos anteriores procurei colocar os nossos bancos no contexto do quadro – económico, institucional, regulamentar e tecnológico – que na Europa do euro está a induzir mudanças estruturais na organização e no funcionamento dos mercados bancários. Como referi, é contra este “pano de fundo” que deve ser avaliada a situação actual dos nossos bancos, assim como a organização e o funcionamento do mercado bancário.
No entanto, antes de prosseguir, considero de interesse ter presente que, dadas as funções críticas de intermediação financeira que exercem, os bancos constituem verdadeiros “centros de poder”, cuja acção tem importantes implicações sociais e políticas. Tal faz com que no contexto actual seja crucial manter sob controlo de capital interno instrumentos de intermediação financeira com capacidade para apoiar – técnica, operacional e financeiramente – as políticas públicas dirigidas ao crescimento e ao desenvolvimento económico e social. Questão a que, pela sua importância e actualidade, me proponho voltar.
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2. Tendo presente este contexto, a avaliação da situação actual dos nossos bancos deve ser conduzida numa dupla perspectiva: de um ponto de vista microeconómico, interessa analisar a forma como têm vindo a regenerar os seus balanços e a reconstituir as suas condições de exploração. Corresponde, no essencial, a analisar a evolução do negócio bancário desde o programa da troika e os reflexos deste sobre a robustez patrimonial, a solvabilidade e o nível de rentabilidade dos bancos; por outro lado, numa perspectiva macroeconómica, importa avaliar, quer o modo como os bancos têm vindo a intermediar entre o aforro e a procura de financiamento, quer como estão a canalizar os impulsos da política monetária – descidas das taxas de juro e injecções de liquidez nos mercados – e a transmiti-los aos seus destinatários finais: consumidores, produtores, investidores e aforradores. Corresponde, neste caso, a avaliar o modo como os bancos estão a apoiar a actividade económica – se estão a financiar de forma equilibrada o consumo, a produção, o investimento e a inovação, e a contribuir para a formação de níveis adequados de poupança.
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A nível micro, os nossos bancos têm procurado compensar o impacto negativo das baixas taxas de juro sobre as respectivas margens financeiras, transferindo os custos do ajustamento para os aforradores/depositantes. Forçaram uma descida rápida das taxas de remuneração dos depósitos, passando estas de níveis nominais elevados – dos mais elevados da Europa – para níveis reais negativos – em finais de 2019 situavam-se entre os mais baixos da Zona Euro. Ao mesmo tempo que lançaram um leque alargado de comissões, num movimento que ameaça prosseguir e transformar os bancos em plataformas de prestação de serviços. Se acrescentarmos a regeneração dos seus balanços através de “vendas forçadas”, tanto de activos como de “carteiras de crédito”, compreendemos a evolução recente dos nossos bancos. Em particular, o regresso rápido – nalguns casos surpreendente – a níveis pré-crise de resultados.
Trata-se, no entanto, de um ajustamento suportado por condições de mercado excepcionais e transitórias que tendem, temporariamente, a mascarar as linhas de força das transformações que estão a mudar estruturalmente o negócio bancário e a intermediação financeira em geral. Ao mesmo tempo que, como na década que antecedeu a crise, induzem novos desequilíbrios na economia – em particular, preferindo o crédito ao Estado e às famílias, em detrimento do financiamento do tecido produtivo. Comportamento que é induzido pela convergência de três tipos de factores: actual política monetária; regras prudenciais que favorecem o risco soberano; uma cultura comercial e de risco que tradicionalmente tende a financiar as PME com o recurso intensivo a instrumentos de crédito de curto prazo o que, em muitas empresas, contribui fortemente para a formação de estruturas financeiras frágeis e desequilibradas (a continuar).
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