Francisco Mendes da Silva 17 de Outubro de 2016 às 10:15

O Governo engana, o Orçamento não

O Orçamento do Estado é o principal instrumento político de um Governo. É ele que traduz, como nenhum outro documento, as orientações de quem dirige o país.

O Orçamento para 2017, o primeiro em velocidade de cruzeiro da solução governativa do PS, BE e PCP, é um testamento nítido do programa com que essa solução chegou ao poder.

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O Governo legitimou-se no Parlamento porque tinha uma alternativa clara: a aposta seria no crescimento económico gerado pela reversão da "austeridade", com a aceleração do investimento público e da devolução de rendimentos, potenciada por uma negociação "inteligente" com Bruxelas sobre as metas orçamentais e, eventualmente, por um alívio caridoso da dívida.

O Orçamento para 2017 atesta que pouco ou nada sobra dessa alternativa. Com o crescimento longe do prometido pelo Governo, o amor às metas orçamentais impostas do exterior é hoje um sentimento que une os três partidos da esquerda parlamentar - talvez por ser consumado de uma forma que lhes corre no sangue ideológico: criação de impostos, aumento de impostos já existentes e não extinção de impostos que se prometeu extinguir.

Ainda assim, ao mesmo tempo que jura fidelidade à política de restrição orçamental, o Governo continua a vender a ideia de que se assiste ao famoso "virar da página da austeridade". Como é que se articulam estas duas prioridades, aparentemente contraditórias? É fácil: à "austeridade" o Governo dedica as medidas do Orçamento; ao "virar da página da austeridade" dedica a propaganda sobre as medidas do Orçamento.

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Ainda assim, ao mesmo tempo que jura fidelidade à política de restrição orçamental, o Governo continua a vender a ideia de que se assiste ao famoso "virar da página da austeridade". Como é que se articulam estas duas prioridades, aparentemente contraditórias? É fácil: à "austeridade" o Governo dedica as medidas do Orçamento; ao "virar da página da austeridade" dedica a propaganda sobre as medidas do Orçamento.

Um exemplo? O novo imposto sobre o património imobiliário. Durante semanas, para obter o favor popular, os partidos da esquerda disseram-nos que se trataria de um imposto inspirado na "justiça fiscal", cirurgicamente dirigido a um pequeno conjunto de "muito ricos" (aqueles que, segundo chegou a dizer Mariana Mortágua, fogem ao IRS). Ora, vai-se a ver o Orçamento e o que temos é algo completamente distinto. O Governo criou um novo imposto que não só ataca muito mais famílias do que a propaganda anunciava como se aplica à generalidade das empresas. Trata-se, portanto, de um agravamento transversal e significativo das condições de exercício da actividade económica, um sinal dispensável num país que deveria antes estar a dar choques eléctricos ao investimento.

Outro exemplo é o da "eliminação da sobretaxa do IRS". Ao contrário do que diz a propaganda, ela não será eliminada, nem "gradualmente". O que há, apenas, é uma redução das taxas. Só as retenções na fonte é que serão eliminadas ao longo do ano. Mas as retenções são só uma antecipação do pagamento do IRS, por conta do imposto a liquidar no fim do ano. A sobretaxa continuará a ser aplicada a todos os rendimentos de 2017. Quem achar que a deixou de pagar a meio do ano, só porque esse "corte" desapareceu da folha de vencimento, terá uma surpresa desagradável. Mas só depois, claro, de votar nas autárquicas.

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