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Baptista Bastos - Cronista b.bastos@netcabo.pt
28 de Outubro de 2011 às 11:00

O País cercado e inerte

Vamos empobrecer para, depois, vivermos em prosperidade alegre e irreversível.

Vamos empobrecer para, depois, vivermos em prosperidade alegre e irreversível. A ideia, com mais ou menos ênfase, é de Pedro Passos Coelho, fazendo-se eco do breviário ultraliberal, já experimentado lá fora, com resultados catastróficos. Primeiramente, quase ficamos ao nível do esmoler, mão estendida e olhar baço; anos depois, o sol brilhará para todos nós – como na canção. Vivemos cansados de tanta aldrabice, de tanta dissimulação e de tanta esquiva à verdade. O nosso previsto empobrecimento vai adicionar-se ao empobrecimento passado e presente. O pior é que não será, apenas, económico. Já de si abalados, os laços sociais, o nosso comportamento moral, a cultura, o desenvolvimento intelectual serão completamente desbaratados. O empreendimento político que se avizinha, a crer no primeiro-ministro, é de molde a ficarmos aterrorizados.

Os dramáticos apelos dos sindicatos e as advertências de políticos e de alguns economistas (começam a adquirir um número significativo) aumentam de volume de cada vez que temos notícia de novas decisões do Governo. Dizem não haver alternativa. É mentira. Só não há alternativa se se continuar a seguir as regras de um capitalismo cada vez mais serôdio e, por isso mesmo, mais predador e desumano.

Esta fusão mítica de elementos contraditórios, porque é, simultaneamente, um apelo à miséria e à "modernidade", configura uma das mais monumentais fraudes políticas de que há memória. E os representantes desta tendência mais não são do que nacionalistas dissimulados. Começam todos de forma semelhante: populistas, proclamando a sua sede de justiça social; declarações sobre a necessidade de "mudança", acentuando que são elementos fundamentais da luta contra os "poderosos." Ao mesmo tempo, envolvem o "socialismo", ou a ideia "socialista" das piores execrações. Contam, para atingir os seus desígnios políticos, de jornalistas "comentadores", cronistas avulsos estipendiados e repetitivos nas suas preopinâncias. O comunismo, os comunistas são alvos preferenciais e, por tabela, os socialistas e os maçons estão-lhes na mira. O poema de Brecht reavivado. Propositadamente, misturam uns e outros. Mas são incapazes de dilucidar o porquê das coisas, e a natureza das ideologias que combatem. Queda-se, tudo, numa superficialidade ocultada pelas características de uma época em dissolução.

Talvez possuamos forças para este combate. A História repete-se sempre em farsa, disse Marx. Às vezes, porém, a farsa é trágica. Esta Europa do Partido Popular é um assustador albergue espanhol: cabe lá toda a escória política. E desconhece-se o que legitima a representação manifestada por Nicolas Sarkozy e Angela Merkel. Não foram eleitos, mas assumem-se como dirigentes da "União", recebendo, de bom grado, a vassalagem dos restantes chefes de Estado europeus. Chega a ser confrangedor, no caso português, as bajulices de Passos Coelho, como ultrajantes foram as submissões de José Sócrates, ambos reverentes antes a alemã e o francês. O pior de tudo é que Merkel e Sarkozy são cabeças de areia: não dispõem de capacidades políticas, intelectuais e culturais que justifiquem e expliquem estes preitos, dos quais as televisões dão amplas notícias.

A mediocridade actual é endémica. Não atinge, unicamente, a vida portuguesa. Espalhou-se, respaldada na ignorância, que é sempre atrevida e perigosa. Em campo aberto, os senhores da "nova" ideologia não encontram opositor. A Esquerda, dita democrática, é uma miséria de capitulação. A Esquerda comunista debate-se com extremas dificuldades em responder a estes desafios. Incapaz de se repensar e aos seus modelos, a Esquerda comunista ainda não removeu as esquírolas de um pensamento difícil de se restaurar.

A crise geral do capitalismo, simbolizando o que de pior e mais sórdido existe no sistema, não é analisada ou, quando o é, a análise é superficial e escassa. O que pode encorajar as tendências para o enfraquecimento e a resignação das populações é a resoluta contestação dos "indignados." É, ainda um movimento esparso e sem organização interna; nasce de sentimentos emocionais e de impulsos anarquizantes. Mas os sinais que reflecte parecem-me significativos. Nada do que é humano pode ser estranho aos que assistem a estes estereótipos, que, afinal, congregam milhões e milhões de pessoas, especialmente jovens.

O neoliberalismo não é suficientemente estudado. E alastra, com uma impunidade devastadora, devastando o que resta de identidade dos povos. Portugal não escapa à regra. A não ser...

b.bastos@netcabo.pt

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