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Baptista Bastos - Cronista b.bastos@netcabo.pt
14 de Outubro de 2011 às 11:52

O que está em extinção é insubstituível

Uma frase de António Barreto colocou parte do País em polvorosa. "Portugal como nação pode deixar de existir", disse ele.

Uma frase de António Barreto colocou parte do País em polvorosa. "Portugal como nação pode deixar de existir", disse ele. Como Estado, está a deixar: as grandes decisões são tomadas por outros; o nosso património está ao desbarato; não surge nenhum projecto de regeneração nacional; os nossos "intelectuais" nada dizem de importante; a indiferença acerca dos destinos colectivos é praticamente generalizada.

Barreto tem estudado estas questões e tentado problematizá-las. Mas, como as de alguns mais, as suas palavras caem em cesto roto. A transcendência, a ética e a moral são minudências destinadas a chatear - e mais nada. As preocupações do sociólogo apenas encontram eco em manchetes de jornais. Depois, esmaecem e tombam no esquecimento.

As pessoas estão mais preocupadas com o pão nosso de cada dia do que com razões, acaso abstractas, de patriotismo. Vêem grandes "patriotas" entrarem em negócios de bancos, para proveito próprio e do estrangeiro; grandes fortunas acumuladas com dúbia honradez; e aquilo que foi edificado com o sacrifício de gerações ser depredado ou entregue aos grandes interesses económicos.

Ninguém de boa-fé e recta consciência acredita nas palavras dos ministros. Dizem uma coisa, emendam-na para pior, e fazem outra. Pedro Passos Coelho chamou "mentiroso", por diversas vezes, a José Sócrates. Segue-lhe a peugada. Em três meses de governação já alterou o que anteriormente afirmara, pelo menos quinze vezes. Por outro lado, há ausência de valores e de padrões em muitos ministros e entre aqueles que, encarniçadamente, proclamam que temos de nos sacrificar. Corre pela Internet uma informação sobre os vencimentos de alguns daqueles que falam nos tais sacrifícios. Percebe-se que esses sacrifícios, para esses senhoritos, têm característica unilateral.

O conhecimento daquilo que desejam ocultar alastra, por intermédio dos blogues e das correntes sociais. Paulo Macedo, com uma desfaçatez insustentável, diz que quer salvar o Serviço Nacional de Saúde. Como? A adivinhar pelo que subjaz ao discurso, a sua credibilidade parece cada vez mais suspeita. O "é fartar, vilanagem" torna-se endémico. Aquilo que formou gerações de gente honrada está a ser liquefeito. Ninguém acredita em ninguém porque os exemplos negativos vêm do alto. A ética republicana tem sido tripudiada. Juntamente com a insensibilidade social e democrática. As provas estão aí. E podem os "anónimos" bolçar as suas infâmias que não modificam a realidade dos factos. Tenho insistido nestas temáticas porque sei que elas atingem os objectivos. Se a pátria corre sérios riscos, os perigos que nos ameaçam, como seres humanos, possuem o mesmo talhe e consistência.

Nos "negócios", a perspectiva não se modifica. Num belo tratado, editado, há anos, pelo Instituto Piaget, "Que Ética e Economia Mundiais", o prof. Serge Latouche escreve: "A corrupção da moral e a trapaça estão presentes no mundo dos negócios (...). Os súbditos imitam os senhores; a fraude fiscal torna-se um desporto nacional por toda a parte. As deontologias profissionais são espécies em vias de extinção." A ilustração do que diz Latouche é-nos revelada todos os dias. E só aparece nos "media" pelos aspectos mais superficiais. A confusão organizada pela cupidez e pelo desprezo do humano instalou-se. E o que está em extinção é absolutamente insubstituível.

Apostila - José Correia Tavares alia a discrição e a modéstia a um talento já raro. A sua poesia participa do satírico e de uma particular ternura magoada. É extremamente saudável, até pelo recorte clássico do que escreve, ler este poeta singular e profundamente original. Correia Tavares retrata-nos para retratar o País; e se, por vezes, parece corrosivo, "é, apenas, por muito gostar." Tenho nas mãos o último livro de quadras do poeta, "Os Sinais da Viagem", com um lúcido prefácio de José Manuel Mendes. Vale a pena entrar na sua leitura: saímos dela mais justos. Podem crer.

b.bastos@netcabo.pt

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