Tiago Freire tiagofreire@negocios.pt 05 de Janeiro de 2017 às 00:01

A melhor e a pior escolha para a CGD

António Domingues teve um final de ano atribulado, sem saber se ia já à sua vida ou ficava mais uns dias, mas ontem foi verdadeiramente a despedida do banqueiro da Caixa Geral de Depósitos.

Despediu-se no Parlamento e, diga-se, esteve disponível para, com paciência, responder a todas as questões dos deputados. Conseguiu, ainda, resistir à tentação de personalizar as questões e desdramatizou o comportamento de Mário Centeno e de António Costa. Quem esperava uma lavagem de roupa suja em público ficou desiludido, e ainda bem. Depois de todo o lamentável processo, era mesmo só o que faltava.

A audição serviu, mais do que para dar grandes novidades, para reconstituir os meses passados por Domingues à frente da Caixa. E tornou clara como água a razão pela qual o histórico número dois do BPI era ao mesmo tempo a melhor e a pior escolha para liderar o banco público.

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Seria a melhor escolha na óptica de mercado que guiou tanto a sua estratégia para a Caixa como a sua intervenção de ontem. Se o objectivo é reestruturar o banco, limpá-lo, torná-lo rentável, encolhê-lo e fazer dele competitivo, por si, Domingues seria o homem certo. Vem daí a questão do gestor público, da remuneração, da despolitização da gestão, da filosofia-base que convenceu Bruxelas de que este era um investimento de mercado feito pelo Estado, ou seja, que não estávamos perante uma ajuda de Estado que distorcesse a concorrência.

Mas tornou também clara a razão pela qual seria a pior escolha possível, porque parece esquecer-se de um ponto que não é de somenos e que traz muita bagagem associada: a Caixa é e continuará a ser um banco público. Que obedece às regras bancárias mas que é também um instrumento do Estado para arbitrar o mercado, que tem uma responsabilidade social (para com os seus trabalhadores mas não só) diferente da dos bancos privados, que, no fundo, não pode funcionar como um banco privado cujo capital é detido por todos os portugueses. Se a ideia é essa, não precisamos de um banco

público para nada.

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António Domingues tornou claro qual era a sua via, quais eram as suas condições, e criou toda uma filosofia "de mercado" que terá sido decisiva para a célere e de alguma forma surpreendente luz verde das entidades europeias. Costa assinou por baixo porque queria o problema resolvido. Depois veio a geringonça, a política, a exposição mediática, o Constitucional, o lado público do banco público. Com o qual Domingues nunca quis lidar e que Costa quis fingir que iria controlar.

O problema é que há uma contradição absoluta e insanável entre a Caixa de mercado de Domingues e o papel que o banco deve ter e que o próprio Governo defende para a instituição.

No meio do rebuliço, António Domingues foi o elo mais fraco e saiu, ainda que pelo seu próprio pé.

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Mas o seu plano está lá, o que deixa lá a contradição.

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