Cancun arrisca-se a ser apenas Cancun
Faltam dois dias para o início do COP16. Depois da euforia vivida na Cimeira de Copenhaga, as Nações Unidas adoptaram, este ano, um tom mais pragmático. No centro do debate volta a estar o financiamento aos países mais pobres.
A capital dinamarquesa dá este ano lugar a Cancun, no México, onde dentro de dois dias tem início uma nova ronda de negociações organizada pelas Nações Unidas, o COP16. Mas Cancun arrisca-se a ser apenas Cancun. O que falta em esperança sobra, este ano, em pessimismo e poucos são os que acreditam que é possível alcançar o tão desejado acordo vinculativo que substitua o "velho" Protocolo de Quioto.
No centro de debate e dos desentendimentos, está mais uma vez a questão do financiamento aos países em desenvolvimento. Se, por um lado, todos concordam que é preciso ajudar os países mais pobres (e que não contribuíram para a actual situação ambiental) a adaptarem-se e a mitigarem os efeitos das alterações climáticas, por outro, não há entendimento sobre quem paga e quanto paga.
O fundo proposto na Cimeira de Copenhaga para o período de 2010 a 2012, no valor de 30 mil milhões de dólares, precisa de "mais dinheiro". Dinheiro que pode ser a "chave de ouro" para desbloquear as negociações e alcançar um acordo, defendeu a nova representante das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, Christiana Figueres, que no início deste ano substituiu Yvo de Boer. O problema é que o Acordo de Copenhaga não definiu que países é que devem contribuir para este fundo.
E é aqui que reside um dos grandes problemas das negociações e que opõe Estados Unidos e China - os dois maiores poluidores do mundo e os únicos capazes de abrir caminho a um acordo vinculativo. Washington confirmou em Copenhaga que vai contribuir para o fundo de curto prazo de 30 mil milhões de dólares, mas recusa que a China seja um dos beneficiários. Já a China admitiu a possibilidade de definir metas de redução de emissões de CO2, desde que estas não representem um custo adicional para o país e não sejam legalmente impostas por um acordo internacional. Também neste ponto, os dois países entram em rota de colisão, já que os Estados Unidos não estão disponíveis para assinar um documento que não inclua metas de redução para os países em desenvolvimento (tal como está previsto no Protocolo de Quioto).
O braço-de-ferro entre os dois países está longe de ter uma solução e muito dificilmente será resolvido nesta cimeira. As Nações Unidas optaram, assim, por adoptar uma postura mais pragmática, que não descredibilize o processo de negociações e que não coloque em causa o que já foi alcançado até aqui. "Enquanto as expectativas para Copenhaga eram enormes, actualmente estamos num ponto diferente. A ordem do dia é pragmatismo e devemos realizar progressos onde podemos e nos temas que podemos", afirmou Robert Orr, director de planeamento político das Nações Unidas. Orr acredita que a cimeira vai produzir progressos "significativos" na área da protecção florestal, na ajuda aos países em desenvolvimento e na partilha de tecnologia.
Pode parecer pouco, mas se a 10 de Dezembro, dia final do encontro, tiverem sido alcançados entendimentos nestas três áreas, então podemos afirmar que a Cimeira de Cancun foi bem sucedida. Sem previsões catastróficas ou expectativas desmesuradas, o pragmatismo e o bom senso podem colocar as negociações sobre as alterações climáticas de novo no rumo certo.
"Felizmente, parece haver um número crescente de importantes cientistas, economistas e políticos com uma visão mais sensata sobre este tema [alterações climáticas]. (...) É demasiado cedo para afirmar que os políticos estão prontos para implementar medidas eficazes. Mas, dada a falta de bom senso que tem havido nos últimos anos, o simples facto de hoje ser possível ouvir mais vozes sensatas é um verdadeiro milagre", escreve o Bjorn Lomborg, director do Centro de Consenso de Copenhaga, num recente artigo de opinião intitulado "O regresso à razão".
Afinal, parece que a esperança não terminou em "Hopenhaga". Cancun é mais um passo no longo caminho que o mundo terá que percorrer para salvar o meio ambiente.
Mais lidas