Inquilinos que vivam em prédios muito degradados estão em risco de despejo
Contratos das rendas antigas podem ser todos denunciados no prazo máximo de cinco anos.
O novo regime jurídico de arrendamento urbano que o Governo aprovou ontem vem virar do avesso as regras existentes nas suas mais variadas vertentes. Além do aumento generalizado das rendas anteriores a 1990, o novo regime abre a porta à denúncia em massa dos contratos de arrendamentos de todas as épocas, criando condições para uma revolução no mercado de arrendamento.
Uma das novidades com maior alcance diz respeito à possibilidade de os senhorios desalojarem os seus inquilinos sempre que invoquem a necessidade de realizar obras profundas ou de demolição do imóvel. A intenção era conhecida, mas só ontem se souberam os detalhes. Segundo o Ministério do Ambiente, para desalojar o inquilino basta ao senhorio fazer uma "mera comunicação" e pagar uma indemnização correspondente a seis meses de renda.
Para um inquilino, por exemplo, que pague uma renda de 60 euros – é esse o caso de 56% dos arrendatários em Lisboa – este terá de deixar a sua casa em troca de uma indemnização de 300 euros. E sem direito a alojamento.
Se o inquilino tiver mais de 65 anos ou possuir um grau de deficiência superior a 60%, o senhorio é obrigado a realojá-lo "no mesmo concelho em condições análogas". Ou seja, o proprietário pode obrigar um inquilino seu que viva no bairro de Alfama para o colocar num prédio nos Olivais.
Uma revolução nas grandes cidades
Até agora, as regras para desalojamento definitivo com motivo de realização de obras eram muito mais apertadas. Primeiro a denúncia tinha de ser feita em acção judicial e o inquilino tinha direito a receber uma indemnização por "danos suportados" que no mínimo seria de dois anos (agora passa a ser de seis meses). Além disso, o proprietário era sempre obrigado a realojar o inquilino independentemente da sua idade ou condição.
O Governo opera, assim, uma autêntica revolução nas regras actuais que, a ser aplicada desta forma, deverá resultar numa grande alteração do tecido social e etário das principais cidades portuguesas. O objectivo do Governo é avançar, finalmente, com a tão desejada reabilitação urbana. As novas regras criarão oportunidades de negócios que deverão aliciar os proprietários e empresas imobiliárias a investir na reabilitação e no arrendamento.
Ordem para negociar à força
O novo mecanismo de actualização das rendas antigas – que são vitalícias e que estão muito desactualizadas devido a anos de congelamento – assenta numa lógica negocial, que já fora proposta pelo Governo de Santana Lopes. Em vez da actualização baseada na avaliação administrativa dos imóveis, prevista na lei em vigor e que poucos resultados teve (só três mil rendas actualizadas), o Governo passa todo o poder para a negociação entre senhorio e inquilino.
Ao contrário do que acontecia até agora em que os contratos vinculísticos (uma espécie de rendas vitalícias) nunca podiam ser denunciados, agora estes contratos podem ser rasgados. Quando o inquilino não tenha carência económica ou idade superior a 65 anos (ou deficiência), a denúncia pode ser imediata, no próximo ano; Se for pobre, a renda não pode subir além de um certo nível, mas apenas durante os cinco anos, altura em que o contrato pode ser denunciado, ficando o Estado responsável pela sorte do inquilino; se tiver mais de 65 anos, não pode ser despejado só porque não chegou a acordo com o senhorio. Nesse caso, a renda anual aumenta para um quinze avos do futuro valor matricial da casa. E se o arrendatário não conseguir pagar esse valor? Nesse caso, terá de sair, mas essa será sempre uma decisão sua, ainda que condicionada.
Mais lidas