Guia para escolher um curso superior
Seguir a vocação ou ser pragmático e olhar para as estatísticas do desemprego? Os conselhos de reitores, consultores de RH e da secretária de Estado, a quatro dias do início da primeira fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior.
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Imaginemos "um aluno com excelentes médias que é empurrado à força pela família para entrar em Medicina. Se entrar, será um erro crasso, vai ser um médico infeliz, uma pessoa infeliz", vaticina o reitor da Universidade do Porto (UP), Feyo de Azevedo. Bom, a menos que esse aluno vire as costas à Medicina e ao pleno emprego. Francisco Sanchez, manager na Ray Human Capital, líder na área de consultoria de recursos humanos, lembra-se bem de um caso assim: "Foi uma candidata que coloquei, em tempos, num cliente, que se licenciou em Medicina pela pressão exercida pelos pais." Ora, terminado o curso, mas infeliz, disse-lhes que ia tirar um mestrado em Gestão porque achava que se identificava mais. E "tem apresentado resultados acima da média na função que exerce na área de gestão".
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"É importante que os pais sensibilizem os filhos, procurando orientá-los para aquilo que parece ser o mais razoável e equilibrado, mas sem nunca forçar a iniciar uma formação académica com a qual não se identificam, nem têm qualquer vocação, independentemente das saídas profissionais que tenha", concluí Francisco Sanchez.
Homem da engenharia, pai de engenheira ("mas porque ela quis", note-se), o reitor da UP - uma das instituições de ensino superior mais procuradas e com a mais alta taxa de preenchimento de vagas -, alinha nessa ideia: "As pessoas têm obrigação de ser úteis à sociedade, mas também têm o direito de ser felizes." Mas considerar na escolha, por exemplo, os números do desemprego é "avisado".
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As estatísticas do desemprego de recém-licenciados dizem que Serviço Social, Arquitectura, Ciências da Comunicação, Psicologia, Arte e Multimédia são áreas em que há maior número de recém-diplomados a bater à porta do Instituto de Emprego - com taxas de desemprego para lá dos 12%. Acima dos 10% encontram-se outras como Sociologia, Design, Reabilitação Psicomotora, Marketing, Arqueologia, Geografia e Planeamento, Artes Plásticas, História, Antropologia, Turismo e Direito. Mas, um bom curso pode garantir que os seus licenciados tenham empregabilidade mesmo em áreas sem grande cotação nessa matéria.
Para o reitor da UP resulta claro o que deve influenciar, de forma crítica, a escolha de pais e filhos: "A qualidade intrínseca do curso, a sua reputação e a da universidade, muito mais do que estatísticas da empregabilidade."
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Eduardo Pereira, vice-reitor da Universidade de Lisboa (a universidade com mais estudantes do país) chama a atenção para um hiato temporal: "A escolha da formação universitária é uma opção que, regra geral, só tem repercussões alguns anos após o momento em que é tomada." Ora, "em três anos, o comportamento do mercado pode alterar-se muito, por vezes, de forma imprevisível". Recorde-se a contracção no sector da construção e obras públicas, e que teve enorme impacto para os licenciados em Arquitectura e Engenharia Civil.
Escolher universidades que antecipem tendências no trabalho
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Mas se há sempre imponderáveis na vida das sociedades não é impossível às universidades "fazerem uma leitura evolutiva dos dados do mercado de trabalho". A reitora da UCP, Maria da Glória Garcia, acredita piamente nisto. E "se há 20 anos nenhuma universidade falava em empregabilidade, hoje antecipar as necessidades da sociedade dentro de cinco ou seis anos é mais uma missão que as universidades têm de assumir". Exemplifica com Ciências Biomédicas: "É um curso em que temos baixa empregabilidade - o país ainda não absorve estes especialistas - mas temos a certeza de que é uma aposta para o futuro." Habituada a gerir a maior universidade privada do país, a reitora desaconselha escolhas que "absolutizem os dados do mercado". O pragmatismo deve existir, sim, mas na escolha de uma universidade "capaz de dar formação pluridisciplinar e internacional" que facilite a inserção no mercado de trabalho, mercado tendencialmente volátil e mais segmentado por competências do que por geografias.
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"No mundo de hoje o mercado de trabalho para os jovens qualificados é muito mais do que Portugal ou a Europa", sublinha o vice-reitor da UL. E esta abertura de espírito também se cria nas universidades, dizem. Feyo de Azevedo recentemente matou saudades num jantar com ex-alunos. Reuniram-se em Genebra, vindos de alguns cantos da Europa. Trabalhar lá fora para os universitários "não é drama nenhum", apesar de essa ideia ser "escandalosamente promovida pelos políticos da oposição (seja ela qual for)", critica. No que não há oposição absolutamente nenhuma é na defesa de que "a ideia de que ser licenciado não tem retorno é um erro".
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AS LICENCIATURAS COM MAIS TRABALHO E MELHOR SALÁRIO
Há áreas de estudo em que os alunos nem terminaram a licenciatura e já foram recrutados. São também as que garantem melhor remuneração logo em início de carreira. Depois há outras que, longe de viverem esta realidade, são "essenciais" na formação humana.
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Eram 250 e começaram a trabalhar no ano passado. Logo no primeiro mês de labor foram-lhe creditados na conta mais de mil euros - primeiro ordenado dos recém-licenciados de Engenharia Informática, de Telecomunicações e Redes e de Gestão, contratados pela Reditus, um dos maiores "players" na área das tecnologias de informação. Ainda eles aqueciam os bancos da faculdade já Fátima Branco os tinha debaixo de olho: "O processo começa logo quando os alunos se encontram no último ano do curso", conta a directora de RH.
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Os alunos entram nas academias de formação da Reditus para os testar e preparar para as futuras funções. Passado o filtro da prática, e terminado o curso, assina-se contrato. Vão buscá-los directamente às fontes: "Temos protocolos e acordos de colaboração com a Nova (School of Business Economics e FCT), ISEL, ISCTE, Técnico, FEUP, UBI e Politécnicos, como o de Setúbal."
"Ao contrário de um vastíssimo número de cursos que se mantêm sem que haja possibilidade de os licenciados serem absorvidos pelo mercado nacional, nas TI e Ciências da Computação, há falta de recursos para absorver as necessidades do mercado e Portugal está tão bem cotado que estes alunos são procurados pelas principais empresas, nacionais e internacionais", conta o manager da Ray Human Capital, Francisco Sanchez.
Há outros cursos com mais saída: engenharias de banda larga como "Gestão Industrial, Mecânica, Electrotécnica e de Computadores, bem como Economia, Gestão, Gestão de Marketing - com especialização em Marketing Digital e Redes sociais -, Matemática Aplicada e Computação", elenca Francisco Sanchez, com base no que as empresas lhe pedem. Formações que, com Medicina (com 0% de taxa de desemprego), são também aquelas em que as remunerações num primeiro emprego são mais atractivas.
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Segundo uma análise realizada para o Negócios pela consultora Korn Ferry Hay Group, Medicina, Economia e Gestão bem como Sistemas de Informação estão no top das licenciaturas que garantiram no ano passado, no mercado português, retribuições-base mais elevadas aos seus recém-diplomados.
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A UNIVERSIDADE CERTA PARA CADA CURSO
As notas dos exames de acesso ao ensino superior foram conhecidas a semana passada. No dia 20 de Julho arrancam as candidaturas. Saiba quais os cursos, por área de formação, que dão maior garantia de emprego.
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A vocação é determinante, mas a empregabilidade não pode ser descurada. E dentro de cada área de formação há cursos que dão mais garantias. O Negócios consultou os dados do portal Infocursos, relativos aos recém-diplomados inscritos como desempregados no Instituto de Emprego e Formação Profissional e indica-lhe as universidades, por área de formação, onde a "taxa de desemprego" é menor e maior. Os dados são referentes a 2015 e dizem respeito a instituições de ensino superior públicas.
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