Memórias: Durão Barroso "fez tudo" para que Santana Lopes fosse seu sucessor
Se o tempo voltasse atrás e Jorge Sampaio se visse, de novo, a ter de decidir o que fazer com um primeiro-ministro (Durão Barroso) demissionário e um amigo (Ferro Rodrigues) a clamar por eleições antecipadas, o ex-presidente da República teria feito tudo igual. Teria dado posse a Pedro Santana Lopes, apesar de todos os avisos sobre a sua personalidade, e, meses mais tarde tê-lo-ia demitido na mesma, abrindo espaço à maioria absoluta de José Sócrates. A decisão "difícil e solitária" fê-lo sofrer mas era a única possível, até pela forma como Durão Barroso geriu a sua saída: "Estou convencidíssimo que ele tinha um compromisso com Santana e que estava tudo combinado entre eles – pelo menos tudo fez para que ele fosse o seu sucessor", conta Sampaio no segundo volume da sua biografia política, que foi parcialmente resumida pelo jornal Expresso.
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Segundo o relato do semanário, Jorge Sampaio conta que Durão Barroso só aceitaria ir para a Comissão Europeia se não houvesse eleições antecipadas. Sampaio, à altura no seu segundo mandato, que durou entre 2001 e 2006, tenta persuadir Manuela Ferreira Leite e Marcelo Rebelo de Sousa para o cargo, mas "ninguém quis e fiquei com a criança nos braços e num beco sem saída, porque o dr. Barroso ia fazendo várias ameaças: que fazia disto uma crise, que ficava cá e ia disputar as eleições, etc".
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O ex-Presidente da República diz-se convencidíssimo de que Barroso "tinha um compromisso com Santana e que estava tudo combinado entre eles – pelo menos tudo fez para que ele fosse o seu sucessor." Apesar da pressão do PS, e apesar da posição maioritária dos seus conselheiros, Jorge Sampaio tomou a decisão de empossar Santana Lopes, porque, naquela altura, PSD e CDS tinham "todas as condições políticas e constitucionais para continuar a governar de forma estável em termos parlamentares". É isto que "muitas pessoas não quiseram perceber e continuam a não perceber" e é por isso que Sampaio "hoje voltaria a fazer o mesmo", segundo citações do Expresso.
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De pé atrás em relação ao primeiro-ministro, Sampaio segue de perto a acção governativa desde a primeira hora. Condiciona a formação do Governo (o Expresso recorda que ele vetou nomes como Paulo Portas, Fernando Negrão e José Luis Arnaut para o Executivo), cancela férias e vê os acontecimentos a precipitarem-se muito rapidamente até "descambarem na confusão".
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"Irresponsável", "instável", "errático" e "imoral": retratos de Santana
O rol de episódios é longo, e, por essa altura, já a sua Casa Civil insistia na necessidade de afastar Santana Lopes do cargo, com adjectivos fortes que dão conta do desnorte que se tinha instalado no Governo.
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Para Carlos Gaspar, "[Santana] é muito irresponsável e instável". Segundo Salgado de Matos, o então primeiro-ministro "ou ensandeceu ou quer eleições antecipadas". João Bonifácio Serra dizia que "O principal problema é a sua personalidade e desequilíbrio". O General Faria Leal dizia-o "propenso a acidentes" e que o Governo "está sempre metido em complicações". Já Nuno Brederode Santos considerava Santana "errático, irresponsável e imoral com zero sentido de Estado".
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Jorge Sampaio conta que ainda hesita, ouve posições de empresários e de Vítor Constâncio (à data governador do Banco de Portugal) e "decidi rapidamente. Isto não ia a parte nenhuma. Era preciso uma nova legitimidade democrática. Era preciso uma ruptura. A maioria estava a desfazer-se e já era altamente discutível que tivesse legitimidade política. Tomei a decisão praticamente de um dia para o outro, mas já a vinha a congeminar há uns tempos".
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Ao convocar eleições antecipadas Sampaio tinha a noção de que corria riscos: "Se o povo se pronunciasse contrariamente ao que eu supunha, paciência! Mas ficaria sempre muito diminuído e enfraquecido nas minhas capacidades e poderes", conta no livro, da autoria do jornalista José Pedro Castanheira. Mas o povo daria maioria absoluta a José Sócrates.
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