Ordem dos Engenheiros: Montijo é "aposta morta". Beja pode servir a médio prazo

Bastonário da Ordem dos Engenheiros, Fernando Almeida Santos, separa as águas em relação à necessidade de Alcochete precisar da terceira travessia sobre o Tejo, apontando que "é uma circunstância é absolutamente independente de um novo aeroporto", embora "obviamente" o vá favorecer.
Ordem dos engenheiros
Ricardo Jr
Diana do Mar 06 de Dezembro de 2023 às 14:45

O bastonário da Ordem dos Engenheiros, Fernando de Almeida Santos, defende que, no médio prazo, enquanto o novo aeroporto de Lisboa não ganha forma, além da "necessária" ampliação urgente da Portela, o aeroporto de Beja pode ser usado de "forma circunstancial" para responder a picos, como verão, dando o Montijo como uma "aposta morta".

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"Penso que o curto prazo exige imediatamente obras no Aeroporto Humberto Delgado para explorar até o limite dos 48 movimentos por hora, ainda que com dificuldade. Mas, mesmo assim, isso não chega, pelo que em alturas de pico, como no verão, se tivermos de recorrer a outra infraestrutura aeroportuária de forma circunstancial e não continuada então que se utilize Beja. Muito sinceramente o Montijo é uma aposta morta", sustenta, em declarações ao Negócios.

O Montijo como opção estratégica foi considerado inviável pela Comissão Técnica Independente (CTI) que concluiu que Alcochete é a melhor localização para receber a nova infraestrutura e recomenda que a Portela se mantenha até o novo aeroporto ter duas pistas a funcionar, mas foi apontada, designadamente pelo presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), Francisco Calheiros, como uma solução a médio prazo, por ser "a mais barata, mais rápida" e a única com uma declaração de impacto ambiental e que está já negociada com a concessionária.

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No entanto, na perspetiva do bastonário da Ordem dos Engenheiros, "não faz sentido absolutamente nenhum". "O Montijo não serve qualquer necessidade neste momento para Portugal", além de que "também ter-se-ia que fazer obras, porque nem a pista comporta aviões de médio porte e, portanto, é uma falsa questão", argumenta. E, mesmo em termos temporais, reforça, compensa esperar, neste caso por Alcochete se for essa a decisão do Governo: "O Montijo também demoraria quatro anos, pelo que se Alcochete demorar seis na primeira fase não vale a pena o investimento. O Montijo é uma aposta morta".

Terceira travessia sobre o Tejo é "absolutamente independente" de novo aeroporto

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Relativamente às ligações que a nova infraestrutura aeroportuária vai exigir Fernando Almeida Santos sustenta que "qualquer que fosse a solução aeroportuária teríamos sempre de ter acessibilidades".

"Não me venham dizer, por exemplo, que Santarém, pelo facto de ter a A1 que entra pelo lado norte de Lisboa, não teria que ser reforçada em termos de acessibilidades, porque isso é falso. Sou um habitante do norte do país e sei bem as dificuldades que tenho para entrar em Lisboa, na A1, em qualquer hora do dia, durante a semana, e portanto, com uma infraestrutura aeroportuária a norte, aceder diretamente a Lisboa, teria que ter também acessibilidades novas a Lisboa, e portanto, sob esse ponto de vista, qualquer infraestrutura aeroportuária que fosse decidida, impunha e obrigava a novas acessibilidades".

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Contudo, se a solução seguida for a de Alcochete, coloca-se a questão da terceira travessia sobre o Tejo, mas o bastonário da Ordem dos Engenheiros separa as águas. "Embora obrigatoriamente e obviamente vá favorecer o novo aeroporto essa circunstância é absolutamente independente de um novo aeroporto".

"Vamos imaginar que o aeroporto era na margem norte. A linha de alta velocidade ferroviária Lisboa-Madrid tem de passar numa travessia do Tejo. A terceira travessia, fazendo-se ou não o aeroporto, impunha-se de qualquer maneira, porque praticamente as únicas capitais europeias que, num espaço de dez anos, não vão estar ligadas por alta velocidade ferroviária se não se fizer nada são Lisboa e Madrid", enfatiza.

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Os custos das ligações também não são foco de preocupação: "Temos o Portugal 2030, que assegura uma parte percentual, com alguma dimensão, daquilo que é a ferrovia de alta velocidade e velocidade alta. Portanto, nós temos comparticipação, temos investimento português de facto assumido e é para fazer. Sobra um investimento chamado aeroporto, que foi decidido pela Comissão Técnica Independente propor ao Governo a solução de Alcochete, e se for essa solução, praticamente só estamos a falar de infraestrutura aeroportuária e de algumas ligações complementares, ainda que necessárias, de acessibilidades ao novo aeroporto".

Além disso, reforça, "um aeroporto, numa estrutura em 'hub', paga-se a si próprio. Pode não se pagar em cinco anos, provavelmente uma infraestrutura maior pagar-se-á em dez, mas a verdade é que, em vez de ter a possibilidade de a Portela chegar em esforço até 30 milhões de pessoas por ano, consegue comportar o dobro".

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"E também não é menos verdade que nós, atualmente, em 2023, já estamos a perder, pelo menos no período de verão, cerca de 100 movimentos dia por falta de capacidade da Portela, pelo que estamos a prejudicar o país em termos competitivos, por não termos a capacidade de absorção e de atratividade económica turística e corporativa, daí que também é urgente fazer imediatamente obras na Portela, para pelo menos aumentar um pouco mais a capacidade de estacionamento e de parque, porque em termos de movimentos de hora é mais complicado. Não temos grande margem de manobra naquele aeroporto". frisa.

Engenheiros portugueses à altura da empreitada

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A Ordem dos Engenheiros tem-se mostrado favorável a uma solução não dual, de "raiz", revendo-se na apontada, aliás, pela CTI que calcula que Alcochete pode substituir integralmente a Portela em oito anos. Mas, mais do que o "ranking" que coloca Alcochete e Vendas Novas como as melhor colocadas para receber o novo aeroporto, Fernando Almeida Santos entende que a CTI fez um trabalho que "merece absoluta concordância, não pelo resultado em si, mas pela transparência do processo, pela dimensão do relatório e pela complexidade dos parâmetros que foram encontrados".

O importante agora - frisa - é colocar mãos à obra: "Exige-se agora decisão, porque Portugal não pode estar refém de não decisões políticas deste calibre por mais tempo e depois que se ponha no terreno a construção do aeroporto, isso é o que se impõe". E para levar a cabo essa tarefa, antecipando o que calcula que venha a ser "o próximo discurso" em torno do aeroporto, garante que os engenheiros portugueses estão à altura da futura empreitada.

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"Embora haja falta de engenheiros em Portugal, principalmente civis, a engenharia portuguesa no setor tem alta capacidade de responder a estas necessidades de Portugal. Obviamente, para complementar equipas, vamos ter de ir buscar engenheiros fora, mas nas lideranças, os engenheiros portugueses conseguem dar resposta àquilo que é este desígnio de Portugal".

"É importante dizer isto, porque vai andar muita gente, vai ser o próximo discurso, a dizer que Portugal e as empresas portuguesas não têm capacidade para este 'boom' de investimento e não é verdade. Temos capacidade e saberemos fazer bem", conclui.

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