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Ricardo Nunes: O mecanismo ibérico deixa marcas de "incerteza regulatória"

Os preços do gás já estão substancialmente mais baixos e no último mês o mecanismo nem sequer foi acionado, mas o ministro do Ambiente Duarte Cordeiro continua a falar de um "seguro" contra eventuais novos picos de preços, frisando que neste momento Bruxelas não tem ainda uma alternativa viável à exceção ibérica para oferecer, enquanto não reformar o mercado elétrico europeu.

Pedro Catarino
31 de Março de 2023 às 09:30
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Supostamente com o aval de Bruxelas, ainda que a comissária da Energia Kadri Simson tenha garantido que "ainda não foi tomada qualquer decisão formal pela Comissão Europeia", o Governo português apressou-se esta semana a anunciar, aprovar em Conselho de Ministros, transformar em lei – que ainda teve de ir ao Presidente da República, tendo sido de seguida publicado em Diário da República –, o novo decreto que prolonga o mecanismo ibérico relativo ao travão aos preços do gás até 31 de dezembro. Tudo isto no espaço de 48 horas.

Os preços do gás já estão substancialmente mais baixos e no último mês o mecanismo nem sequer foi acionado, mas o ministro do Ambiente Duarte Cordeiro continua a falar de um "seguro" contra eventuais novos picos de preços, frisando que neste momento Bruxelas não tem ainda uma alternativa viável à exceção ibérica para oferecer, enquanto não reformar o mercado elétrico europeu.

Sobre o tema, Ricardo Nunes, ainda presidente da ACEMEL, argumenta que "o mecanismo ibérico teve vantagens em termos de preços, num momento de grande turbulência nos mercados de gás no ano passado", sendo que a sua aplicação "limitou a contaminação ao preço de eletricidade no Mibel". No entanto, alerta, "deixou marcas nos mercados de médio e longo prazo" em termos de incerteza regulatória, aos olhos dos investidores. Algo que classifica como uma "externalidade negativa".

Quanto à sua renovação até ao final de 2023, avisa que, nos mesmos moldes, o mecanismo "poderá não ter efeito" caso os preços do gás se mantenham estáveis, como neste momento. "É importante que não se ande de temporário em temporário. Tem de se definir e cumprir, uma data para finalizar o mecanismo e devolver a confiança aos mercados", defende Ricardo Nunes.

Tendo participado ativamente na consulta pública e em vários fóruns de discussão dobre a proposta de reforma do mercado elétrico europeu que está em marcha por iniciativa da Comissão Europeia, a ACEMEL e o seu presidente defendem que este "redesenho das regras" tem alguns aspetos interessantes. Desde logo, o reforço de uma maior negociação de energia a longo prazo – seja através de contratos de compra e venda de energia (PPA Power Purchase Agreements, em inglês) ou contratos por diferença (instrumentos financeiros conhecidos como Contracts for Difference - CfD).

"O mercado ‘spot’, que acabou por ser protegido por esta reforma do mercado elétrico, é volátil e será cada vez com as renováveis. Claro que existem efeitos que podem alisar essa volatilidade, como o armazenamento ou as interligações. Mas é preciso haver, em paralelo, um mercado ou produtos a prazo que permitam que o consumidor só seja influenciado pela volatilidade se essa for uma opção sua, numa tarifa indexada", diz Ricardo Nunes.

Em relação à hipótese avançada por Bruxelas de os consumidores terem contratos anuais com preços fixos, o presidente da ACEMEL defende que é uma "coisa boa, desde que os comercializadores possam fixar essa compra junto dos mercados através de PPA ou CfD". Isto, explica, foi o que deixou de acontecer com a crise energética, quando os comercializadores não podiam oferecer preços competitivos.

No entanto, Ricardo Nunes não tem dúvidas: "A reforma do mercado elétrico europeu será boa para o Mibel e para toda a Europa, porque continua a haver uma interligação entre os mercados, o mesmo algoritmo, o mesmo cálculo dos preços, e isso é importante. O que muda é só o tipo de energia que entra em cada mercado".

Quanto a Portugal e Espanha, têm, como sempre, o problema de serem uma ilha energética. "Temos de promover as interligações elétricas, porque como somos um país muito produtivo em termos de energia fotovoltaica conseguiríamos vender o excesso de produção (sendo que alguma vai ser desviada para o hidrogénio) para a Europa e também importar de países como França, que têm nuclear", prevê Ricardo Nunes, acrescentando que "a Península Ibérica pode ser uma bateria gigante para a Europa".

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