"Projetar Portugal como um centro". Lisboa é casa do maior banco de testes de fibra ótica
Um fio quase impercetível fez história ao ser ligado e conectado numa pequena sala do Metro de Lisboa. A capital e o país querem tornar-se num centro mundial de telecomunicações óticas, alinhando investimentos que antes pareciam impossíveis.
Uma pequena sala na estação Cidade Universitária, na linha Amarela do Metro de Lisboa, foi palco de uma inovação que quer colocar Portugal no mapa a nível das telecomunicações. O ISCTE apresentou o LUMIRing (Lisbon Underground Multicore Fiber Ring) pela primeira vez, num investimento que já ascende a 2,3 milhões de euros. Contudo, a promessa é que este projeto não irá ficar por aqui, mediante a chegada de mais parceiros.
A instalação dos cabos começou a 1 de setembro e esta segunda-feira fez-se a ligação - literalmente - a pinças. Este banco de testes vai experimentar, em ambiente urbano real, fibras óticas com quatro e sete núcleos, que visam multiplicar a capacidade de transmissão de dados e revolucionar as comunicações globais a partir de 2026. Este sistema vai da estação de Odivelas até ao Rato, num total de 26 quilómetros de infraestrutura subterrânea. No total, são 728 quilómetros de fibra multinúcleo, o que o torna o mais extenso e mais avançado do mundo.
O Instituto Nacional de Tecnologia de Informação e Comunicação do Japão (NICT) vai ser o responsável por realizar os testes de fibra ótica, em conjunto com a equipa portuguesa da universidade. A agência pública tutelada pelo executivo nipónico tornou-se a primeira gigante tecnológica mundial a formalizar a participação nos testes, de forma a avaliar o desempenho da transmissão de dados em condições reais, uma vez que a rede agora em Lisboa tem uma escala superior àquela existente: Itália vai até 66 quilómetros, China tem 16 e o Japão apenas três.
A reitora do ISCTE, Maria de Lurdes Rodrigues, assegurou que este projeto, que se afasta ligeiramente do âmbito a que a instituição de ensino está habituada, vai permitir dar visibilidade ao instituto, mas também transformar valor para a economia portuguesa. Este valor foi também referido pelos ministros das Infraestruturas e da Habitação e da Economia e Coesão Territorial, Miguel Pinto Luz e Manuel Castro Almeida, respetivamente.
Ministro das Infraestruturas e da Habitação
Na verdade, o ministro das Infraestruturas quase tratou o banco de testes por tu e muitas vezes explicou a tecnologia ao colega de Governo. Afinal, Pinto Luz é licenciado em Engenharia Eletrotécnica e Computadores, exatamente pelo ISCTE, pelo que a tecnologia multinúcleo não lhe era particularmente estranha. "Este é um esforço gigante naquilo que é o posicionamento global do ISCTE e de Portugal em telecomunicações, juntando-se aos cabos submarinos e aos 'data centers' de investimentos privados e públicos", apontou Miguel Pinto Luz aquando da apresentação do projeto.
E é precisamente este posicionamento e a vontade da academia em fazer mais que está a tornar "Portugal em um dos países da Europa com mais atratividade para este tipo de investimentos". É que o território nacional tem sido palco de investimentos de milhares de milhões, desde os "data centers" aos cabos submarinos. Este próprio projeto soma um investimento de 2,3 milhões de euros, contando com 600 mil euros da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo, do Programa Lisboa 2030, e 900 mil euros da Fundação Calouste Gulbenkian, sendo que o ISCTE assegura o restante financiamento com verbas próprias.
Coordenador do LUMIRing no ISCTE
O coordenador do projeto, Adolfo Cartaxo, explicou que esta "é muito mais do que uma infraestrutura tecnológica", sendo "uma ideia ambiciosa que se tornou numa realidade". "Este projeto vem projetar Portugal e Lisboa com redes óticas de próxima geração e vem impulsionar a próxima rede", contou, adiantando que a parceria entre a instituição e a indústria vem reforçar a capacidade que o país tem para gerar conhecimento e talento, afirmando Portugal no mundo.
"Este é apenas um exemplo de ambição nacional. Queremos mostrar como o país é capaz de criar inovação e infraestrutura de nível mundial, de como somos um farol de conhecimento, inovação e talento", acrescentou o coordenador. Contudo, Adolfo Cartaxo explicou aos governantes que a "fibra multinúcleo ainda não tem um preço acessível", pelo que o investimento só foi possível devido à alemã Heraeus Covantics e à portuguesa Telcabo. "Em termos de valor ainda não é compensatório em relação à tecnologia anterior de fibra única que está massificada", contou.
Também Castro Almeida - que aprendeu uma nova unidade de medida, o peta -, vincou a importância deste projeto a nível global, num momento em que as comunicações estão no foco do desenvolvimento tecnológico. "A comunicação sistemática pedida à inteligência artificial está a fazer aumentar o tráfego. Não sendo sustentável aumentar a transmissão de dados, parece seguro afirmar que só as fibras multinúcleo vão conseguir assegurá-la", considerou o governante com a pasta da Economia.
O ministro apontou ainda que este projeto vai trazer competitividade, por juntar um leque de empresas e querer integrar mais à rede, e que vai "transformar Portugal num centro, permitindo atrair mais investimentos em IA".
Também a presidente do Metro de Lisboa, Maria Helena Campos, evidencia a parceria que se criou com este projeto, optando pela utilização de metáforas tecnológicas. "Este projeto vai pelas profundezas da Terra, do subsolo infraestruturado e atinge a nuvem [cloud]. A nuvem passou a deter um papel infraestrutural que habita a forma se vive, pensa e age nos dias de hoje", confidenciou. "É uma visão que transforma a infraestrutura em matriz de progresso e que inscreve Lisboa no mapa dos grandes centros internacionais de investigação tecnológica. No tempo em que as cidades se reinventam, este projeto simboliza a articulação entre o subterrâneo e o futuro".
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