Debate com Bruno Maçães, Jagdeep Singh Bachher e Mariya Gabriel, moderado por Rosália Amorim, da EY Portugal.
A União Europeia tornou-se bastante tecnológica na sua forma de ser porque acreditava que isso se enquadrava nos ideais da União Europeia. É aberta, liberal. Depois, “a tecnologia passou a ser cada vez mais geopolítica, é hoje a fonte do poder geopolítico”, afirmou Bruno Maçães, consultor sénior na Flint Global e autor do livro “World Builders: Technology and the new geopolitics”, na conferência The Lisbon Conference, dedicada às relações transatlânticas entre a Europa e os Estados Unidos, realizada no âmbito da comemoração do primeiro aniversário do canal Now.
Na sua opinião, existe uma corrida para construir novos mundos e para definir quem os vai construir, enquanto os restantes estarão sujeitos a viver em mundos construídos por outros. “Vejo este mundo como sendo potencialmente extremamente hierárquico e a dividir-se entre os que programam a nossa tecnologia e os que se limitam a jogar o jogo programado por outros”.
Para Jagdeep Singh Bachher, diretor de investimentos da Universidade da Califórnia, que gere 190 mil milhões de dólares, o mundo está a ficar cada vez mais segregado e dividido devido à tecnologia. “Existem normas em diferentes partes do mundo devido à importância dos dados, da cibersegurança e de normas regulamentares”. Já Mariya Gabriel, presidente do Instituto Robert Schuman, considera que a tecnologia pode tanto ligar como dividir. “É importante pensar na conceção, na implementação, na acessibilidade e no utilizador.”
Fábricas de inteligência
Um dos outros fios da argumentação de Bruno Maçães é que “a inteligência é muito escassa. Agora podemos produzi-la em fábricas de inteligência, porque a Inteligência Artificial (IA) é, na verdade, uma fábrica de inteligência”. Bruno Maçães reforça que “não tenho medo nenhum da IA. Tenho medo das pessoas que podem usar a IA para controlar outras pessoas, máquinas que pensam podem ser usadas por outros seres humanos para exercer poder”.
Neste novo paradigma, a Europa aparece como um ator em risco de marginalização. O antigo secretário de Estado dos Assuntos Europeus de Portugal, entre 2013 e 2015, apontou o dado alarmante de que “a Europa tem apenas 4,8% do poder de computação global”, enquanto os EUA dominam com cerca de 75% e a China com 15%. E dos 20 maiores centros de dados na Europa, nenhum é europeu. Para Bruno Maçães, a causa não reside na regulamentação, mas em fatores estruturais, como a fragmentação do mercado e a rigidez das regras de concorrência, que impedem o surgimento de gigantes tecnológicos europeus. “Acabámos por ficar sem uma economia de Internet e totalmente dependentes das empresas americanas.”
Bruno Maçães lembrou que “a IA já está a ser usada em conflitos como na Ucrânia, para detetar tanques e sistemas de armas”, e que uma possível guerra em Taiwan será travada com ferramentas tecnológicas ainda mais avançadas. Mariya Gabriel mostrou-se otimista com os recentes passos europeus. “Até ao final do ano, todas as fábricas de IA da União Europeia estarão operacionais. Isto triplicará as nossas capacidades em pouco tempo.”
Mentalidade de crescimento
Mariya Gabriel defendeu que a regulamentação é necessária para a segurança pública e a previsibilidade, mas sublinhou a importância de garantir flexibilidade e espaços de experimentação. Alertou para o risco de “sufocar as PME com regulamentações excessivas.”
Jagdeep Singh Bachher trouxe uma visão pragmática e experiencial. Com um portefólio que cresceu de 88 mil milhões para quase 200 mil milhões de dólares em dez anos, destacou a importância de uma mentalidade de crescimento, independentemente dos ciclos políticos ou económicos. Ao investir, a sua prioridade é onde estão as novas gerações e o seu interesse. Considera essencial estar atento às próximas três empresas que vão ameaçar a liderança da OpenAI. Defende que a combinação de dados, modelos e IA está a transformar setores como a saúde, a defesa e a indústria.