Analisar o impacto da inteligência artificial na economia global e no mercado de trabalho. Esta foi a tarefa do economista e investigador Daniel Susskind na sessão solene de entrega de prémios da 3.ª edição do Prémio Nacional de Inovação (PNI). Professor no King’s College London e investigador sénior no Institute for Ethics and AI da Universidade de Oxford, é autor de vários livros, entre os quais Growth: A Reckoning (2024), destacado pelo Financial Times e pela New Yorker como uma das obras do ano.
Na sua intervenção, Daniel Susskind destacou três factos “simples, mas realmente notáveis” que moldaram a história económica da Humanidade. Em tom firme, recordou que “por mais de 300 mil anos a vida económica foi essencialmente estagnada”, apontando que, mesmo entre as sociedades de caçadores-recolectores do Paleolítico e os operários da Revolução Industrial, “do ponto de vista económico, a vida teria sido similar, encaixada numa luta desesperada pela subsistência”. Foi apenas “há cerca de 200 anos” que se desencadeou um crescimento sustentável, uma ascensão que os seres humanos conseguiram manter ao longo de gerações, libertando recursos para melhorar a saúde, prolongar a esperança média de vida e financiar descobertas científicas revolucionárias.
A derradeira transformação deu-se durante a Segunda Guerra Mundial, quando o governo britânico se viu obrigado a medir de forma fiável “o quão grande era a economia do país” para decidir quanto podia destinar ao esforço militar sem prejudicar as necessidades civis. Foi então que John Maynard Keynes desenhou as primeiras contas nacionais, dando origem à métrica que hoje conhecemos como Produto Interno Bruto. Durante a Guerra Fria, o crescimento tornou-se um indicador de poder. Daniel Susskind citou o presidente John F. Kennedy, que em 1960 declarou que “o crescimento persuadiria aqueles indecisos entre o capitalismo e o comunismo a escolherem o nosso sistema”, enquanto Nikita Khrushchev afirmava que “o crescimento nos daria uma arma para derrubar o capitalismo”.
É possível crescer num planeta finito
Desafiando a noção de que “o crescimento infinito não é possível num planeta finito”, Daniel Susskind fez a distinção entre os recursos tangíveis, “a quantidade de hectares de terra para cultivar e o material que se pode produzir ou extrair dessa área”, e o universo intangível das ideias. Para ilustrar, comparou “300 ingredientes numa despensa” com o número de receitas possíveis de realizar, que “excede o número de átomos no universo”. A conclusão é que “o crescimento económico vem do progresso tecnológico, e o progresso tecnológico vem de ideias criativas, inteligentes e inovadoras que nos permitem usar os recursos de que dispomos de forma mais produtiva”. Na sua intervenção, abordou os elementos-chave para fomentar esse fluxo de ideias. Sublinhou a necessidade de investir muito mais em investigação e desenvolvimento, lembrando que Portugal “investe menos de 2% do PIB em I&D, bem abaixo dos 5,4% de Israel”. Enfatizou também a relevância de alocar mais talento humano às atividades de criação de conhecimento e, por fim, lançou um olhar provocador sobre a própria tecnologia como fonte de inovação. “Ao contrário do século XX, em que as melhores ideias vinham de cérebros humanos brilhantes, no século XXI virão das tecnologias.” Referiu o papel da inteligência artificial no desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19 pela Moderna, e o exemplo do AlphaFold2, que foi reconhecido com o Nobel da Química de 2025, atribuído a Demis Hassabis.
Voltando-se para o impacto desta revolução tecnológica no mundo do trabalho, o investigador alertou para o crescimento do que designa “desemprego tecnológico friccional”. “Existe trabalho, mas as pessoas não dispõem das competências certas, vivem longe dos centros de emprego ou mantêm uma identidade profissional que as impede de mudar para as funções disponíveis.” Daniel Susskind sublinhou ainda que essa realidade pode evoluir para um cenário mais drástico, em que “simplesmente não haverá trabalho suficiente para todos”, se sistemas de inteligência artificial assumirem progressivamente todas as tarefas cognitivas e manuais.
Como resposta, propôs uma visão ampla de educação ao longo da vida, em três vertentes indissociáveis. Primeiro, o “quê” ensinar. Não basta preparar as pessoas para tarefas rotineiras que as máquinas já executam, mas sim capacitá-las para competir em áreas onde a tecnologia ainda não chega ou, inversamente, ensiná-las a operar e a desenhar essas mesmas máquinas. Depois, o “como” ensinar. Questionando as práticas centenárias de sala de aula, apontou para as potencialidades das plataformas digitais e da personalização da aprendizagem. Por fim, o “quando” intervir. Rejeitando a ideia de que a educação termina na juventude, defendeu a paridade de investimento na requalificação ao longo de toda a carreira profissional, garantindo flexibilidade face às incertezas do mercado.
Embora reconheça que a educação não resolverá sozinha o desemprego tecnológico, Daniel Susskind concluiu citando o filósofo Derek Parfit, “temos o poder não só de fazer a vida melhor nas próximas décadas, mas de maneiras que nem podemos imaginar”.