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O maior desafio da inovação em Portugal é o talento

Portugal reforçou este ano a sua posição no ranking europeu da inovação e melhorou a integração do seu sistema de investigação. A falta de talento qualificado continua a ser um entrave ao progresso, segundo dados da Comissão Europeia, do Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia e da Agência Nacional de Inovação.

14:00
Talento impulsiona inovação em Portugal, conectando o país a um futuro tecnológico.
Talento impulsiona inovação em Portugal, conectando o país a um futuro tecnológico. Getty Images
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Num país onde o investimento em ciência e tecnologia tem vindo a crescer de forma consistente desde 2018, a inovação parece começar, definitivamente, a afirmar-se como um eixo transversal da economia. Desde o digital à energia, da indústria aos serviços. São várias as “vozes” que sustentam que o sistema português de Inovação e Desenvolvimento (I&D) apresenta hoje uma maturidade visível, alicerçada por empresas mais ativas, instituições de interface mais robustas e políticas públicas orientadas para a colaboração. Ainda assim, a distância face aos líderes europeus continua a medir-se, sobretudo, em capital humano.

Portugal sobe no ranking europeu da inovação e ocupa a 16.º lugar no European Innovation Scoreboard 2025.

De acordo com o European Innovation Scoreboard 2025 (EIS 2025), publicado pela Comissão Europeia, Portugal subiu do 19.º para o 16.º lugar no ranking da inovação, aproximando-se da média da União Europeia com um índice de 90,7%, mais três pontos percentuais do que em 2024. O país mantém-se na categoria de “Inovador Moderado”, mas apresenta uma evolução “sustentada em vários indicadores-chave”.

Portugal lidera os 27 Estados-membros no apoio público à I&D empresarial.

Lê-se no relatório que Portugal lidera entre os 27 Estados-membros no apoio público à I&D empresarial, com 185,8% da média europeia, e que se destaca também nas vendas de inovações novas no mercado ou na empresa, que atingem 133% da média da UE. A digitalização é outro dos pontos fortes, com desempenho elevado no acesso à internet de alta velocidade, nas competências digitais e na adoção de serviços em nuvem.

O Regional Innovation Scoreboard 2025 reforça essa trajetória. A região da Grande Lisboa é, pela primeira vez, classificada como “Strong Innovator”, com 109,6% da média europeia, liderando entre as nove regiões portuguesas e destacando-se em emprego em Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), co-publicações científicas e vendas de inovações. Também o Centro de Portugal surge acima da média do grupo dos “Inovadores Moderados”, com 90,1% da média europeia, sinalizando uma evolução “positiva e coesa” do sistema nacional de inovação.

Empresas mais fortes, mas desiguais

Também o Estudo sobre Inovação e I&D nas Empresas em Portugal, publicado pelo Gabinete de Estratégia e Estudos (GEE) do Ministério da Economia e da Coesão Territorial, sustenta que o tecido empresarial nacional assume hoje um papel determinante no investimento em inovação. Em 2023, as empresas foram responsáveis por 62,6% da despesa nacional em I&D, equivalente a 1,1% do PIB, correspondendo a 2 844 milhões de euros.

O estudo indica que 44,7% das empresas inovaram entre 2020 e 2022. O investimento total em inovação atingiu 3.382,4 milhões de euros, sendo mais de metade concentrada na área dos serviços (60,2%), seguida da indústria (33,1%).

A análise do GEE mostra também a forte concentração territorial do investimento. A Grande Lisboa e o Norte absorvem quase três quartos da despesa nacional em I&D (38,9% e 36%, respetivamente), enquanto regiões como o Alentejo, o Algarve ou as Regiões Autónomas mantêm uma expressão residual. A qualificação dos recursos humanos é outro fator relevante: 46% dos profissionais envolvidos em atividades de I&D têm licenciatura, 31% mestrado e 5% doutoramento.

Digitalização e conectividade: os pilares da próxima década

O Relatório Portugal 2025 sobre a Década Digital, da Comissão Europeia, reconhece a “cobertura quase total de 5G e gigabits” no país, classificando as infraestruturas digitais como sólidas e o ecossistema favorável às empresas em fase de arranque. Contudo, o mesmo documento assinala que a “adoção de tecnologias avançadas pelas empresas continua modesta”, em particular no uso de inteligência artificial, e que as competências digitais básicas permanecem abaixo da média da UE.

Portugal conta com um roteiro nacional composto por 157 medidas e um orçamento de 2,15 mil milhões de euros, o equivalente a 0,75% do PIB, para acelerar a transformação digital até 2030. O relatório recomenda “reforçar a colaboração entre o setor público, o privado e o meio académico” e apoiar a adoção de tecnologias digitais avançadas, nomeadamente a IA.

Segundo o Eurobarómetro Especial sobre a Década Digital, 71% dos portugueses consideram que a digitalização dos serviços públicos e privados está a facilitar as suas vidas e 89% defendem o combate à desinformação online, o que reflete um nível elevado de confiança na transição digital em curso.

Estabilidade e escassez de talento

O Barómetro Internacional da Inovação 2026, realizado pela Ayming e apoiado pela Agência Nacional de Inovação (ANI), confirma que “a inovação continua a ser uma das forças transformadoras que moldam o mundo”, embora sob crescente pressão geopolítica e económica. Lê-se no documento que “impulsionar a inovação” regressa ao segundo lugar nas prioridades das empresas, logo a seguir a “aumentar a eficiência operacional”. A “redução de custos”, que liderava no ano anterior, desce agora para a quarta posição.

De acordo com o barómetro, 96% das empresas afirmam dispor de uma equipa de inovação - um aumento significativo face aos 78% do ano anterior - e os orçamentos médios mantêm-se estáveis em 6,7% do volume de negócios. A inteligência artificial surge como a principal prioridade de investimento, ultrapassando a adoção de novas ferramentas e tecnologias.

Mas o relatório identifica também o maior bloqueio. A falta de competências ou talento disponível é hoje a principal barreira à inovação, referida por 41% das empresas, acima da pressão por resultados imediatos (39%). A escassez de talento é particularmente sentida nos setores da energia e da indústria, enquanto o agroalimentar é o menos afetado.

Segundo o mesmo documento, mais de metade das empresas mede o impacto da inovação através das vendas e receitas (56%), enquanto 44% avaliam o sucesso dos projetos de I&D e 39% o crescimento da propriedade intelectual. As colaborações intersetoriais tornam-se cada vez mais frequentes. Mais de metade (53%) das organizações trabalham com parceiros externos, 36% com universidades e 29% com agências governamentais de inovação.

Conhecimento aplicado e redes colaborativas

Segundo a ANI, “os projetos colaborativos apoiados pela Agência não têm como objetivo a transferência direta de talento das universidades ou instituições de interface para as empresas, mas sim a partilha de conhecimento, competências e necessidades, criando condições para que a inovação se desenvolva de forma estruturada e sustentável”.

A ANI sublinha que não dispõe de instrumentos próprios especificamente dedicados à captação ou retenção de talento, sendo por isso “fundamental a articulação com a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT)” para garantir a complementaridade dos mecanismos de financiamento disponíveis no Sistema Científico e Tecnológico Nacional.

O ecossistema colaborativo e científico português está em expansão, com uma rede nacional que integra 40 Laboratórios Colaborativos e 31 Centros de Tecnologia e Inovação.

De acordo com a Agência, Portugal conta hoje com uma rede consolidada de 40 Laboratórios Colaborativos (CoLABs) e 31 Centros de Tecnologia e Inovação (CTI), que “funcionam como pontes entre o meio académico e o tecido empresarial”. No final de 2023, estas estruturas integravam 6.130 profissionais, dos quais 1.454 doutorados. A Missão Interface, gerida pela ANI no âmbito do PRR, já financiou 1.755 recursos humanos altamente qualificados, incluindo 475 doutorados.

Outro instrumento de relevo é o SIFIDE - Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial. Nos últimos três exercícios fiscais, entre 593 e 597 empresas declararam empregar doutorados em atividades de I&D. Em 2022, o número total de doutorados envolvidos atingiu 1.554, descendo ligeiramente nos dois anos seguintes para 1.385 e 1.386, respetivamente. Segundo a ANI, este regime tem também “contribuído para atrair empresas estrangeiras que escolhem Portugal para instalar as suas atividades de investigação e desenvolvimento”, reforçando a base tecnológica nacional e a atração de talento internacional.

Um ecossistema em maturação

Os relatórios e dados reunidos apontam para um ecossistema de inovação cada vez mais estruturado, embora desigual. Portugal demonstra capacidade de convergência com a média europeia e consolida a base empresarial da I&D, mas a escassez de competências especializadas e a dispersão territorial continuam a ser fragilidades reconhecidas pelas próprias instituições.

Como se lê no Barómetro Internacional da Inovação 2026, a inovação “continua e o otimismo perdura”, mesmo perante desafios persistentes. A força da digitalização, o papel das redes colaborativas e o investimento em talento científico e tecnológico permanecem, segundo estes relatórios, as chaves para o próximo salto de Portugal no mapa da inovação.

Prémio Nacional de Inovação Os artigos e as iniciativas relacionadas com o Prémio Nacional de Inovação regressam em janeiro de 2026. Esta é uma iniciativa do Jornal de Negócios, do BPI e da Claranet Portugal, que conta com o apoio institucional da Agência Nacional de Inovação e da COTEC Portugal, a Nova SBE como knowledge partner, o Grupo Brisa, o FI Group e a HP Portugal como parceiros, e Cascais como município inovador.
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