A história da PeekMed começou em 2015, quando três jovens engenheiros biomédicos decidiram que a tecnologia podia, e devia, ser usada para melhorar a vida das pessoas. Da sua ambição nasceu uma ferramenta simples, destinada a apoiar cirurgiões ortopédicos no planeamento de intervenções.
O que era um projeto embrionário, desenvolvido em Braga, transformou-se numa plataforma global, hoje utilizada por mais de 4.500 cirurgiões em 35 países, com impacto direto em dezenas de milhares de pacientes.
O produto que está no centro deste percurso chama-se PeekMed, um sistema de planeamento pré-operatório ortopédico que rapidamente evoluiu para se tornar uma referência internacional. O objetivo é claro: tornar as cirurgias ortopédicas mais seguras, mais precisas e mais eficientes. Através da tecnologia, o sistema permite aos médicos desenhar, testar e otimizar os procedimentos antes de entrarem na sala de operações, reduzindo riscos e melhorando resultados.
João Pedro Ribeiro, CEO e cofundador, resumiu ao Negócios a essência desta trajetória. “A PeekMed nasceu em 2015 de uma ambição muito clara: usar tecnologia para melhorar a vida das pessoas. Éramos três jovens, no ramo da engenharia biomédica, com uma ideia e um enorme sentido de missão: tornar as cirurgias ortopédicas mais seguras, precisas e eficientes”. O que começou com uma ferramenta simples, criada por três engenheiros em Braga, evoluiu para “uma plataforma global, utilizada por milhares de cirurgiões em todo o mundo, com impacto direto em dezenas de milhares de pacientes”.
Acumulação de prémios
Essa evolução assentou numa aposta consistente na inovação. A empresa investiu em processos de certificação exigentes - como a aprovação da FDA nos Estados Unidos e a certificação MDR na Europa - e estabeleceu parcerias com líderes mundiais da indústria médica. Pelo caminho, foi conquistando reconhecimento através de prémios nacionais e internacionais, incluindo o Prémio Nacional de Inovação (PNI), na categoria Saúde e Bem-Estar, distinção que João Pedro Ribeiro classifica como “gratificante” para toda a equipa.

Foto em cima: A equipa da PeekMed: Sara Silva, COO & CQO, João Pedro Ribeiro, CEO, João Albuquerque, Marketing Manager e Bastian Pesl, Regional Business Manager
A viragem mais decisiva aconteceu com a integração da inteligência artificial (IA) no sistema de planeamento cirúrgico.
O ponto de partida foi a escuta atenta das necessidades da comunidade médica e da indústria. “Sabíamos que o planeamento manual exigia muito tempo e era altamente dependente da experiência individual de cada cirurgião”, explica o CEO. A aposta na IA visou automatizar e padronizar esse processo, reduzindo a variabilidade e permitindo, ao mesmo tempo, que o sistema se adaptasse ao estilo de cada profissional.
O impacto foi imediato. “Conseguimos reduzir de uma hora para apenas dois minutos o tempo necessário para gerar um plano cirúrgico, com mais precisão e menos variabilidade”, afirma João Pedro Ribeiro. Esta decisão transformou o produto e abriu caminho a um feito inédito: a PeekMed tornou-se a primeira empresa na Europa a lançar uma tecnologia de planeamento ortopédico 100% automática.
Aprovação pela FDA
A aprovação pela FDA - a Food and Drug Administration, a autoridade regulatória norte-americana reconhecida como uma das mais exigentes do mundo no setor da saúde - do primeiro sistema de planeamento ortopédico 100% automático, desenvolvido pela PeekMed, representou um ponto de viragem não apenas para a empresa portuguesa, mas para todo o setor de MedTech. João Pedro Ribeiro não tem dúvidas sobre o alcance desse feito: “Esta aprovação, reconhecida por ser uma das mais exigentes do mundo, validou cientificamente o nosso trabalho e colocou-nos num patamar de confiança internacional”.
A conquista assumiu também um valor simbólico importante para a inovação feita em Portugal. “Para nós, foi a confirmação de que uma empresa fundada e baseada em Portugal consegue desenvolver tecnologia de ponta com impacto global. Para o setor, é a demonstração clara de que a inteligência artificial não é uma promessa futura, é uma realidade que já está a transformar a forma como a medicina é praticada”, sublinha o CEO.
Feedback positivo
No terreno, junto de quem utiliza a solução, a receção tem sido positiva. Cirurgiões de diferentes países realçam a rapidez, a precisão e a facilidade de utilização do sistema, diz a empresa. Muitos relatam que o PeekMed os ajuda a tomar decisões mais seguras e a sentirem-se mais confiantes, mesmo perante casos de elevada complexidade.
Também os hospitais destacam os benefícios do software, desde a eficiência acrescida até à previsibilidade nos procedimentos. A redução de custos é outro fator de peso num setor permanentemente pressionado pela necessidade de fazer mais com menos recursos.
Outro aspeto valorizado pelas instituições e reportado pela empresa é a facilidade de integração com outras tecnologias já usadas em ambiente hospitalar, como a robótica e os sistemas de navegação. Essa compatibilidade, garantem, torna o PeekMed mais atrativo e acelera a adoção em diferentes mercados.
Do ponto de vista clínico, a utilização do PeekMed permite aumentar a precisão dos procedimentos e reduzir complicações, traduzindo-se em menos cirurgias de revisão, tempos de recuperação mais curtos e melhores resultados para os pacientes. Em termos operacionais, os hospitais conseguem planear melhor, otimizar recursos e realizar mais cirurgias com menos pressão organizacional. Já no plano económico, os efeitos são igualmente significativos: menos tempo no bloco operatório, menor risco de infeções intraoperatórias, redução do desperdício de material e internamentos mais curtos. Como resume João Pedro Ribeiro, “é um verdadeiro win-win para todos os envolvidos”.
Consolidação internacional
A consolidação internacional da PeekMed ganhou novo fôlego com a colaboração estabelecida com a DePuy Synthes, empresa da Johnson & Johnson MedTech. Esta parceria nasceu de um reconhecimento mútuo do potencial transformador da IA na ortopedia. “Eles procuravam uma solução inovadora para deformidades do pé e tornozelo, e viram na PeekMed um parceiro tecnológico sólido, com experiência comprovada e ambição global”, recordou João Pedro Ribeiro.
Dessa colaboração resultou o VirtuGuide, um sistema que se tornou exemplo concreto de como a inteligência artificial pode transformar a prática clínica. Nas palavras do CEO, trata-se de “uma solução que automatiza e personaliza o planeamento de correções ortopédicas, reduzindo drasticamente o tempo de análise e aumentando a precisão. É um produto que junta a nossa tecnologia e o alcance clínico da DePuy Synthes”.
Este produto, desenvolvido em parceria com um gigante global da área médica, demonstra a robustez tecnológica da empresa portuguesa e abre caminho a uma maior inserção nos mercados internacionais. “É, sem dúvida, um selo de credibilidade internacional. Trabalhar com uma empresa como a Johnson & Johnson MedTech não só valida a nossa tecnologia, como nos insere numa rede global de distribuição, conhecimento e influência”, sublinha João Pedro Ribeiro.
O impacto dessa colaboração ultrapassa, por isso, os limites da inovação tecnológica. Representa uma afirmação internacional do país. “Esta parceria ajuda-nos a acelerar a nossa missão e mostra ao mundo que em Portugal também se faz tecnologia médica de excelência, pronta para liderar nos mercados mais exigentes”, acrescenta o CEO.
Mas o caminho para este patamar teve os seus obstáculos. A criação de soluções altamente automatizadas e, ao mesmo tempo, alinhadas com os padrões de exigência clínica mais rigorosos, colocou a empresa perante desafios complexos de certificação.
“O maior desafio torna-se a certificação de um dispositivo médico tão complexo, ao nível de tecnologia, como aquela que é usada na PeekMed. O facto de termos ultrapassado esses desafios, quer no mercado americano ou no europeu é um sinal claro que estamos no rumo certo. Usamos as tecnologias mais atuais, correspondendo às necessidades dos utilizadores”, afirma João Pedro Ribeiro.
IA na inovação são fulcrais
A inovação baseada em inteligência artificial está a reconfigurar profundamente a medicina e, em particular, a cirurgia ortopédica. “Em ortopedia, a automação, a personalização, a previsibilidade e a eficiência que conseguimos alcançar com inteligência artificial não tem paralelo nos métodos tradicionais”, refere o CEO da PeekMed.
Acredita que esta transformação será um fator determinante de diferenciação no setor, uma vez que a competição entre produtos será cada vez mais elevada. “A inovação nesta área vai ser um fator-chave de diferenciação, porque todos estarão à procura da melhor solução e a competição entre produtos será cada vez mais elevada. Aqueles que conseguirem ser mais inovadores, trazendo novas tecnologias para o mercado, conseguirão uma vantagem competitiva”.
O debate já não se centra em saber se os médicos vão ou não adotar estas tecnologias, mas sim no ritmo com que a inovação conseguirá trazer ferramentas mais eficazes para o dia a dia clínico. “A realidade atual demonstra que a IA não vai substituir os médicos, mas vai dar-lhes ferramentas poderosas para tomarem decisões mais informadas e, após a fase da desconfiança com a tecnologia, assistimos agora à adoção em massa deste tipo de ferramentas. O desafio já não é a adoção, é mesmo como conseguiremos inovar diariamente para trazer versões melhoradas neste tipo de ferramentas”, sublinha.
Essa visão de futuro é complementada pela validação conquistada no presente com a atribuição do Prémio Nacional de Inovação, na categoria Saúde e Bem-Estar. “Para a empresa, é o reconhecimento público do trabalho de uma equipa incansável que, todos os dias, dá o seu melhor para transformar a saúde através da tecnologia, com foco na inovação”, destacou João Pedro Ribeiro.
“Para mim, pessoalmente, é também um momento gratificante em que recordo o passado, e vejo o caminho que percorremos, desde um conceito teórico até um dispositivo médico certificado, usado mundialmente e com impacto real em pacientes. É a prova de que, com visão, foco, e resiliência, é possível fazer algo verdadeiramente transformador e inovador”, concluiu.