Em pouco mais de uma década, a Indie Campers passou de uma pequena startup para uma das principais referências mundiais em viagens de autocaravana. Entre os marcos do percurso está a aquisição da West Coast Campers, entre 2015 e 2017, que permitiu aprofundar o conhecimento da indústria e arrancar com a produção interna de veículos. Até 2017, a empresa já tinha produzido 400 autocaravanas e, no ano seguinte, estabeleceu acordos com fabricantes de origem (OEM). A meta é atingir uma frota total de 10 mil veículos até 2026.
O caminho não foi linear. A Indie Campers enfrentou momentos de elevada incerteza, como a pandemia da Covid-19. “Com o confinamento obrigatório, os clientes deixaram de viajar. Tivemos de aplicar muito pensamento criativo para sobreviver à quebra”, recordou Hugo Oliveira, CEO da Indie Campers.
O regresso da procura, mais focada em turismo local e sustentável, impulsionou a Indie Campers para um novo patamar, consolidando-a como líder global em roadtrips. Hoje os desafios mudaram e relacionam-se “com a ambição de manter uma elevada taxa de crescimento e de satisfação dos clientes e, ao mesmo tempo, garantir a sustentabilidade do negócio”, considera Hugo Oliveira.
A globalização do negócio
A expansão internacional começou em Espanha no verão de 2015. Os Estados Unidos entraram no mapa em 2022 e a Oceânia em 2023. Para gerir esta escala global, com cerca de 80 localizações, a Indie Campers criou uma rede de escritórios regionais em Lisboa, Los Angeles, Cidade do México, Sidney e Manila.
A ronda de investimento que culminou em maio de 2025, com um total de 62,5 milhões de euros, trouxe novo fôlego à estratégia de crescimento. Os mercados prioritários incluem os Estados Unidos, a Oceânia e a Ásia, com a região Ásia-Pacífico a assumir particular importância no horizonte estratégico.
A resposta aos desafios da escala passa pela tecnologia. A empresa desenvolveu uma plataforma própria, totalmente digital, que integra todo o processo de reserva, check-in e apoio ao cliente. A análise de dados e a inteligência artificial são utilizadas para otimizar preços, gerir a disponibilidade da frota, aumentar taxas de conversão e melhorar a experiência do utilizador.
“Diferenciamo-nos da concorrência tradicional, ainda muito assente em processos manuais e burocráticos”, sublinha Hugo Oliveira. Segundo o CEO, a taxa de resposta aos inquéritos de satisfação aproxima-se dos 100%, permitindo uma recolha de dados consistente e ação contínua baseada no feedback dos clientes.
A empresa combina processos padronizados com um modelo baseado em frota própria, que assegura maior controlo sobre o estado dos veículos. Esta estrutura garante proximidade ao cliente e capacidade de adaptação local, sem perder a coerência da marca.
Novos produtos
Hugo Oliveira revela que a empresa está a diversificar o portefólio com novos produtos em áreas como seguros e fintech, ao mesmo tempo que explora diferentes modelos operacionais, incluindo o peer-to-peer, lançado em 2021. Este modelo híbrido, que combina frota própria com veículos de terceiros, permite uma cobertura geográfica mais ampla e uma oferta diversificada. “Ainda assim, a frota própria continua a ser a espinha dorsal, assegurando maior controlo sobre qualidade, preços e experiência do cliente”, sublinha Hugo Oliveira.
O perfil dos clientes também evoluiu. Se no início predominavam jovens exploradores e viajantes ocasionais, hoje o leque é mais diversificado, com famílias e aventureiros experientes a ganhar peso. Ainda assim, os millennials continuam a ser o grupo dominante, movidos por experiências autênticas e contacto direto com a natureza. Desde o início que a Indie Campers financia a expansão de forma equilibrada, assegurando que o custo de aquisição de cliente é recuperado logo na primeira transação.
Em 2023, faturou 83,5 milhões de euros, em que o aluguer próprio representa atualmente a componente dominante das receitas, enquanto o peer-to-peer e a venda de autocaravanas desempenham um papel estratégico, essencial para a sustentabilidade do negócio e relevante para o cliente.
O negócio que nasceu de uma viagem e uma tese
Hugo Oliveira transformou um pequeno negócio em Portugal numa organização com centenas de colaboradores e uma frota projetada de 10 mil veículos em 2026, distribuída por 21 países.
Nascido em 18 de janeiro de 1989, em Santo Tirso, Hugo Oliveira foi jogador de andebol e, desde muito jovem, por volta dos 11 ou 12 anos, “sonhava em construir o meu próprio negócio”, revelou em entrevista à “Founders Interviews” de 2024. Licenciado em Gestão, prosseguiu com um mestrado em Empreendedorismo, participando em diversos programas internacionais. A experiência Erasmus foi transformadora, despertando-lhe “uma paixão pelo cenário internacional” que nunca mais o abandonaria. Trabalhou desde jovem, inicialmente ajudando no negócio familiar do pai, uma experiência que moldaria a sua visão empresarial.
O ponto de viragem aconteceu durante os últimos seis meses dos estudos, quando trabalhou na Austrália, onde alugou e viveu numa autocaravana durante alguns meses. “Esta experiência foi reveladora e plantou a semente do que mais tarde se tornaria a Indie Campers”, recordou numa entrevista. Quando regressou a Portugal, escreveu a tese de mestrado criando um plano de negócios para uma empresa que ainda não existia, a Indie Campers. O que começou como um projeto universitário rapidamente se tornou um negócio real.
Família, amigos e microcrédito
“A ideia surgiu para suprir uma necessidade que havia em todo o mundo, que era o aluguer online de uma autocaravana de uma maneira simples, fácil, em qualquer sítio do mundo”, disse Hugo Oliveira na cerimónia de atribuição dos Prémios Exportação e Internacionalização em novembro de 2024. A empresa Indie Campers foi fundada em fevereiro de 2013 por Hugo Oliveira e Stefan Koeppl, amigo que conhecera em Lisboa. O negócio começou por ser apoiado por um empréstimo de amigos e familiares e por um microcrédito de 16 mil euros. Para lançar as operações em Lisboa e no Porto, recorreu mais tarde a investimento seed da Portugal Ventures, recuperado dois anos depois.
No início da empresa, os dois sócios dedicaram-se à criação do site como único canal de vendas e à conceção inovadora do negócio, que passava por autocaravanas mais pequenas, fáceis de conduzir, com menor consumo e interiores preparados para alguns dias de férias, como Hugo Monteiro explicou ao Observador. Em 2015, Stefan Koeppl regressou a Viena, sendo hoje managing partner da Samira Advisors. Nessa altura, a Indie Campers tinha seis carrinhas e resultados positivos.
Nos primeiros quatro anos, Hugo Oliveira desempenhou um papel sobretudo operacional e muito ligado às atividades no terreno, desde tarefas como limpeza e check-ins até iniciativas de revenue e marketing. Depois, foi gradualmente delegando responsabilidades e assumindo uma função mais central, orientada para o crescimento global da empresa. Atualmente, atua de forma estratégica, coordenando e gerindo as diferentes iniciativas da organização.