Manuel Caldeira Cabral 19 de Junho de 2008 às 13:59

Imigrantes nas mãos dos populistas

Há muitos anos que a União Europeia tem uma política bem definida para a imigração: não ter política. Uma ausência que promove a imigração ilegal, com todos os problemas que isso acarreta. Em Franca e Itália os novos líderes falam deste assunto como se fosse um mero problema de polícia. É um erro, mas faltam líderes que assumam políticas alternativas.

Nos barcos que chegam a Bari vindos da Albânia ou Montenegro a fila dos cidadãos comunitários está vazia. A dos não comunitários estende-se em demoras, graças a revistas a malas, inquéritos e confirmações de vistos. Na entrada de Ceuta, quem vem de Marrocos depara-se com filas e filas de marroquinos apertados contra as grades de uma espécie de jaula por onde têm de passar para entrar na União Europeia (UE). Nas Canárias e em todo o Mediterrâneo pessoas passam a nado ou em embarcações sem condições. Morrem milhares pelo caminho.

É a única forma que estas pessoas, de quem a Europa tanto precisa, encontram para chegar à terra prometida - a União Europeia. E a maneira como chegam vai marcar a sua integração de forma definitiva. Entram ilegais, integram-se na economia paralela, não contribuem para os impostos, não beneficiam das promessas de cuidados de saúde da UE, e são explorados por pessoas que aproveitam da fragilidade da sua situação.

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Acontece que a Europa necessita cada vez mais de imigrantes. Precisa para compensar os efeitos do envelhecimento da população na Segurança Social. Precisa para fazerem muitas tarefas que os europeus já não querem fazer. Precisa também da criatividade multiculturalidade que só a abertura ao mundo lhe pode proporcionar se quiser continuar a ser um espaço cosmopolita que concorra com os Estados Unidos da América (EUA). Na realidade, a União Europeia tem muito a ganhar se souber integrar os imigrantes, mas não o está a fazer.

Emigrar para os países europeus de forma legal é uma tarefa quase impossível. O número de imigrantes legais admitidos no espaço Shengen é menos de um quinto dos admitidos legalmente nos EUA. É uma realidade que desmente a ideia feita de que os EUA têm uma política de controlo da imigração muito mais apertada. Ao contrário dos EUA, do Canadá ou da Austrália faltam à UE critérios e processos de admissão claros.

A UE não facilita a entrada de trabalhadores com mais qualificações, perdendo muito cérebros para os EUA. Não tem um sistema como o dos EUA que atribui aleatoriamente o acesso a autorizações de residência a que qualquer pessoa que pretenda concorrer. Porém, abrir a porta legal de entrada só por si não acaba com a imigração ilegal, mas desincentiva-a, especialmente se penalizar as hipóteses de legalização futura.

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É importante que os países europeus abram mais a imigração legal para que a integração seja melhor sucedida, e para que tenham maior controlo sobre o número e o tipo de imigrantes que querem receber. É ainda fundamental se mantenham, paralelamente, os esforços conjuntos com os países vizinhos para um maior controlo das fronteiras externas da UE.

O equilíbrio no acesso é essencial para evitar o impacto e as reacções que suscita a entrada de um elevado número de imigrantes de forma desintegrada, abrigados muitas vezes em guetos, especialmente se estivermos a falar de economias com fraco crescimento. Foi este, em certa medida, o caso de Itália. A falta de resposta do anterior governo de esquerda foi uma das alavancas que ajudou Berlusconi a regressar ao poder. É de Berlusconi e de Sarkozy que hoje dependem as políticas de imigração de dois dos principais países europeus, e dos que mais problemas têm nesta matéria.

As soluções policiais que preconizam poderão ter algum efeito no curto prazo, ao incentivarem a que os imigrantes vão para outros países da UE. Mas em nada contribuem para resolver o problema da Europa albergar tanta gente ilegal no seu espaço, pessoas que não aproveita de forma produtiva e que não recebe de forma digna. Nem resolve o problema demográfico de longo prazo dos sistemas de segurança social italiano e francês, que aliás só um aumento da natalidade ou a imigração podem atenuar.

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É igualmente fundamental olhar para a imigração como parte integrante do apoio ao desenvolvimento. O efeito que os emigrantes albaneses ou marroquinos estão a ter na mudança dos respectivos países está a ser um factor importante de desenvolvimento e abertura política no espaço vizinho as fronteiras da UE, contribuindo para uma maior segurança e desenvolvimento no espaço do Mediterrâneo. Um equilíbrio que também convém preservar.

A imigração é talvez o problema mais sensível na Europa de hoje. No entanto, é um assunto que os líderes moderados têm fugido de discutir, deixando espaço para que os líderes radicais e populistas sejam os únicos a dar soluções. São normalmente respostas nada positivas e não devem ser as únicas em cima da mesa. Portugal, que tem sido um bom exemplo, quer como país de emigrantes, quer como país de acolhimento, deveria dar um maior contributo para esta discussão no espaço europeu.

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