Jorge Fonseca de Almeida 02 de Março de 2016 às 00:01

Tribos urbanas e marketing

Um dos fenómenos simultaneamente mais estranhos e mais fascinantes da época contemporânea é o ressurgimento do tribalismo, que renasce da fragmentação sucessiva dos grupos sociais que tem vindo a ocorrer nas sociedades mais modernas.

O saudoso João Pinto e Castro, o maior teórico e prático do marketing português da segunda metade do século XX, criador de agências, professor universitário, teorizador e experimentador, no seu excelente livro "Marketing Ombro a Ombro" mostra a importância das tribos, grupos de pessoas que se unem em torno de uma paixão partilhada, nas escolhas do consumidor moderno.

 

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De acordo com João Pinto e Castro, as tribos modernas "definem-se por um conjunto de crenças e valores partilhados, mas também por instituições, canais de comunicação, sinais de identidade e rituais".

 

Tribos como os góticos, uma subcultura que nasceu no final dos anos 1970 mas que ainda tem muitos adeptos entre os adolescentes atuais, os surfistas, ou mesmo os benfiquistas ferranhos, exibem padrões de consumo consistentes em muitas áreas. Assim é fácil imaginar que um gótico vista roupas de cor preta com design vitoriano, seja cliente de lojas de tatuagens e de "piercings", possua um crucifixo e goste de poesia e de um certo tipo de música, enquanto os surfistas prefiram outras marcas de roupa mais coloridas, frequentem bares de praia e tenham fatos de surf, enquanto os benfiquistas ferranhos serão clientes de cachecóis do clube, visitantes do estádio da Luz, compradores de certos jornais desportivos e potenciais aderentes a canais da TV Cabo que exibam jogos do Benfica.

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Muitas tribos desenvolvem um calão próprio, códigos e formas de comunicação não-verbais que escapam completamente aos que lhe não pertencem.

 

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Perceber as tribos é essencial para com elas comunicar, na sua linguagem, no seu estilo e nas categorias de produtos que preferem. Aéreo, bico de pato, bomba, "lip", mole, "quiver", pico, etc., são termos da cultura surfista que o leigo não entende, mas que são essenciais na comunicação entre membros desse grupo. Quem não os conhece como pretende falar com eles sobre o que lhes interessa?

 

As melhores marcas não se limitam a estudar e a comunicar bem com a sua tribo-alvo, elas próprias criam e desenvolvem a sua própria tribo.

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Veja-se o caso das motos Harley-Davidson, que comercializadas por uma empresa criada nos Estados Unidos em 1903, se transformaram num produto de culto que congrega à sua roda uma tribo numerosa.

 

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Esta tribo tem a sua própria organização, a H.O.G. (Harley Owners Grup – Grupo de Proprietários de Harleys), subdividida em mais de 1.400 clubes ou grupos locais ("chapters"). Cada clube local, patrocinado pelo representante local da Harley-Davidson, promove regularmente passeios e eventos que unem ainda mais os participantes. Assim se constrói uma forte identidade coletiva e um forte apego à marca.

 

As tribos vieram para ficar. É preciso, pois, no mínimo conhecê-las e de preferência criá-las. 

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Economista

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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