A emigração de Ericsson
Meus queridos leitores, a nossa ministra da Saúde, com pena dos portugueses e portuguesas que tiveram que demandar outros países para fazer um curso de medicina e ...
Meus queridos leitores, a nossa ministra da Saúde, com pena dos portugueses e portuguesas que tiveram que demandar outros países para fazer um curso de medicina e com os outros portugueses e portuguesas que por cá penam nas listas de espera do SNS por não haver médicos em quantidade suficiente (que os há em qualidade), lembrou-se de lhes querer, a eles, expatriados, dar a possibilidade de terminarem os seus estudos no País. Então não é que, perante tão nobre intenção, os ingratos não querem? Mesmo quando são discriminados como, por exemplo, o nosso compatriota John Thomson, que passou a vida na escola em Inglaterra a ser vítima de "bullying" às mãos dos colegas nativos?
Quanto mais penso nisto, mais me vem à memória Leif Ericsson. É que esse, tendo partido e descoberto a América, não ficou por lá, qual ingrato, e voltou. Aliás, aparentemente, uma nova verdade parece emergir da vida de Ericsson. Filho de Eric, o Vermelho, Leif entrou em confronto com o pai por ter deixado de treinar o Benfica, tendo então ido viver para a Noruega por volta do ano 1000, para a corte do rei Olaf Tryggvesson. Mas enjoou o bacalhau e foi obrigado de novo a partir, tendo então decidido regressar à Groenlândia com um padre, para converter a Groenlândia ao Cristianismo. Porém, e sem dúvida devido à má influência do padre, deixou o navio velejar "ao Deus dará", dizendo que sobre o seu (e da tripulação) futuro "que seja o que Deus quiser", expressão que chegou até aos nossos dias. Leif perdeu-se no mar, e foi assim que descobriu não o caminho de volta, mas a América, mais exactamente a Terra Nova. Porém, voltou à sua velha terra, passando o tempo na viagem a salvar náufragos, o que lhe valeu o cognome de "o sortudo". Isto torna-se interessante em contraste com estes nossos futuros médicos, que também partem ao acaso, também vão para terras novas, também querem passar a vida a salvar o próximo, mas voltar à terra natal nicles, e têm a mania de dizer que são azarados.
Pois é, meus queridos amigos, os tempos modernos são uma coisa surpreendente. Quando eu era novo, muitos eram forçados a partir em busca de melhor vida, para França, para a Alemanha, para Newark ou, mesmo sem serem ministros, para a Venezuela, e sonhavam reunir uns dinheirinhos para poderem fazer uma casa na terra e voltar, o que, aliás, explica a variedade de estilos, digamos, arquitectónicos, do nosso "countryside". Hoje em dia, a malta põe-se a mexer, na mira de conseguir ficar a viver nos países a que se dirige, e o pessoal quer é ter uma casa lá e não ter que voltar a pôr os pés na pátria, que lhes traz más recordações.
Mas há mais mudanças. Quando alguém queria vir viver para Portugal, o Estado exigia-lhe garantias – de que tinha uma profissão, de que encontraria emprego, de que tinha meios para subsistir até lá, etc. Agora os nossos estudantes dizem à nossa ministra que só voltam se tiverem garantias. Pelos vistos, ou temos uma geração de prémios Nobel em diáspora por esse Mundo, ou a mudança é mais global, e o que isto quer dizer é que viver para Portugal já não é tão atraente. E, pensando melhor, há coisas a mais a mudar cá na Santa terrinha. De há uns tempos para cá que o meu telefone não tem descanso com o meu gestor de conta a telefonar-me todos os dias a tentar impingir-me novos produtos financeiros. Eu já lhe disse mais de uma vez que não aceito sem ele me dar garantias de que não são nem estruturados, nem tóxicos. Ainda há bem pouco tempo era eu quem telefonava ao meu Banco e eram eles que me pediam a mim garantias…
Que nos diz isto a nós, meus caros leitores? Que isto não é com a ministra da Saúde, mas sim com a da Educação, que devia mandar fechar os cursos de Ciência Política e de Moeda e Bancos das nossas Escolas. Podia ser que os futuros políticos e banqueiros do País fossem estudar lá para fora. E não voltassem…
Frederico Bastião é Professor de Teoria Económica das Crises na Escola de Altos Estudos das Penhas Douradas. Quando perguntámos a Frederico o que acha dos estudantes de medicina portugueses que estão a estudar no estrangeiro não quererem regressar e terminar os seus estudos no País, Frederico respondeu: "É mais uma prova do que nos diz o Governo, que o País está de boa saúde!"
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