O potencial de crescimento que a China não explora
Enquanto a procura de curto prazo determina, em grande medida, a taxa de crescimento real de uma economia, a sua taxa de crescimento potencial é determinada pelo lado da oferta. Alguns economistas - citando indicadores como rácios de investimento, valor agregado industrial e emprego – comparam a China com o Japão do início dos anos 1970. Depois de mais de duas décadas de crescimento rápido e sustentável, a economia do Japão caiu consideravelmente em 1971, ano que marcou o início de quatro décadas de taxas de crescimento anual de menos de 4%.
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Esta correlação é reforçada pela hipótese de convergência - a teoria de referência para estimar a taxa de crescimento potencial de uma economia - que afirma que a taxa de crescimento real de uma economia em desenvolvimento com rápidos progressos abranda quando se alcança uma uma determinada proporção do capital social e rendimento per capita de uma economia avançada. De acordo com os economistas Barry Eichengreen, Donghyun Park, e Kwanho Shin, essa percentagem é de cerca de 60% ??do rendimento per capita dos Estados Unidos (aos preços internacionais de 2005).
À primeira vista, as experiências das economias asiáticas mais avançadas - Japão e os quatro "tigres asiáticos" (Hong Kong , Singapura, Coreia do Sul e Taiwan) - parecem ser consistentes com esta teoria. Em 1971-1973, o PIB per capita do Japão caiu para cerca de 65% do PIB per capita dos Estados Unidos em termos de paridade do poder de compra, enquanto que os tigres asiáticos experimentaram diversos graus de desaceleração económica quando alcançaram aproximadamente o mesmo nível de rendimentos em relação ao Japão.
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Mas Eichengreen, Park e Shin também descobriram que, uma vez que este nível de rendimento é atingido, as taxas anuais de crescimento tendem a cair para não mais de dois pontos percentuais. Isto significa que o crescimento do PIB deveria ter desacelerado gradualmente no Japão depois de 1971, em vez de cair a pique mais de 50%. Da mesma forma, dada a diferença de rendimento em relação aos Estados Unidos, os Tigres Asiáticos deveriam ter crescido mais rapidamente do do que cresceram nas últimas duas décadas. Mas todos eles sofreram uma desaceleração substancial (embora menos acentuada do que a do Japão).
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Essas inconsistências podem ser explicadas por choques externos - um ponto enfatizado por Hideo Kobayashi no seu livro Post-War Japanese Economy and Southeast Asia (A economia japonesa do pós-guerra e o sudeste asiático). Durante o ‘boom’ económico do Japão, a sua produtividade total dos factores (PTF) contribuiu para cerca de 40% do crescimento do PIB. Quando o crescimento caiu a pique, a PTF caiu ainda mais rápido - uma mudança dramática que esteve claramente ligada à valorização do iene em 1971 e à crise do petróleo em 1973.
Do ponto de vista microeconómico, um choque cambial súbito e um forte aumento dos preços do petróleo colocam obstáculos à capacidade das empresas para ajustar as suas tecnologias e métodos de produção para atender às novas condições de custos, prejudicando, eventualmente, o crescimento da PTF. Esse choque de custos tem um efeito mais prolongado do que um choque negativo da procura. Sem choques externos negativos, o crescimento exorbitante da PTF teria diminuído gradualmente, à medida que os retornos dos ajustamentos institucionais, realocação de recursos, e ajustamentos tecnológicos diminuíssem naturalmente, de acordo com a hipótese da convergência.
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Os choques externos também explicam a desaceleração do PIB da China desde 2007. A gradual mas sustentada valorização do renminbi face ao dólar dos Estados Unidos é a principal impulsionadora do choque de custos, mas o choque da procura que se seguiu à crise financeira global de 2008 agravou a situação. É provável que a PTF tenha diminuído substancialmente com a desaceleração da economia chinesa em respostas a esses choques.
Ao contrário dos keynesianos, que se centram nos choques da procura, os seguidores do economista austríaco Joseph Schumpeter consideram que os choques de custos são importantes catalisadores para a reforma estrutural e modernização industrial – ambas necessárias para evitar uma rotina de baixo crescimento no longo prazo. No curto prazo, um choque de custos devasta algumas actividades económicas, obrigando as empresas a fechar portas ou a mudar para outro ramo de negócio. Mas o que Schumpeter chamou de "destruição criativa" pode facilitar o eventual surgimento e expansão de empresas novas e mais eficientes.
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O problema é que muitos factores específicos de cada país, tais como questões políticas e a pressão dos grupos de interesses, podem impedir este processo. Neste sentido, o governo da China enfrenta um teste importante. Se não conseguir aproveitar a oportunidade proporcionada pelo choque de custos e pela desaceleração económica para implementar as reformas estruturais necessárias, a taxa de crescimento potencial da China, como indica a PTF, nunca vai recuperar totalmente.
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Tendo em conta que a melhoria da produtividade geral é a melhor maneira é a melhor defesa contra choques de custos, a nova ronda de reformas estruturais deve ser destinada a criar condições para a transformação e melhoria da economia. A chave é estabelecer igualdade de condições com base nas regras de mercado, reduzir a intervenção do governo na economia, e parar de proteger as empresas ineficientes. Esses esforços teriam um impacto importante no aumento da taxa de crescimento potencial da China.
De facto, considerando-se que o rendimento per capita da China é de 10 a 20% do rendimento per capita dos Estados Unidos (com enormes diferenças regionais dentro da China) o seu potencial de crescimento, segundo indica a hipótese da convergência, está longe de ser aproveitado. Mas o grau em que ele poderá ser cumprido nas próximas décadas vai depender muito das perspectivas da sua PTF.
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Em 2007, os economistas Dwight Perkins e Thomas Rawski estimaram que, para que a economia da China mantivesse uma taxa de crescimento de 9% e uma taxa de investimento de 25-35% até 2025, seria necessário manter uma taxa de crescimento anual da PTF de 4,3 a 4,8%. Uma vez que o crescimento médio da PTF da China tem sido de 4% durante mais de 30 anos, e com possibilidade de diminuir na próxima década, esse cenário é improvável.
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Manter um crescimento anual do PIB de 6% com a mesma taxa de investimento exigiria um crescimento anual da PTF de apenas 2,2-2,7%. Com a produtividade da China ainda num nível bem inferior ao dos países desenvolvidos, e a probabilidade de melhorias na sua eficiência nos próximos dez anos, uma taxa de crescimento da PTF de 3% é viável. Com a ajuda das reformas estruturais, a economia da China pode crescer ainda mais rapidamente, atingindo um crescimento anual de 7 a 8% nos próximos dez anos. De qualquer forma, a convergência continuará a ser rápida.
Zhang Jun é professor de Economia e director do Centro de Estudos Económicos da China na Universidade Fudan, de Xangai.
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Copyright: Project Syndicate, 2013.
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Tradução de Rita Faria
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