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Helena Garrido - Directora do Jornal de Negócios Helenagarrido@negocios.pt
28 de Março de 2012 às 23:30

Mostrar a dívida para limpar a dívida

O Governo vai debater, hoje, uma rectificação ao Orçamento do Estado deste ano. Não há memória de um Orçamento Rectificativo, logo no início do ano, em tempo de estabilidade política.

O Governo vai debater, hoje, uma rectificação ao Orçamento do Estado deste ano. Não há memória de um Orçamento Rectificativo, logo no início do ano, em tempo de estabilidade política. Mas eis que aí está ele, três meses depois de ter nascido, ultrapassando largamente os objectivos iniciais anunciados. Mas mantendo o objectivo do défice público, na linha da disciplina orçamental que parece estar a dar os seus primeiros frutos com a queda das taxas de juro internacionais.

As medidas de combate à fraude e evasão fiscal e as que tornam um pouco menos injusta a situação de quem trabalha a recibos verdes são as medidas que se podem eleger como os pontos altos deste Orçamento Rectificativo que hoje vai estar na mesa do Conselho de Ministros. O ponto baixo é o que esperávamos: a cobertura dos buracos financeiros que se foram descobrindo ou que se criaram para tapar outros buracos. E, pela negativa, surge, também, a cedência aos militares.

A originalidade deste Orçamento começa com o anúncio da sua rectificação ainda o original não estava em vigor. Foram basicamente três as razões avançadas pelo ministro das Finanças para rectificar o primeiro Orçamento da sua autoria: a necessidade de contabilizar as despesas com as pensões dos bancários cujos fundos foram transferidos para o Estado, o caso da despesa escondida da Madeira e a transferência de verbas para o novo mecanismo europeu para apoiar países em dificuldades. Juntemos a isto o que não foi dito, como as dívidas que é preciso pagar na saúde e em algumas empresas públicas e temos, com a Madeira, a principal razão para uma enorme rectificação ao Orçamento: pagar dívidas em atraso. Ou, em "linguagem de cavador", como diria o ex-ministro das Finanças António Sousa Franco, para tapar "buracos".

Quando se olha para os grandes números do Orçamento, o que se vê também nunca se viu. As rubricas com aumentos mais significativos dizem respeito a responsabilidades que são assumidas pelas administrações públicas no seu conjunto, ou seja, "buracos" que estão a ser tapados. Na saúde, na Parque Escolar, nas Estradas de Portugal, nas empresas criadas para ficarem com os activos - que esperemos não sejam apenas responsabilidades - do BPN.

Nas pequenas medidas vale a pena sublinhar a sensibilidade revelada pela Segurança Social com quem trabalha no regime de prestação de serviços. Quem passa recibos verdes poderá ajustar as suas contribuições ao que recebe, uma medida que é especialmente importante numa altura de redução da actividade económica.

No outro extremo, pela negativa, está a cedência aos militares. Na função pública ninguém pode ser promovido este ano e 2012 não é contabilizado para as promoções futuras. Os militares podem ser promovidos este ano e poderão contabilizar o ano de 2012 para as promoções futuras. Uma dupla excepção à regra geral que é difícil de compreender num tempo em que ninguém escapa à austeridade.

O Orçamento Rectificativo vale, no seu conjunto, pela imagem de caos que revela sobre as finanças públicas. Neste momento, apenas podemos desejar que esse caos já tenha sido captado na sua totalidade para que se possa finalmente controlar o "monstro", como uma vez foi baptizado pelo actual Presidente da República. O trabalho da disciplina orçamental começa pela limpeza geral da indisciplina orçamental. O ano de 2013 pode ser o primeiro de uma nova era que rompa de vez com o destino histórico de indisciplina nas finanças públicas. Se este desejo for cumprido, valeu a pena a entrada da troika no país, valeram a pena os cortes nos salários e os aumentos dos impostos. Só depende de nós.

helenagarrido@negocios.pt

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