O mercado português de formação de executivos já não é um nicho reservado às grandes empresas e às elites empresariais. Tem vindo a diversificar-se, aproximando-se das necessidades concretas das PME, que representam a esmagadora maioria do tecido empresarial. Como refere Carla Branco Santos, vogal do Conselho Diretivo do IAPMEI, “o mercado tem vindo a consolidar-se com uma oferta cada vez mais diversificada e ajustada. Do lado da procura, observa-se maior interesse por programas de curta duração, desenhados à medida das necessidades das PME e focados em competências de gestão, digitalização e transição climática”.
Contudo, o caminho está longe de concluído. Rafael Alves Rocha, diretor-geral da CIP - Confederação Empresarial de Portugal, aponta que o principal desafio é cultural, que será o mesmo que dizer estrutural: “A educação ao longo da vida ainda não é encarada como um ativo estratégico, quer pelas empresas portuguesas, quer pelos próprios trabalhadores.” A verdade é que a perceção da formação como um custo e não como um investimento continua, em alguns casos, a ser um bloqueio que afeta a competitividade nacional.
Os desafios não se esgotam na cultura organizacional. A velocidade das transformações digitais e geopolíticas está a impor novas exigências aos líderes. Inteligência artificial, cibersegurança, automação e modelos de negócio digitais são hoje temas incontornáveis. Paralelamente, os princípios ESG estão a ganhar peso nas agendas de formação, não apenas como obrigação de reporte, mas como fator de sustentabilidade das próprias empresas.
Nas palavras de Rafael Alves Rocha, “a escassez de talento qualificado, agravada quer pela demografia, quer pela emigração de jovens, continua a manifestar-se como um desafio estrutural”.
As respostas das escolas de negócios
As principais escolas portuguesas de gestão também reconhecem que o futuro da formação executiva exige visão estratégica. João Pinto, dean da Católica Porto Business School, identifica quatro frentes críticas: “Atualização contínua dos conteúdos face à aceleração tecnológica, incorporação transversal de ética e sustentabilidade nas decisões de negócio, maior flexibilidade de formatos para executivos e reforço da ligação empresa-academia para garantir impacto imediato.”
Na mesma linha, Joana Santos Silva, CEO do ISEG Executive Education, alerta que “o maior desafio será antecipar competências para um mundo em aceleração exponencial”. Para a responsável, o futuro da formação não será apenas técnico, mas centrado na capacidade de liderar em contextos de incerteza, com pensamento crítico e visão estratégica.
Também a AESE Business School reforça a ideia de que o processo formativo deve ultrapassar os limites técnicos. Para Pedro Nuno Ferreira, professor e chief marketing & sales officer da AESE Business School, “a formação de executivos terá de ir muito além do domínio técnico, promovendo uma transformação pessoal e profissional, em que a ética, o sentido humanista e a consistência das decisões sejam marcas distintivas”.
José Crespo de Carvalho, presidente do Iscte Executive Education, afirma que “os desafios para a formação executiva em Portugal num futuro próximo serão principalmente ligados à adaptação às transformações presentes: velocidade das mudanças tecnológicas, transições energética e digital, e novas exigências do mercado de trabalho que requerem que a educação executiva acompanhe de perto essas dinâmicas”. “Além disso, a formação tem de ser cada vez mais personalizada”, acrescenta.
Oportunidades para democratizar a aprendizagem
Apesar da qualidade reconhecida dos programas, nem sempre a sua abrangência é suficiente. O próprio diretor-geral da CIP identifica um paradoxo: “Temos bons programas, mas os beneficiários são quase sempre os mesmos executivos, as mesmas empresas, as mesmas organizações.” O verdadeiro desafio é democratizar o acesso, aproximando a formação das PME e expandindo a cultura de aprendizagem contínua.
Do lado do IAPMEI, Carla Branco Santos destaca a necessidade de reforçar metodologias práticas, de ligar a formação a processos de transformação organizacional e de alargar a oferta a todo o território nacional. “É essencial reforçar as redes locais para que as PME de todo o país tenham acesso equitativo a oportunidades de capacitação”, sublinha.
Para os responsáveis, um dos temas ainda pouco trabalhados é a medição do impacto da formação executiva. O IAPMEI defende que é necessária uma avaliação sistemática dos resultados, nomeadamente em termos de produtividade, inovação e crescimento. A evidência já existente indica benefícios claros. “Estudos internacionais e a experiência dos nossos programas indicam que existe uma relação positiva entre as qualificações avançadas e um melhor desempenho organizacional, empregabilidade e progressão de carreira”, afirma Carla Branco Santos.
O desafio maior será, como defendem os vários especialistas, transformar a formação num investimento estratégico, acessível e alinhado com os desafios concretos das empresas portuguesas.