As linhas com que se cose o imposto global único que os Estados discutem
Os contornos finais da nova taxa global única que está sobre a mesa estão ainda por definir. A começar pelo valor da taxa, que pode ser um dos fatores mais difíceis de consensualizar. E, pelo menos na Europa, sem consenso entre países, a ideia não tem pernas para andar.
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Como funcionará a taxa mínima global? A ideia é que a taxa mínima se aplique aos lucros das empresas no exterior, o que significaria que os governos continuariam a poder definir impostos locais às taxas que bem entendessem. A lógica seria sempre a de que, se as empresas pagarem taxas mais baixas num determinado país, então os governos dos seus países de origem poderiam fazer subir as respetivas taxas para a tal taxa mínima acordada. Dessa forma seriam eliminadas quaisquer vantagens da transferência de lucros para paraísos fiscais. Qual seria o valor da taxa mínima? Se é certo que começa a haver algum consenso entre os Estados sobre a criação da taxa mínima global, já no que toca à definição de um valor, a questão é bem mais complicada. Esse é um dos principais pontos cuja negociação se encontra em aberto na proposta em discussão na OCDE/G20, sendo que a base de partida era uma taxa de 12,5%, que coincide com a taxa de IRC praticada na Irlanda, um dos países mais reticentes. Os EUA avançaram com uma proposta que aponta para os 21%, que é mais ou menos a taxa efetiva de IRC praticada em Portugal, apesar de a taxa nominal, contando com as derramas, poder ultrapassar os 30%. Que empresas e setores seriam afetados? A proposta da OCDE tem como alvos essencialmente as grandes tecnológicas, que, claro, nunca são nomeadas, mas estão mais que identificadas num grupo que inclui nomes como a Google, Facebook ou Apple, entre outras. A proposta dos EUA não distingue entre setores, mas, em ambos os casos, só grandes empresas seriam afetadas. O plano Biden abrangeria as 100 maiores multinacionais do mundo e o plano original da OCDE tem como alvos também apenas os gigantes, mas esse é outro ponto ainda em aberto. Por outro lado, há muitos aspetos em dúvida e a serem negociados, por exemplo, o que fazer com os fundos de investimento, incluindo os fundos de investimento imobiliário, se devem ou não ser incluídos. Quem ganha e quem perde? Os países que apostam muito nas políticas fiscais para atrair investimento estrangeiro têm muito a perder com a criação de uma taxa global única, na medida em que perdem competitividade fiscal. Sobretudo se o valor que vier a ser definido for elevado. A OCDE tem vindo a trabalhar com uma base de 12,5%, mas os Estados Unidos deram o salto para os 21%, que fica abaixo da média mundial, que ronda os 24%, mas acima da média europeia, que ronda os 20%. A Irlanda, por exemplo, tem 12,5% e políticas fiscais muito agressivas, conseguindo atrair grandes multinacionais. Outros países vão ainda mais longe, como a Hungria, onde o IRC é de 9%. Todos esses perderiam competitividade fiscal. Já os países de origem das grandes empresas - com os EUA à cabeça - sairiam a ganhar, na medida em que poderiam impor a tal diferença de imposto entre o que as empresas efetivamente pagassem e a nova taxa mínima.
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