Itália procura solução: governo técnico liderado por Draghi é hipótese

A crise na maioria de governo acabou em definitivo com a aliança Liga-5 Estrelas. Agora baralham-se as possibilidades, de eleições antecipadas no imediato a um novo governo institucional de compromisso. Mario Draghi como primeiro-ministro é uma das hipóteses em cima da mesa.
Mario Draghi
Reuters
David Santiago 12 de Agosto de 2019 às 10:50

Matteo Salvini (Liga) quer eleições o quanto antes para capitalizar a liderança destacada nas sondagens, mas o presidente de Itália, Sergio Mattarella, dá prioridade à formação de um governo alternativo e de perfil técnico.

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Mattarella quer evitar uma Itália de Salvini, ou seja, pretende impedir o predomínio parlamentar da Liga num cenário de eleições antecipadas, o que deixaria o partido da extrema-direita soberanista em condições de determinar o nome do próximo presidente da República transalpina, cuja eleição, que é feita no parlamento, tem lugar em janeiro de 2022.

O diário italiano La Stampa avança esta segunda-feira, 12 de agosto, que Mattarella tem quatro cenários em mente com vista à formação de um executivo tecnocrata, embora cada um dos quais com objetivos diversos.

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A primeira possibilidade realçada pelo La Stampa diz respeito a um governo de "garantia eleitoral", que pudesse assumir funções até à realização de novas eleições, a decorrerem o mais rápido possível, mas dificilmente antes de novembro, desde logo porque Mattarella quer, a todo o custo, evitar perturbações no processo de discussão, aprovação e envio para Bruxelas do orçamento transalpino para 2020.

Para este cenário surgem vários nomes possíveis. Os de Valerio Onida e Giovanni Maria Flick, ex-presidentes do Tribunal Constitucional, ou ainda os do primeiro-ministro, Giuseppe Conte, ou do ministro das Finanças, Giovanni Tria, sendo que caberia sempre a este assegurar a feitura do orçamento, inclusive perante a possibilidade de demora na formação de um governo resultante das eleições.

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Uma segunda hipótese passaria pela formação de um executivo de "trégua" destinado a garantir a governação até fevereiro ou março, impedindo a contaminação eleitoral do orçamento. Neste caso, é o professor Carlo Cottarelli que surge como hipotético primeiro-ministro, isto depois de há um ano ter sido considerado por Mattarella para um governo tecnocrata, antes de se concretizar a aliança entre a Liga (extrema-direita) e o Movimento 5 Estrelas (anti-sistema).  

Em terceiro lugar surge a ideia de um "governo institucional", o qual seria mais duradouro pois deveria governar até maio de 2020 de forma a ter o tempo necessário à aprovação de uma série de leis ou reformas relevantes. Em causa está a aprovação do orçamento, a redução de parlamentares (processo que exige um referendo) e correção da lei eleitoral em vigor (passando esta a um sistema eleitoral proporcional).

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A presidente do Senado (câmara alta), Elisabetta Casellati (Força Itália, centro-direita), ou o presidente da Câmara dos Deputados (câmara abaixa), Roberto Fico (5 Estrelas) são os nomes considerados para esta solução.

A quarta e última opção configura mais uma solução política do que propriamente meramente tecnocrata e é a menos falada porque pressuporia assegurar a legislatura até ao término previsto para 2022.

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Este seria o único cenário que permitiria ao atual parlamento eleger o próximo presidente da República, como tal é a preferida de Mattarella que pretende impedir Salvini de, com uma maioria parlamentar ou próximo dela, determinar o seu sucessor.

E aqui seria o peso inerente ao nome que poderia atribuir uma margem política mínima de aceitação: Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu e cujo mandato termina em novembro.

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Antes, porém, de que qualquer um destes cenários possa ganhar forma, é preciso concluir a primeira etapa da crise em curso. Dada a recusa do primeiro-ministro Conte em se demitir, a Liga do vice-primeiro-ministro Salvini anunciou que vai avançar com uma moção de confiança para o derrubar.

Os líderes parlamentares reúnem esta segunda-feira para definir as datas da discussão e votação da censura ao primeiro-ministro. Salvini quer interromper já as férias parlamentares e fazer a votação ainda esta semana, mas é improvável que esta seja realizada antes da próxima semana.

Alianças em perspetiva

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Salvini quer chefiar um governo da Liga e, nesse sentido, pede "plenos poderes" aos italianos para executar o programa do partido anti-imigração. O líder da Liga já revelou que quer formar um "bloco do ‘sim’", incluindo o Força Itália (centro-direita) de Silvio Berlusconi e o Irmãos de Itália (extrema-direita) de Giorgia Meloni.

Estes são os partidos da coligação de direitas que concorreu, em conjunto, às eleições gerais de março do ano passado. As sondagens indicam que, junto, Salvini e Meloni poderiam alcançar a maioria absoluta.

Em paralelo, o Movimento 5 Estrelas, que venceu as eleições de 2018, segundo indicam as sondagens, perdeu metade dos votos e surge em terceiro, atrás de um dilacerado PD (centro-esquerda).

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É que o ex-líder e ex-primeiro-ministro, Matteo Renzi, planeia abandonar o partido e prepara-se para criar a Ação Civil, que começará desde já por ser constituída enquanto grupo parlamentar para depois ser, formalmente, uma força partidária em condições de concorrer às próximas eleições.

Quanto a Luigi Di Maio, líder do 5 Estrelas e vice-primeiro-ministro, dá prioridade à votação final de uma reforma constitucional que corta boa parte do atual número de parlamentares.

Desta forma, Di Maio conseguiria também ganhar tempo e dar seguimento à estratégia também defendida pelo movimento populista, Beppe Grillo, que quer "salvar Itália dos bárbaros" impedindo que Salvini tenha uma vitória retumbante se as eleições decorrem no curto prazo.

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Para acelerar o regresso às urnas, avança o Il Messaggero, Salvini pondera retirar-se e si e aos restantes ministros do governo de aliança ainda chefiado por Conte.

No entanto, dificilmente poderia haver eleições antes do final de outubro, altura que faria coincidir a campanha eleitoral com todo o processo, interno e europeu, de aprovação do próximo orçamento. Nesta fase a grande preocupação de Mattarella é precisamente criar (ou manter) condições mínimas para a aprovação das contas do próximo ano, para que o país não fique limitado a um orçamento provisório nem que seja aberta nova via de confronto com a Comissão Europeia.

Depois de terem disparado para máximos de cinco semanas como consequência de duas sessões de fortes subidas, os juros da dívida de Itália a 10 anos recuam esta segunda-feira, alívio decorrente da decisão da Fitch, que, na sexta-feira, optou por não baixar o "rating" atribuído à dívida trasalpina.

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