Eleições em Itália: Regresso ao passado ou a escolha dos mercados?
As eleições em Itália vão ter lugar já nos dias 24 e 25 de Fevereiro. A escolha vai ter de ser feita entre o passado e o futuro. Sílvio Berlusconi, depois de ter ocupado o cargo de primeiro-ministro três vezes, quer regressar ao poder. Pier Luigi Bersani pode ter de se aliar a Mario Monti de forma a chegar ao Governo e manter a Itália sob uma perspectiva positiva dos mercados.
A Itália vai a eleições pouco mais de um ano depois de Mario Monti ter assumido a chefia do Governo. O principal “medo” dos investidores é que Sílvio Berlusconi, de centro direita, regresse ao poder depois de ter sido forçado a abandoná-lo. Há cerca de um ano, a frágil situação da Europa e da economia de Itália forçou a saída de Berlusconi e a nomeação de um tecnocrata para a chefia de Governo, sem que os italianos fossem chamados às urnas para eleger um novo primeiro-ministro.
No início de Janeiro de 2013, os títulos da dívida pública italiana a 10 anos situavam-se nos 4,276%. Mas no passado dia 8 de Fevereiro atingiram o nível mais elevado desde o início do ano, situando-se nos 4,553%. O Royal Bank of Scotland chegou mesmo a recomendar aos investidores que vendessem as obrigações italianas, antes das eleições. A justificação é precisamente a subida de Silvio Berlusconi nas sondagens. O banco de investimento estima que um regresso de Berlusconi à liderança de Itália pode fazer disparar a taxa de juro para os 7%.
As sondagens indicam que Pier Luigi Bersani, candidato da coligação de centro esquerda, deverá vencer o
sufrágio. Apesar de Sílvio Berlusconi ter vindo, nas últimas semanas, a ganhar terreno nas intenções de voto. De acordo com Renato Mannheimer, um especialista em sondagens de Itália, citado pela Bloomberg, Berlusconi não deverá ter votos suficientes para obter a vitória nas eleições.
Mas a questão que se coloca é: será Pier Luigi Bersani capaz, sozinho, de formar governo? Mannheimer, tal como outros analistas citados pela imprensa internacional, aponta que Bersani pode não obter votos suficientes no Senado para poder formar Governo. Ainda que admita que a coligação de esquerda deva conseguir a maioria na Câmara dos Deputados. Se este cenário se confirmar, Bersani poderá formar uma aliança pós-eleitoral com a coligação liderada por Mario Monti.
Eleições serão um referendo à austeridade?
Na semana passada, a BloombergBusinessWeek escrevia que as eleições dos dias 24 e 25 vão ser um referendo à austeridade. Durante os 14 meses em que Itália esteve sob liderança de Monti, os investidores aumentaram a confiança no país. Para obter esse efeito, o governante aplicou cortes na despesa do Estado e aumentou impostos, no sentido de mostrar aos mercados que a Itália queria pôr em ordem as suas contas públicas.
Mas, durante a campanha eleitoral, Sílvio Berlusconi tem feito um discurso anti-austeridade. Numa conferência de imprensa, no último dia 3 de Fevereiro, o antigo primeiro-ministro prometeu reembolsar os cidadãos do valor que foi pago no imposto sobre propriedades. Além disto, escreve a publicação norte-americana, Berlusconi prometeu amnistiar os cidadãos que têm impostos em atraso.
Os principais candidatos
São quatro os protagonistas das eleições em Itália. Duas coligações, uma aliança e um movimento.
A segunda coligação – a coligação centrista - que vai a eleições é composta por mais elementos que a anterior. Esta coligação é liderada por Mario Monti e integra o seu próprio movimento cívico, a Democracia Cristã (Democrazia Cristiana, em italiano) e o Movimento Futuro e Liberdade para a Itália. Uma coligação pós-eleitoral entre estes movimentos e a força de centro esquerda (liderada por Pier Luigi Bersani) é uma das possibilidades mais fortes após as eleições. Ainda assim, esta sexta-feira, Mario Monti não descartou a possibilidade de vir a formar uma coligação com a aliança de centro direita, encabeçada por Sílvio Berlusconi.
A aliança liderada pelo ex-primeiro ministro é formada pelo próprio partido de Berlusconi, o Partido Povo da Liberdade (Il Popolo Della Liberta) e pela Liga do Norte. E por fim, o Movimento Cinco Estrelas (Movimento 5 Stelle), liderado pelo comediante Beppe Grillo. Este movimento é, sobretudo, um movimento anti-austeridade.
Como é que eleito o primeiro-ministro em Itália?
O sistema de eleições italiano é diferente do português. Os eleitores votam para duas câmaras parlamentares: a Câmara dos Deputados e o Senado. A Câmara dos Deputados – a câmara baixa – é composta por 630 membros. E o Senado – a câmara alta – é composto por 315 membros eleitos e quatro senadores vitalícios. A BBC escreve que os membros destas duas câmaras são eleitos por um período de cinco anos.
O sistema eleitoral italiano é baseado na representação proporcional. Os partidos são encorajados a formar coligações.
O poder das duas câmaras é praticamente idêntico, explica ainda a estação britânica. Isto porque qualquer lei – excepto o Orçamento do Estado – pode começar a ser discutida em qualquer uma das câmaras e tem de ser aprovada pelas duas. Além disso, é necessária a autorização destas duas câmaras para que o Executivo possa governar, uma vez que as medidas a implementar têm de ser aprovadas nas duas instituições parlamentares.
No caso da eleição da Câmara dos Deputados, o país é divido em 26 distritos, sendo que para as eleições para o Senado, existem 20 regiões. Assim, cada distrito tem um número de lugares na Câmara dos Deputados proporcional à sua população. No caso do Senado, a maioria vencedora é determinada região a região. Por isso, a coligação ou partido que vença numa região fica com 55% dos lugares atribuídos no Senado a essa mesma região.
Efeitos da renúncia do Papa
Na última segunda-feira, dia 11, o Papa Bento XVI anunciou que ia abdicar do cargo mais elevado da Igreja Católica Romana. Bento XVI abdica no próximo dia 28 e as eleições italianas têm lugar na mesma semana.
Blogues de órgãos de informação avançam que Sílvio Berlusconi pode ser prejudicado por isto. O blog World News NBC escreve que a renúncia do Papa “é um movimento de magnitude mundial” mas vai ter uma magnitude ainda maior “em Itália, onde alguns especialistas acreditam que a cobertura generalizada” do processo de renúncia de Bento XVI “pode impedir o regresso político de Sílvio Berlusconi”.
O ex-primeiro-ministro tem desenvolvido uma parte da sua campanha nos órgãos de comunicação social, passando muito tempo em antena.
“Italianos deviam dizer a Berlusconi que ele não é bem-vindo”
O Financial Times (FT) mostra-se claramente contra uma nova vitória de Berlusconi. “Um novo mandato de Berlusconi seria um desastre para a Itália”, defende o editoral do FT, do passado dia 10 de Fevereiro.
Para esta publicação, um eventual quarto mandato serviria para o ex-primeiro-ministro “ignorar as suas promessas eleitorais” de cortes no Estado de forma a aliviar a carga fiscal e “concentrar-se em resolver os seus problemas judiciais”. “Entretanto, os investidores ficariam muito mais cautelosos” em comprar “dívida pública de Itália, o que ameaçaria a sustentabilidade orçamental” do país.
Por isso, defende o FT, que “quando os italianos forem às urnas (…) eles deviam enviar uma mensagem clara a Berlusconi de que ele não é bem-vindo”. “Para ultrapassar a crise económica, Roma precisa de líderes credíveis, não do regresso a um passado desacreditado”, defende a publicação no fim do editorial.
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