Banco de Portugal mantém previsões de défices a partir do próximo ano

O BdP não vê excedente em 2025, mas admite espaço na gestão orçamental para virar o resultado. Para 2026, prevê défice de 0,4% do PIB e vê no médio prazo agravamento de 1,5 pontos face a último excedente de Costa. Portugal fura regras de Bruxelas já em 2025, mas governador confia na disciplina orçamental do Governo.
BdP mantém projeções que apontam para uma deterioração forte do saldo naquele que é o primeiro Boletim Económico já com Álvaro Santos Pereira como governador.
Mariline Alves
Maria Caetano 11:00

O Banco de Portugal (BdP) não antecipa qualquer excedente público neste ano e continua a apontar para uma trajetória de saldo orçamental em degradação acentuada, com a perspetiva de um défice de 0,4% do PIB em 2026 e agravamento para 1% do PIB até 2028.

A instituição reviu em baixa as previsões de défice feitas em junho, ainda sob a liderança de Mário Centeno, mas mantém as projeções que apontam para uma deterioração forte do saldo até 2028 naquele que é o primeiro Boletim Económico já com Álvaro Santos Pereira como governador.

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Além do saldo nulo de 2025 e dos 0,4% do PIB de défice de 2026, o Boletim Económico aponta para um défice de 0,9% do PIB em 2027 e de 1% do PIB em 2028, assumindo as medidas adotadas até aqui e os pressupostos do Governo no Orçamento do Estado para 2026 (OE 2026).

No que diz respeito à previsão de saldo nulo neste ano, o governador do BdP não exclui no entanto a possibilidade de um pequeno excedente, notando na apresentação do documento que as previsões da instituição não têm conta eventuais medidas adotadas no final do ano que não estejam legisladas ou definidas em detalhe pelo Governo. “Se houver esse tipo de medidas, pode levar a um excedente”, fez notar Álvaro Santos Pereira. Poderá ser o caso da subida do ISP no final de novembro, que no entanto deverá ter neste ano um impacto reduzida.

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De resto, o governador lembrou que “pode haver medidas adicionais para não haver défice”, incluindo através de cortes na despesa. O crescimento económico também poderá ser maior do que o esperado, exemplificou.

Se compararmos Portugal com o resto da Europa, Portugal está em situação muito mais saudável. 
Álvaro Santos Pereira, governador do Banco de Portugal

Santos Pereira quis colocar também os maus resultados orçamentais previstos no contexto europeu, sendo esperado que metade dos países da Zona Euro estejam no próximo ano em situação de défice excessivo. “Se compararmos Portugal com o resto da Europa, Portugal está em situação muito mais saudável”, defendeu.

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Comparando com o excedente máximo de 1,3% do PIB de 2023, o último alcançado na governação de António Costa, o Boletim Económico, apresentado nesta sexta-feira, projeta uma degradação equivalente a 1,5% do PIB no horizonte de médio prazo. Em partes iguais, contribuirão a subida da despesa primária e o aumento do investimento com os principais contributos, e em menor medida uma descida da carga fiscal e contributiva e noutras receitas, segundo a publicação.

A diminuição projetada para o saldo orçamental é expressiva. 
Boletim Económico do Banco de Portugal

“A diminuição projetada para o saldo orçamental é expressiva”, refere o boletim. E a degradação é ainda mais notória quando se exclui o efeito de medidas temporárias. “Tomando como ponto de partida o excedente máximo registado em 2023, que se situou em 1,7% do PIB excluindo medidas temporárias, as previsões atuais apontam para uma deterioração acumulada de 2,7 pontos percentuais do PIB até 2028. No horizonte de projeção, entre 2024 e 2028, a deterioração ascende a 1,5 pontos percentuais”, indica.

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No que diz respeito à evolução da carga fiscal, o BdP vê bastante mitigado o impacto das medidas de redução fiscal adotadas pelo Governo de Luís Montenegro até aqui. Aponta para uma descida da carga fiscal e contributiva em apenas 0,3% do PIB até 2028 e explica: se as decidas nas taxas de IRS e IRC já adotadas e programadas permitiriam uma diminuição de 0,8% do PIB. Mas esta é largamente anulada pelo facto de o corte de retenções na fonte em IRS ter sido em grande medida compensado por uma diminuição de reembolsos, com as liquidações efetivas de imposto a representarem menores reduções fiscais para os contribuinte. 

“Adicionalmente, tem-se observado um crescimento robusto das bases macroeconómicas, em particular da massa salarial e do consumo privado, o que tem sustentado um desempenho favorável da receita fiscal. Este efeito permanece ao longo do horizonte de projeção, embora com intensidade decrescente”, antecipa o BdP. Em particular, o boletim destaca o aumento da arrecadação de IVA e de contribuições sociais.

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Nas previsões de saldo do BdP atuais, comparando com as de há seis meses, a melhoria projetada no saldo também reflete o alívio no saldo de montante significativos de empréstimos do Plano de Recuperação e Resiliência com a passagem destes valores para um instrumento financeiro novo no Banco Português de Fomento. Caso assim não fosse, as projeções apontariam a um défice de 0,2% do PIB em 2025 e de 0,9% do PIB em 2026, mostram os cálculos do BdP.

Apesar disso, naquele que é o grande indicador sob vigilância no quadro das regras orçamentais, a despesa primária líquida, o Boletim Económico vê o Governo a furar em todos os anos os tetos de crescimento de gastos fixados para o país e, tal como já antecipou a Comissão Europeia, a ultrapassar também os limites da conta de controlo, situação que pode originar um procedimento por défice excessivo com base na dívida já na próxima primavera.

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Para 2025, projeta-se um crescimento da despesa líquida de 6,3%, o que corresponde a um desvio de 0,5% do PIB, superior ao limite anual. Boletim Económico do Banco de Portugal

"Para 2025, projeta-se um crescimento da despesa líquida de 6,3%, o que corresponde a um desvio de 0,5% do PIB, superior ao limite anual de 0,3% aplicável na conta de controlo. Dado que em 2024 se verifica igualmente um desvio positivo, o limite é também ultrapassado em termos cumulativos no período 2024–2025", calcula a instituição.

Em termos médios, é esperado que a despesa primária líquida suba 5,7% ao ano de 2025 até 2028, muito acima dos 3,6% de crescimento médio fixado como máximo no plano orçamental estrutural de médio prazo aprovado pelo Conselho da União Europeia para Portugal.

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Apesar dos desafios estou convencido que a disciplina orçamental vai ser mantida. Álvaro Santos Pereira, governador do Banco de Portugal

Questionado sobre se o Governo deve adotar medidas para corrigir esta evolução, com cortes de despesa ou subidas de impostos, o governador do BdP disse apenas confiar que a disciplina orçamental será mantida. “Apesar dos desafios estou convencido que a disciplina orçamental vai ser mantida. Mas é importante mantê-la, ter a certeza absoluta que esta disciplina vai ser mantida. Deve ser a prioridade total para nós”, afirmou.

“Tem de perguntar ao Governo, o que posso dizer é que, com maior pressão neste momento, e as medidas nos últimos anos de maior despesa e também medidas ao nível da receita, vai ser mais difícil manter excedentes orçamentais no futuro”, referiu.

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Apesar das previsões de forte deterioração orçamental, o BdP continua a ver uma trajetória relativamente positiva para a evolução da dívida pública, que espera que fique já abaixo de 90% do PIB em 2025. A estimativa é de 88,2% do PIB no rácio e endividamento neste ano, caindo para 84% do PIB em 2026. Para 2027, prevê 81,8% do PIB e para 2028 79,5%.


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