pixel

Negócios: Cotações, Mercados, Economia, Empresas

Notícias em Destaque

As respostas na entrevista de Passos Coelho são verdadeiras ou falsas?

O primeiro-ministro foi entrevistado esta terça-feira pela SIC, fez um balanço do seu Governo, apontou às legislativas e comentou a situação grega. O Negócios seleccionou algumas das frases de Passos Coelho e foi tentar perceber se correspondem à verdade. Confirme os resultados.

pedro passos coelho
pedro passos coelho Miguel Baltazar/Negócios
15 de Julho de 2015 às 17:32

Passos Coelho (PC): Sem acordo, o BCE estava impedido de ceder liquidez aos bancos gregos e Grexit seria inevitável.

pedro passos coelho
As respostas na entrevista de Passos Coelho são verdadeiras ou falsas?

"Se um acordo não vier a ser obtido" o "BCE estaria impedido estatutariamente de ceder mais liquidez aos bancos gregos. O que significa isto? Que deixaria de haver circulação monetária na Grécia. O que é que um estado na ausência de moeda pode fazer para pagar salários e etc.? Seria inevitável: se não houvesse acordo teríamos de acordar com o governo grego os termos para que se pudesse criar uma moeda alternativa".

Resposta:

Os limites exactos da capacidade do BCE de ceder liquidez de emergência não são claros, pois dependem da análise da solvabilidade dos bancos, que é um conceito que avalia a evolução esperada de activos e passivos no longo prazo. A instituição deixou no entanto claro que, sem acordo e incumprimento por parte do Estado grego nas suas dívidas, entenderia que não teria condições de continuar a emprestar dinheiro aos bancos, uma vez que os consideraria insolventes.

Neste cenário, uma saída da Grécia da Zona Euro, embora provável – e promovida como hipótese pelo Governo alemão – não seria inevitável. Restava a possibilidade de resolver e fechar as actuais instituições financeiras gregas e promover a sua recapitalização, se necessário com dinheiro europeu. Uma vez recapitalizadas as instituições, o BCE poderia voltar a emprestar dinheiro. No fundo, tratar-se-ia de um incumprimento dentro da Zona Euro. A probabilidade de, pelo menos temporariamente, os gregos terem de imprimir notas promissórias, seria grande. 

PC: O plano para a Grécia estava a dar resultado antes de vir o Syriza. 

pedro passos coelho
As respostas na entrevista de Passos Coelho são verdadeiras ou falsas?

"A Grécia tinha conseguido uma primeira emissão em mercado no ano passado, bom indício de que estava a recuperar, o emprego tinha crescido um bocadinho, estava com excedente primário de bons resultados este ano, e durante todos estes meses a situação foi-se deteriorando, de tal maneira que há cerca de 3, 4 semanas, em vez de discutir programa de 20 mil, agora discutimos programa de 3 anos de até 86 mil milhões" 

 

Resposta:

Ao longo de 2014, houve algumas emissões de dívida bem-sucedidas, mas o acesso regular e estável ao mercado não estava garantido. Os juros da dívida a 10 anos estiveram perto dos 5% em Setembro, mas aproximaram-se dos 9% em meados de Dezembro, reagindo à antecipação de instabilidade política que resultou das dificuldades do anterior governo em cumprir o acordado com a troika.

 

O mau desempenho das exportações foi acompanhado de uma queda acentuada das importações durante cinco anos consecutivos, o que permitiu um excedente externo ao país. É uma das vitórias da troika, mas que foi acompanhado de um colapso da economia. Em 2014, a economia grega cresceu 0,8%, após seis anos consecutivos de recessão. Contudo, no último trimestre do ano, os indicadores voltaram a trazer más notícias, já que, segundo dados reportados pelo Eurostat, o crescimento em cadeia foi negativo (-0,2%). Mais, o registo de 0,8% surgiu depois de uma queda de cerca de 25% do Produto Interno Bruto do país, entre 2009 e finais de 2014.

Um dos indicadores que maior preocupação suscitava, e continua a suscitar, é peso da dívida pública. Desde o FMI às instituições europeias, algum tipo de reestruturação tem sido apontada como incontornável. Relembre-se que a Grécia operou em 2012 a maior reestruturação de dívida pública da história, mas em finais de 2014 estava acima dos 170% do PIB. Em 2009, o valor da dívida pública estava nos 130%.

 

Depois de atingir níveis de desemprego histórico, em finais de 2014 a taxa correspondente era, apesar de uma ligeira recuperação, ainda superior a 25% da população activa, superando os 50% entre a população jovem. Lembre-se que, ao longo do programa de assistência, o país viu o número de habitantes cair, tal como o número de empregos. Desde 2009, segundo os dados do FMI, a Grécia perdeu 150 mil residentes (-1,3%) para cerca de 11 milhões de habitantes, e destruiu 850 mil empregos (-18%) para os 3,75 milhões.

 

PC: O sistema previdencial público é deficitário. 

pedro passos coelho
As respostas na entrevista de Passos Coelho são verdadeiras ou falsas?

“Temos um problema com os sistemas previdenciais públicos, eles são deficitários. Não vale fazer de conta que não é assim, já em 2013 e 2014 tivemos de fazer transferências adicionais do Orçamento do Estado para a Segurança Social para que pudesse cumprir as suas funções”.

 

Resposta:

Tirando anos pontuais de desequilíbrio, o sistema previdencial de Segurança Social foi sendo superavitário, até à crise, altura em que descarrilou. 2012 foi o ano da viragem, fruto do aumento em flecha do desemprego, da recessão económica, e da compressão salarial. Menos empregos e salários mais baixos são sinónimos de menos contribuições e mais subsídios de desemprego. De 2012 para cá, o défice repetiu-se ano após ano, esperando-se que este ano ronde os 900 milhões de euros. Nestes exercícios, o Governo tem optado por cobrir os buracos com transferências do Orçamento do Estado, e não beliscar o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, que funciona como uma reserva de emergência para pagar pensões.

 

Quanto ao futuro, as poucas projecções de médio e longo prazo até agora conhecidas, nomeadamente as feitas pelo economista Jorge Bravo por encomenda do Governo, apontam para que o sistema não se volte a recompor e acumule défices consecutivos.

 

Já no que respeita à Caixa Geral de Aposentações, o Estado tem e continuará a ter de fazer transferências do Orçamento do Estado para pagar parte das pensões. Ao todo, em 2014, a CGA pagou cerca de 9,5 mil milhões em pensões, 45% dos quais foram financiadas por quotas dos actuais funcionários públicos, e 40% dos quais pelo OE. Contudo, tal deve-se, pelo menos em parte, ao modelo escolhido pelos sucessivos governos para financiar este sistema. Por um lado, durante anos a fio os organismos públicos não tinham de fazer descontos para a CGA, enquanto entidade patronal, porque se entendia que o Estado é só um e, na prática, não faria diferença serem os organismos a pagar individualmente ou o Orçamento a pagar tudo no conjunto – isto criou um subfinanciamento na conta-corrente da CGA. Mais recentemente, em 2006, resolveu fechar-se a CGA, e todos os funcionários públicos passaram a descontar para a Segurança Social, o que faz com que o número de activos a descontar e as receitas do sistema sejam cada vez menores, e o Estado tenha de entrar com parcelas maiores de financiamento.

 

PC: Contas do memorando original estavam mal feitas e programa era incumprível.  

pedro passos coelho
As respostas na entrevista de Passos Coelho são verdadeiras ou falsas?

“Quando eu o recebi, o programa não era cumprível. As contas estavam mal feitas e não fui eu que as fiz. Constavam do memorando assinado entre o Governo e troika”. “Dizia que nós em 2011 tínhamos de alcançar um défice de 5,9%. Sabe qual era o défice no dia que tomei posse, de acordo com o INE? Era de 9%. O nosso objectivo era de 5,9%. A perspectiva associada ao memorando era que partiríamos de 2010 de um défice que podia rondar entre 7,5% e 8%. O défice de 2010 foi 10%”.

Resposta:

Passos Coelho refere que os valores previstos para o défice acabaram por ser bastante superiores ao que estava previsto no memorando (a saber: 5,9% em 2011, 4,5% em 2012 e 3% em 2013). Isso é verdade, embora a derrapagem do défice de 2010 tenha tido várias causas: o primeiro aumento, em Março de 2011, fez o défice escalar para 8,6%, devido ao impacto do BPN, BPP e à reclassificação de três empresas públicas (sem estes efeitos, disse o INE, o défice seria de 6,8%, abaixo dos 7,3% previstos pelo Governo). No mês seguinte, nova revisão, de 8,6% para 9,1%, por causa da inclusão dos contratos de três parcerias público-privadas (PPP) e, finalmente, houve uma subida para 9,8%, no final do ano, por causa da inclusão do célebre “buraco da Madeira”.

 

Posteriormente, quando o INE reviu as regras estatísticas, no final do ano passado, o défice de 2010 até passou a ser de 11,2%.

 

Quando Passos tomou posse, em Junho de 2011, o défice que tinha sido apurado era efectivamente de 9,1%. Um número que já era conhecido em Abril – precisamente para disponibilizar "dados estáveis para 2010, que constituíssem o ponto de partida para as negociações em curso", disse então o INE, citado pelo Público. Portanto, quando Passos diz que se esperava que o défice estivesse entre 7,5% e 8%, tal não é verdadeiro.

O primeiro-ministro esquece-se, adicionalmente, de referir que o PSD esteve envolvido nas negociações do memorando original, através de Eduardo Catroga, que foi escolhido precisamente por Passos Coelho, quando este era apenas presidente do PSD. Nessa altura, o PSD reclamou que foi da sua responsabilidade a subida do objectivo do défice para os três anos do programa, face às metas que estavam estabelecidas no PEC IV (4,6%, 3% e 2% para 2011, 2012 e 2013, respectivamente).

Essa revisão foi uma “grande vitória” do PSD, disse então o ex-ministro das Finanças. Catroga acrescentou ainda que a negociação foi “essencialmente influenciada pelo principal partido de oposição” e que a troika percebeu a “estratégia diferenciadora” dos social-democratas. Portanto, se as contas foram mal feitas, como diz Passos, o seu partido podia ter dado o alerta.

 

PC: Governo criou 175 mil empregos entre Janeiro de 2013 e Abril de 2015, a maioria com vínculo permanente.

pedro passos coelho
As respostas na entrevista de Passos Coelho são verdadeiras ou falsas?

“Nos primeiros anos [da legislatura] tivemos um agravamento do desemprego, um problema com o emprego, mas a partir de 2013 uma melhoria. Entre Janeiro de 2013 e Abril de 2015, vimos a economia criar mais de 175 mil postos de trabalho, temos mais pessoas empregadas hoje do que em 2013”. O emprego existe “em melhores condições”. “Por cada empregado com contrato a termo, há três com contrato sem termo. A precariedade diminuiu ao contrário do que muitas vezes se apregoa”.

 

Resposta:

Pedro Passos Coelho já tinha reclamado louros pela criação de emprego em Portugal há dois meses no Parlamento. Na altura, o Negócios escreveu que os dados utilizados pelo primeiro-ministro eram bastante enganadores em relação ao que aconteceu na actual legislatura. Agora, Passos Coelho utiliza números ligeiramente diferentes, mas no mesmo sentido. 

 

Os dados do INE mostram que, entre o quarto trimestre de 2012 e o primeiro trimestre de 2015, foram criados 40 mil empregos. Se a comparação começar no primeiro trimestre de 2013, os números são mais simpáticos, mas ainda longe dos valores enunciados pelo líder do Governo: 123 mil. A única forma de chegarmos a esses valores é utilizar dados mensais, ajustados à sazonalidade, comparando Janeiro de 2013 – o pior mês de sempre desde 1998 – com Abril de 2015. Se usarmos valores mensais não ajustados à sazonalidade, a criação de emprego até ultrapassa o que disse Passos na entrevista: 205 mil.

 

Independentemente dos parágrafos anteriores, talvez o mais importante para avaliar a afirmação do primeiro-ministro seja o que aconteceu ao emprego antes do início de 2013, quando o PSD e o CDS-PP já eram Governo. Entre o primeiro trimestre de 2011 e o primeiro trimestre de 2013, 420 mil pessoas deixaram de estar a trabalhar em Portugal. O que significa que os 123 mil empregos criados são menos de um terço dos destruídos no período anterior. Um saldo negativo de 298 mil.

 

Quanto à afirmação de que por cada contrato a prazo há dois sem termo, essa proporção não existe desde a tomada de posse desde Governo. Os contratos sem termo já rondavam os 77%/78% do emprego por conta de outrem. O que se assistiu durante a crise foi, isso sim, a uma destruição muito superior dos postos de trabalho mais precários (contratos a prazo e recibos verdes) devido a uma maior facilidade de despedimento que, ainda assim, não mudou a “relação de forças” entre o tipo de vínculo.

 

(NOTA: Notícia corrigida a 24 de Julho. Na versão anterior era referido que os dados mensais do desemprego eram muito mais voláteis, o que não é correcto, uma vez tratar-se de uma média móvel de três meses. Além disso, eram apenas citados dados mensais não ajustados à sazonalidade. Os ajustados à sazonalidade revelam os tais 175 mil empregos criados.)

 

PC: Entre 2005 e 2011, foram destruídos 236 mil empregos. 

pedro passos coelho
As respostas na entrevista de Passos Coelho são verdadeiras ou falsas?

“Entre 2005 e 2011, que foi rigorosamente o período em que o PS esteve no Governo, a economia perdeu cerca de 236 mil empregos. Perdeu-os”. “A taxa de desemprego em 2005, quando o PS chegou ao Governo, era de 7,5%. Quando eu cheguei era de 12,1%. Enquanto o PS foi Governo a taxa de desemprego subiu”

 

Resposta:

Mais uma vez, os números não correspondem aos dados disponibilizados pelo INE. Porém, neste caso, o primeiro-ministro parece ter dramatizado menos a realidade. Entre o primeiro trimestre de 2005 e o primeiro trimestre de 2011 foram destruídos 254 mil postos de trabalho. Se olharmos para dados anuais, entre 2005 e 2011, o emprego sofreu uma contracção de 322 mil. De referir que todos estes valores sofrem de problemas de comparação, uma vez que se verificou uma quebra de série entre 2010 e 2011.

 

Onde Passos Coelho pintou uma realidade menos simpática para o Partido Socialista foi na taxa de desemprego. Quando o Governo tomou posse em 2005 a taxa de desemprego era 8,4% (primeiro trimestre de 2005). Quando o PSD e o CDS se tornaram Governo ela estava nos 12,2% (primeiro trimestre de 2011). Estes valores do Eurostat são ajustados a sazonalidade. Os valores não ajustados são 8,7% e 12,6%, respectivamente.

Ver comentários
Publicidade
C•Studio