Há tempestade nos mercados. Perceba o que se está a passar

Mais um dia, mais uma descida abrupta na montanha russa dos mercados. Bolsas, petróleo e dívida portuguesa afundam. Ouro e dívida alemã servem de refúgio. Perceba o que se está a passar
Há tempestade nos mercados. Perceba o que se está a passar
André Veríssimo 11 de Fevereiro de 2016 às 17:39

O rumo fatídico dos mercados já estava traçado antes mesmo de abrirem na Europa. A sessão já tinha sido tremida na Ásia. A bolsa de Hong Kong, que esteve fechada nos últimos três dias para a celebração do Novo Ano chinês, encerrou a perder 3,9% para o valor mais baixo em quatro anos. Mas o pior ainda estava para vir.

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Ainda antes da abertura dos mercados o Riskbank, o banco central da Suécia, levou a taxa de juro de referência para um valor ainda mais negativo. Anunciou um corte de 15 pontos, de -0,35% para -0,50%, num esforço para travar a subida da coroa e forçar a subida da inflação, que continua teimosamente perto de zero. É o segundo banco central a fazê-lo esta semana, depois do Banco do Japão ter passado a cobrar 0,10% sobre parte das reservas dos bancos. As taxas negativas estão a causar calafrios ao sector porque penalizam a rentabilidade.

Também antes do início da sessão o Société Générale contribui para acicatar os maus fígados que os investidores têm neste momento em relação à banca. A instituição francesa até melhorou os lucros em relação ao ano anterior, com o resultado líquido da segunda maior instituição financeira a subir de 549 milhões para 656 milhões. Mas o número ficou muito aquém do esperado pelos analistas, devido a provisões inesperadas de 400 milhões para custos de litigância. Os investidores também não gostaram da falta de confiança revelada em relação à capacidade do banco para cumprir a meta de uma rentabilidade de 10% dos capitais.

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A isto tudo, que já não é pouco, há que somar o facto de na véspera a presidente da Reserva Federal, Janet Yellen, ter vindo reconhecer num discurso no Congresso dos EUA que a turbulência nos mercados globais pode afectar o crescimento económico do país.

Bolsas afundam arrastadas pela banca

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O sentimento já andava soturno nos mercados, com os níveis de aversão ao risco em máximos desde Agosto do ano passado, quando as acções chinesas colapsavam. Com o prólogo já descrito a direcção das bolsas só podia ser uma: para baixo e com força. As praças europeias caiam entre 2% e 3% pouco depois da abertura, com o sector financeiro a liderar as perdas.

O Société Générale caia cerca de 12% pouco depois da abertura arrastando todo o sector. O Deutsche Bank, que fora o protagonista na derrocada de terça-feira, mas recuperara parte das perdas na quarta-feira, esteve a desvalorizar 9,9% esta quinta-feira. O Credit Suisse seguiu a mesma bitola, recuando para o valor mais baixo dos últimos 21 anos, nos 12,23 francos suíços.

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Uma nota do JPMorgan, citada pela Bloomberg, dá conta do ambiente nas salas de corretagem: "É difícil imaginar uma manhã mais sombria". "As duas coisas que os mercados mais odeiam neste momento (taxas negativas dos bancos centrais e más notícias para a banca) aconteceram antes da abertura do mercado, com o Riskbank a cortar a sua taxa ainda mais para terreno negativo e o Société Générale a divulgar maus resultados e perspectivas".

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As bolsas americanas abriram entretanto. Novo continente a mesma tendência, embora com quedas menos agudas, entre 1% e 2%. Seria assim até ao fim da sessão, pelo menos na Europa. O Stoxx600 encerrou a cair 3,2%. A Bolsa de Lisboa foi uma das mais castigadas: -4,5%.

O petróleo, que tem sido um dos principais motivos de preocupação dos investidores, concorreu também para inundar de ordens de venda os sistemas de negociação. A matéria-prima esteve a cair 4,5% em Nova Iorque, regressando ao valor mais baixo em 12 anos na casa dos 26 dólares. Em Londres, o barril voltou à casa dos 30 dólares. Não só os bancos, mas também as petrolíferas tiveram motivo para cair. A Galp foi a que mais desvalorizou na Bolsa de Lisboa.

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Bolsas europeias afundam em dia negro nos mercados

 

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Juros de Portugal "are going bananas"

No meio deste turbilhão, um activo sobressai, em artigos nas agências e "sites" especializados: os juros de Portugal a disparar. Luke Kawa escreve na Bloomberg que as taxas da dívida portuguesa "are going bananas". Em apenas cinco sessões, a taxa a 10 anos passou de 3,4% para 4,53%, o nível mais elevado desde Março de 2014. Acabaria por aliviar para a casa dos 4,11%. mesmo assim a maior subida desde Julho de 2013, quando Paulo Portas apresentou a demisssão "irrevogável". 

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Os juros de Espanha e Itália também subiram, mas muito menos. Se as obrigações a 10 de Portugal chegaram a saltar mais de 80 pontos base, as de Espanha subiam à tarde 6,5 pontos, para os 1,79%. As italianas ganhavam 7,7pontos para os 1,72%.

 

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Sinal de que os investidores olham de novo para Portugal como o elo mais fraco. Os receios de que a DBRS corte o "rating" de Portugal para o nível especulativo por causa do Orçamento do Estado, cortando o acesso ao programa de compras de activos do BCE, os montantes elevados que Portugal tem de ir buscar ao mercado no próximo ano e o elevado peso da dívida pública no PIB são factores que concorrem para aquela percepção.

Crónica de um dia infernal na bolsa
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Ouro e dívida alemã servem de refúgio

Manchetes hiperbólicas davam conta do nervosismo, quem sabe contribuindo para ele. "Os mercados globais estão a colapsar", chegou a titular a Business Insider. Na Marketwatch, "Só uma coisa pode proteger os investidores". A foto revela o refúgio: uma mina de ouro.

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O nível de angústia no mercado mede-se não só pelo que está a cair, mas também pelo que está a valorizar. Isto é, para onde está a ir o dinheiro. E no medo, no escuro da incerteza, o ouro é uma luz para onde os investidores se viram. O metal precioso esteve a valorizar mais de 3% para os 1.234,9 dólares por onça, atingindo o valor mais elevado do ano.

Também a dívida americana e alemã está a servir de refúgio, com os títulos a valorizarem e empurrarem os juros para baixo. As bunds com maturidade a dez anos recuaram até aos 0,186%.  O HSBC divulgou uma nota onde admite que a taxa possa chegar aos 0,05%. A procura pela dívida alemã ajuda a explicar porque o euro está também em alta, a ganhar 0,72% para os 1,13 dólares.

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Quando vai esta maré terminar?

Quando vai esta maré terminar?

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É o que se questionam investidores e analistas. Voltando à nota já citada do JPMorgan. "Tentar adivinhar o fim desta queda descontrolada é difícil, dada a série de transacções e narrativas interligadas, correlacionadas e que se auto-alimentam. Por exemplo, a queda do petróleo baixa a inflação, o que leva os bancos centrais a agir, o que afunda os bancos e esmaga o sentimento geral do mercado, o que amedronta os empresários e a actividade económica começa a deteriorar".

Esperemos que seja em breve possível quebrar a espiral.

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